No debate com o primeiro-ministro sobre política geral, a decorrer hoje na Assembleia da República, o deputado único da Iniciativa Liberal começou por citar António Costa que, numa recente entrevista ao jornal Público, declarou que “esta crise foi o maior atestado de falhanço das visões neoliberais”, numa referência à pandemia que o país atravessa há mais de um ano.

“Pode-me explicar que diferença encontra entre o liberalismo e o neoliberalismo?”, questionou diretamente o deputado ao governante, pergunta que gerou risos entre a bancada socialista e os próprios membros do governo presentes.

Após alguns segundos de hesitação, que até levaram o presidente da Assembleia da República a dizer ao primeiro-ministro que podia apenas dizer que não queria responder, Costa atirou: “Eu acho que foi uma forma delicada que foi encontrada para não chamarem arqueólogos àqueles que foram, no final do século XX, desenterrar as ideias que tinham sido devidamente enterradas no início do século XX”.

Lançado o debate ideológico, João Cotrim de Figueiredo vincou que a Iniciativa Liberal não defende o neoliberalismo e voltou ao conteúdo da entrevista dada pelo governante socialista ao Público, na qual, continuou, o primeiro-ministro “justifica o falhanço do neoliberalismo com três desempenhos”.

“O desempenho do Serviço Nacional de Saúde (SNS): aquele que para acudir à covid-19 ‘desacudiu’ a todas as outras doenças, causando milhares de mortes em excesso que ainda hoje não têm responsável e que o senhor chegou a atribuir ao calor e ao frio de 2020, como se fosse a primeira vez que houvesse verão ou inverno em Portugal. Não vejo nisto grandes virtudes do socialismo”, argumentou o liberal.

O segundo desempenho, continuou, refere-se à escola pública, “que o único milagre é ter conseguido assegurar o tele ensino apesar de continuar sem internet e sem os computadores que o senhor prometeu em abril e ainda não chegaram, também não vejo grandes virtudes do socialismo nisto”, criticou.

“E o papel das prestações sociais que foi o quê? Compensar aqueles que tinham empregos, rendimentos, ou negócios, que foram afetados por decisões do Governo. E compensar com o quê? Com o dinheiro dos impostos que tinham pago no passado. Não me parece grande favor do Estado devolver às pessoas o dinheiro que elas já tinham pago, também não me parece uma grande virtude do socialismo”, vincou.

Na resposta, o primeiro-ministro, entre sorrisos, declarou que “uma das coisas mais curiosas neste debate sobre a pandemia é ver a tonalidade dos diferentes derivados da direita relativamente à matéria do confinamento”.

“Aqueles que fechavam mais, aqueles que abriam tudo, aqueles que abriam quase tudo, e aqueles que prudentemente falam de outros temas que é para ir passando pelos pingos da chuva a ver se ninguém lhes pergunta o que é que verdadeiramente fariam em caso de necessidade”, ironizou.

“Senhor deputado, não leve a mal, mas há alguma imodéstia da sua parte a pensar que eu estava sequer a pensar em si quando dei aquela resposta", atirou o primeiro-ministro.

O governante explicou que a resposta em causa “mais do que do lado negativo, que era daqueles que eram derrotados”, pretendia valorizar aquilo que caracterizou como um “enorme consenso” que existe na sociedade portuguesa.

“É que, neste momento em que vivemos a crise mais dramática que alguma vez nós vivemos e que nunca imaginámos sequer poder viver, a verdade é que foi no SNS, na escola pública e na Segurança Social, que é suportada pelas nossas contribuições, que todos aqueles que se viram aflitos encontraram o seu apoio”, respondeu Costa.

Para o primeiro-ministro, isso significa que “o Estado Social é uma enorme mais valia para o futuro de todos, e aqueles que defendem o Estado Social e que sabem que para o Estado Social existir é preciso efetivamente pagar impostos, e que cada um pague os impostos em função da sua capacidade contributiva, isso são duas ideias fundamentais que saíram claramente reforçadas”.

“Quem pensa o contrário, efetivamente, saiu derrotado neste debate ao longo deste ano”, rematou.