Chiara Pussetti é antropóloga e coordenadora do projeto “EXCEL — Em busca da Excelência”, desenvolvido por um grupo multidisciplinar de investigadores do Instituto de Ciências Sociais (ICS) e da Faculdade de Medicina (FM) da Universidade de Lisboa, o qual coordenou.
É ainda curadora da exposição “Be fu**ing perfect — The Pursuit of Excellence”, que marca o final do projeto EXCEL, e que mostrará a partir de quinta-feira, em Lisboa, objetos que ilustram a busca por uma beleza inspirada em padrões.
“Queremos brincar de forma irónica com a materialidade destes objetos, para nos lembrarmos que a beleza não é algo fútil, não é algo superficial”, disse, em entrevista à agência Lusa, rodeada de Barbies, ícones de uma beleza que se promove branca, magra, alta e loura.
“As barbies negras, as barbies com características asiáticas, indianas são as amigas da Barbie, não são a Barbie, a Barbie é uma”, indicou.
Chiara Pussetti dá o exemplo da Barbie para mostrar “o que acontece todos os dias nos campos das indústrias, das profissões ligadas à beleza”.
“Existe ainda hoje um corpo normativo, um corpo norma, um padrão hegemónico de beleza que é claramente um padrão ligado a uma ideia de juventude, de corpo magro, especialmente de corpo europeu ou eurocentrado, no sentido de um corpo branco”, observou.
E aponta as agências de moda e toda a indústria que produzem os sonhos, as capas de revista e os programas de televisão e que escolhem sempre a atriz “bonita”.
“Vemos que se replica sempre uma imagem de perfeição: Jovem, magra, branca e alta e que não encaixa, por exemplo, a cor da pele diferente, feições ligadas a outras origens étnicas”.
A antropóloga considera que existem dois caminhos para quem se depara com estes factos. O caminho fácil e mais percorrido, mas também o mais complexo e mais escorregadio, é “o caminho da reprodução de um imaginário vigente”.
“O caminho mais fácil é tentar reproduzir uma beleza, um corpo negro que o olhar branco aprecie, um corpo negro apetecível para uma estética que continua a ser branca e um corpo negro que venda num mercado cujo consumidor é branco”, referiu.
E há o caminho mais difícil, pelo qual a investigadora anseia e luta, que é o da “descolonização da estética”.
“Quando falo de descolonizar a estética falo da educação; e educação significa começar com as escolas, as crianças, introduzindo nos livros da escola mais cores, mais diferença, mais possibilidades, mostrando que existe beleza, encanto e que existe um mundo de possibilidades ao mesmo nível e que cada um se poderia reconhecer e se sentir à vontade e se sentir apreciada numa dessas imagens”, disse.
A antropóloga sublinha que não é só uma questão de cor de pele, “é uma questão também do tamanho do corpo”.
“Basta ver uma série de televisão. A menina gorda nunca será a protagonista, a menina gorda é boa amiga, a menina gorda é a que escuta. A menina gorda é, no máximo, simpática e muito inteligente”.
E acrescentou: “A menina gorda não é a protagonista, a não ser que haja, como em muitas séries, aquela intervenção de fora, pela qual solta os cabelos, tira os óculos, veste, emagrece e mais não sei o quê e se torna outra vez um corpo hegemónico”.
O que Chiara Pussetti deseja é que, no futuro, quem opte por uma intervenção estética, como uso de botox para não ter rugas, o faça consciente que está a replicar um padrão e que o que faz não é uma obrigação, mas sim uma escolha.
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