Dentro de três anos, lá mais para 2018, os alimentos comercializados nos Estados Unidos da América não poderão conter gorduras trans na sua composição. Em junho de 2015, a agência norte-americana dos medicamentos e dos produtos alimentares (FDA) decidiu proibir a utilização deste ingrediente que permite aumentar o prazo de validade de alimentos como bolachas, bolos, pipocas, batatas fritas ou refeições pré-cozinhadas e torná-los mais dourados e crocantes. Esta medida surge na sequência de uma revisão de centenas de trabalhos científicos que têm vindo a revelar que estas gorduras processadas artificialmente podem provocar danos na saúde.

Os argumentos levaram a instituição norte-americana a concluir que não são seguras para consumo humano.  Segundo a American Heart Association, «as gorduras trans aumentam os níveis do mau colesterol e baixam os níveis do bom colesterol. Comer este tipo de gordura aumenta o risco de desenvolvimento de doença cardiovascular, AVC e diabetes tipo 2», sublinha a instituição. Mas estas gorduras, nefastas para a saúde, ainda circulam em muitos supermercados da União Europeia.

O panorama europeu

Na Europa, a Dinamarca foi o primeiro país a limitar as gorduras trans em 2003. Áustria, Hungria, Islândia, Noruega e Suíça seguiram o exemplo. Atualmente, em finais de 2015, a legislação europeia não proíbe as gorduras trans. A indicação da sua presença no rótulo é obrigatória mas não a quantidade que contêm. Em 2014, o Comité de Saúde Pública e Segurança Alimentar do Parlamento Europeu recomendou uma ação mais assertiva da UE na redução das gorduras trans e espera-se «para breve» um relatório da Comissão Europeia sobre o assunto, pode ler-se no site da instituição.

O que são gorduras trans?

Como explica a nutricionista Ana Carvalhas, «existem dois tipos de gorduras trans. Ass naturais (de origem animal) e as artificiais (fabricadas a partir de óleos vegetais). As primeiras são produzidas pelo organismo de ruminantes, como vacas, pelo que os laticínios contêm níveis residuais de gorduras trans (cerca de 5%), assim como a carne destes animais (1% e 5%). As segundas são gorduras artificialmente saturadas, em fábrica, a partir de óleos vegetais polinsaturados», refere.

«O processo, que começou a ser usado nos anos da década de 1950, passa por adicionar hidrogénio a estes óleos, o que permite que as gorduras se mantenham sólidas à temperatura ambiente, sejam mais resistentes à oxidação e aos efeitos do calor. Devido ao processo de fabrico, são também chamadas gorduras hidrogenadas ou parcialmente hidrogenadas», acrescenta ainda a especialista.

Pior do que gordura saturada?

Por serem de origem vegetal, acreditava-se que as gorduras trans eram saudáveis, à semelhança do azeite e de outros óleos vegetais. Mas, a partir dos anos da década de 1980, os estudos revelaram que não só não têm benefícios como «podem ser piores para a saúde do que as gorduras saturadas de origem animal», refere a nutricionista Ana Carvalhas. Estas provas levaram a Organização Mundial de Saúde (OMS) a recomendar, em 2009, a diminuição do seu consumo.

Um inquérito recente feito na UE concluiu que a média de consumo rondava os 2,5 g/dia (1% do total de ingestão calórica) e alertou para o risco do consumo elevado em certos grupos, como a população mais jovem e os mais pobres. Estima-se que mais de 5 milhões de pessoas ingiram mais de 5 g de gorduras trans por dia. Em alguns países da Europa oriental, o consumo pode chegar aos 30 g /dia. O consumo de 5 g diários destas gorduras está associado a um aumento de 23 por cento do risco de doença coronária, lê-se num relatório de 2014 da OMS.

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Comer pouco ou eliminar?

Para Ana Carvalhas, o melhor é erradicar estas gorduras da dieta. «Nada justifica o consumo de um ingrediente que prejudica a saúde. As gorduras trans das margarinas, óleos de sementes e alimentos processados são ricas em ácidos gordos ómega-6 que, consumidos em excesso têm uma atividade inflamatória prejudicial à saúde», defende. «Os ácidos gordos ómega-6 disputam os mesmos recetores com os ácidos gordos ómega 3, que são anti-inflamatórios e promovem a saúde, reduzindo a capacidade do organismo para fazer uso destes», diz ainda.

«As melhores gorduras e óleos são os que se encontram na natureza, sejam insaturados ou saturados. O azeite tem uma composição maioritária de gorduras monoinsaturados (75%) e apenas 9% de polinsaturados, o que faz dele a gordura mais equilibrada para consumo humano. As gorduras saturadas naturais, como a manteiga, a banha de porco, a gordura de pato e o óleo de coco, também são mais saudáveis do que as gorduras hidrogenadas», aconselha a especialista.

6 problemas (efetivos) das gorduras trans

1. Não são sintetizadas pelo organismo humano, podendo ficar depositadas nas artérias.

2. Contribuem para a produção de gordura visceral que fica acumulada na região da cintura e está associada a doenças cardiovasculares e obesidade.

3. Conseguem aumentar os níveis do chamado mau colesterol (LDL) e dos triglicerídeos e diminuir o nível do bom colesterol (HDL) que tem um efeito protetor das artérias.

4. Têm efeitos negativos nas membranas celulares (as membranas perdem a flexibilidade dificultando a transmissão de impulsos nervosos) e no sistema imunitário.

5. Crê-se que contribuem para estados inflamatórios que estão na origem de processos cancerígenos.

6. Sabe-se que as grávidas que consomem gorduras trans prejudicam o desenvolvimento neurológico do feto e têm tendência a ter filhos obesos.

Leia o rótulo

As outras denominações de gorduras trans a que deve estar atento:

- Se o produto tiver escrito no rótulo gordura parcialmente hidrogenada ou vegetable shortening, então contém gorduras trans.

- O facto desse ingrediente se encontrar entre os três ou quatro primeiros da lista significa que a sua quantidade é elevada. A lista de ingredientes de um produto é apresentada sempre por ordem decrescente da quantidade.

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As alternativas (pouco saudáveis) da indústria

Existir, existem, mas não têm sido muito divulgadas. «Algumas marcas estão a substituir as gorduras trans por óleo de palma, que consegue conservar os alimentos e melhorar o seu sabor, sem precisar de ser hidrogenado», refere Ana Carvalhas. No entanto, este óleo não é saudável», esclarece a nutricionista. «O problema é que os óleos saudáveis, como o azeite, são muito líquidos e torná-los sólidos é um processo mais caro. Óleos de coco e de soja são outras alternativas que a indústria considera utilizar em substituição», esclarece ainda.

Onde estão as gorduras trans no supermercado?

Este tipo de substância está presente em:

- Algumas margarinas vegetais

- Bolos e bolachas

- Batatas fritas

- Fast food e refeições pré-cozinhadas

- Chocolates e gelados

- Alguns cereais de pequeno-almoço

- Alguns alimentos para bebés

Texto: Bárbara Bettencourt com Ana Carvalhas (nutricionista)