Julgo que é importante contextualizarmos. Do que falamos quando nos referimos a autocuidado masculino?

Quando falamos de autocuidado masculino, referimo-nos a um conjunto de práticas que um homem deve adotar no seu dia a dia para cuidar da sua saúde física, mental e emocional, além da sua imagem pessoal e bem-estar social. No fundo este conceito vai muito além da higiene ou estética – embora esses elementos também façam parte.

Hoje, como se distingue o autocuidado masculino daquele que prevalecia no passado?

No passado, e falamos até de um passado recente, o autocuidado foi erroneamente associado a vaidade ou fragilidade, sendo culturalmente visto como algo "menos masculino". No entanto, esse paradigma vem mudando à medida que se reconhece que cuidar de si é um ato de responsabilidade e maturidade, independentemente do género.

O autocuidado masculino é sobre romper com velhos estigmas e reconhecer que o homem também precisa – e merece – cuidar de si.

Considera que os preconceitos sociais ou estereótipos ligados à masculinidade continuam a impedir muitos homens de cuidar de si?

Sim, sem dúvida. O autocuidado masculino é sobre romper com velhos estigmas e reconhecer que o homem também precisa – e merece – cuidar de si. É um exercício de amor-próprio que impacta positivamente todas as esferas da vida.

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Os preconceitos sociais e estereótipos ligados à masculinidade continuam, em muitos contextos, a impedir que muitos homens cuidem de si – seja no âmbito físico, emocional ou mental. E isto pode trazer consequências graves como problemas de saúde mental ignorados, como a ansiedade, depressão ou burnout; maior taxa de suicídio entre homens, negligência de cuidados médicos preventivos, isolamento emocional e dificuldade em criar vínculos mais profundos. É necessário redefinir o que é ser homem. E isto significa incluir empatia, cuidado, escuta e vulnerabilidadecomo traços legítimos da masculinidade.

Wearables e health trackers proliferam nos dias de hoje. Esta tecnologia que se veste” empodera o homem a cuidar-se melhor ou gera novas formas de ansiedade e vigilância sobre o próprio corpo?

Curiosamente a minha prática clínica com o feedback dos pacientes sobre estes dispositivos é muito positiva, pois os próprios homens podem ir monitorizando o seu progresso, o que os motiva a manter as alterações no estilo de vida necessárias para uma melhor saúde masculina.

Está provado que o autocuidado físico tem influência positiva nas dimensões psicológica e emocional do homem? De que forma?

Está cientificamente comprovado que o autocuidado físico tem uma influência positiva significativa nas dimensões psicológica e emocional de qualquer pessoa. No entanto, no caso dos homens, esse impacto pode ser ainda mais relevante justamente por causa das barreiras culturais que muitas vezes os impedem de se cuidar. O autocuidado físico age como uma base concreta sobre a qual o bem-estar emocional e psicológico pode ser construído. Para os homens, romper com o estigma de que "cuidar de si é fraqueza" é um passo essencial para uma vida mais saudável e equilibrada.

Quais os cuidados diários — físicos e mentais — que considera cruciais para modelar o bem-estar do homem?

Acho importante considerar-se alguns pilares do autocuidado masculino como fulcrais para o equilíbrio do homem:

Em primeiro lugar a saúde física com a realização de consultas médicas de rotina como medicina geral, urologia, dermatologia, entre outras. Manter uma alimentação equilibrada e praticar exercício físico, dormir bem e evitar o consumo excessivo de álcool ou outras substâncias. Depois, e não menos importante, a saúde mental e emocional procurando apoio psicológico quando necessário, desenvolver inteligência emocional, aprender a lidar com sentimentos e expressá-los de forma saudável. É muito importante o facto de o homem conseguir romper com padrões de masculinidade tóxica que inibem a vulnerabilidade e o cuidado com as emoções.

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E claro, não esquecer a imagem e cuidado pessoal como cuidar da pele, cabelo, barba, unhas e vestuário, não por vaidade, mas por autoestima e bem-estar. Ter hábitos de higiene consistentes e adaptados às necessidades do próprio corpo inclusive dos genitais externos.

Está cientificamente comprovado que o autocuidado físico tem uma influência positiva significativa nas dimensões psicológica e emocional de qualquer pessoa.

Quais as estratégias mais eficazes para incorporar pausas conscientes e exercícios de relaxamento numa rotina diária marcada por pressão e prazos?

Reservar uns minutos dentro da atividade diária, de forma regular e consistente, é geralmente o suficiente par se tornar uma rotina no ambiente de trabalho do homem.

O recurso a procedimentos estéticos tem aumentado entre os homens. Também eles se inscrevem num contexto de autocuidado. Neste sentido, quais são os procedimentos mais procurados por faixa etária?

É uma questão que necessitava de algumas páginas de resposta pois há de facto vários. Mas posso aqui expor um que é comum em todas as faixas etárias   e pouco falado - a enorme preocupação com o aspeto do seu pénis e escroto. Principalmente com o tamanho e grossura do membro masculino, mas também com a aparência escrotal, evitando um aspeto mais relaxado nos mais velhos e um aspeto muito tenso e desconfortável nos mais jovens. Temos a possível aplicação de ácido hialurónico, ou de nano e microfatpara engrossamento peniano, bem como a aplicação de toxina botulínica para relaxamento do escroto, tudo técnicas pouco invasivas realizadas em consultório, sem necessidade de procedimentos cirúrgicos mais invasivos.

O autocuidado do homem há de acompanhar as necessidades especificas de cada idade. Em síntese, quais as práticas que considera fundamentais década a década?

O recurso a um profissional de saúde de excelência para a saúde do homem como um andrologista, pode ajudar a compreender os melhores autocuidados ao longo de toda a sua vida.

Que práticas preventivas recomendaria a um homem de 60 anos que quer, não só viver mais, mas manter energia e vitalidade nas décadas seguintes?

Quando falamos em prevenção, falamos de uma faixa etária bastante mais baixa, por volta dos 30, quando ainda é possível atrasar o aparecimento dos primeiros sinais de envelhecimento, quer internos, quer externos. Apesar de nunca ser tarde para começar a cuidarmos de nós, aos 60 já não se pode falar em prevenção. Daí a necessidade de nos fazermos acompanhar pelo nosso andrologista ao longo do nosso percurso nesta vida, de preferência desde cedo.