Um dos principais condicionantes dos relvados, principalmente em jardins urbanos, prende-se com a praticamente inevitável existência de ensombramento, mais ou menos espesso, digamos assim, existente nas áreas relvadas. As questões relativas à gestão dos relvados em situações de sombra fazem parte das questões mais frequentes a que tenho que dar resposta, em termos profissionais. Mas o que é considerado sombra para um relvado?
A relva tradicional é composta por misturas (frequentes nas relvas de inverno) ou espécies isoladas (comum nas relvas de verão) de gramíneas, plantas naturalmente amantes de sol. As espécies que compõem as relvas necessitam de pelo menos quatro horas de sol direto por dia. Em situações de utilização intensiva, este valor aumenta para seis horas. Menos do que este período origina nas plantas stress e comportamento reativo à falta de luz.
A luz é fundamental para as plantas desenvolverem a fotossíntese, processo através do qual transformam a água e os nutrientes minerais, produzindo substâncias nutritivas, que são indispensáveis à sua vida (consumindo no processo o dióxido de carbono que nós animais libertamos na respiração e libertando o tão precioso oxigénio). Quanto menos luz menor é a taxa de fotossíntese das plantas e por consequência menor o seu vigor.
Sombra total e sombra transparente
Existem essencialmente dois tipos de ensombramento nos nossos relvados, que conduzem a respostas diferentes na gestão da relva. A sombra que deriva de edifícios, muros ou outras estruturas construídas pelo ser humano é normalmente uma sombra total dita opaca ou impermeável. Nestes casos os relvados que estão à sombra estão na maior parte do dia, não há circulação de ar.
Nessas situações, a humidade à superfície do relvado e do solo é elevada e constante, a relva definha rapidamente e o musgo instala-se como espécie dominante. A sombra que deriva de árvores e arbustos é uma sombra mais transparente e parcial, podendo variar muito ao longo do ano, sobretudo se as árvores e arbustos forem espécies caducas e, ao longo da vida do jardim, já que depende do crescimento do coberto arbustivo e arbóreo e da sua manutenção.
Os relvados com este tipo de ensombramento têm normalmente maior circulação de ar, sendo por isso uma sombra seca. Podem ficar cobertos de folhas, criando assim condições ótimas para a instalação de fungos, causadores de doenças. A relva, as árvores e os arbustos competem entre si para a disponibilidade de água e nutrientes no solo.
Gestão eficiente
A gestão dos relvados num tipo de ensombramento (edifícios, muros e outras construções) ou noutro (árvores e/ou arbustos) será assim necessariamente semelhante, embora com alguns fatores diferenciados. Em qualquer dos casos o primeiro fator prende-se com a escolha das espécies e variedades a utilizar nos nossos relvados.
Se optarmos por relvas de inverno, a escolha deve recair sobre misturas de Festuca rubra, Festuca arundinacea e, no caso de sombra húmida, Poa trivialis. No caso de sombra seca, Poa supina, em especial variedades especialmente tolerantes ao ensombramento. Se optarmos por relvas de verão, então devemos evitar a Bermuda (Cynodon dactylon) e apostar na relva-de-santo-agostinho (Stenotaphrum secundatum) e na Zoysia sp.
Os relvados quer de sombra opaca quer de sombra transparente devem ser mantidos com uma altura de corte nunca inferior a entre 3,5 a 4,5 centímetros ou, se preferire, um a dois centímetros mais altos que a mesma relva ao sol. O corte, nestes casos, nunca deve remover mais do que 25% da folha e é muito importante manter a alturas diferentes o seu relvado que está à sombra e o que está ao Sol e estar atento às necessidades de corte já que por crescer menos o seu relvado que está à sombra necessitará de ser cortado com menos frequência.
No que diz respeito à fertilização, os relvados de sombra crescendo com menos vigor do que os de sol não têm as mesmas necessidade de adubação que estes. No entanto, aqui há que distinguir entre sombra opaca e sombra transparente. No caso de sombra opaca, reduza a quantidade de azoto para metade da quantidade utilizada no relvado que está ao sol.
No caso de sombra transparente, porque a relva está em competição com as árvores e/ou arbustos para os nutrientes, então não deve reduzir a quantidade de azoto no relvado de sombra em relação ao relvado de sol (verifique as doses recomendadas para o adubo que utilizar e tenha atenção aos ratios utilizados). Como referência deve dar ao seu relvado de sombra adubos que doseiem pelo menos 30% do azoto sob a forma de libertação lenta ou controlada e com um equilíbrio tipo 1:1:2 ou seja com o potássio o dobro do azoto e o fósforo ao mesmo nível do azoto.
Caso prefira, para simplificar, pode aplicar este mesmo adubo nas áreas do seu relvado de sol, tenha apenas atenção ao que lhe disse anteriormente sobre as doses. No que diz respeito à irrigação, quer no caso da sombra opaca como no caso da sombra transparente, as irrigações devem ser infrequentes e profundas, por forma a molhar bem os primeiros 12,5 a 20 centímetros de solo e a rega deve ser feita às primeiras horas da manhã.
Devemos sempre verificar como está o solo antes de regar. Como orientação considere que um relvado de sombra opaca necessitará de, no máximo, metade da água de um relvado de sol. No caso de sombra transparente, depende da competição do restante coberto.
Evitar pisoteio
O tráfego nas zonas de sombra deve ser evitado, uma vez que a relva é muito menos resistente ao pisoteio. Deve assim, sempre que possível, fazer percursos pedonais com pedras ou gravilha, nas áreas naturalmente mais usadas como passagem. No caso de sombra transparente a manutenção do coberto arbóreo e arbustivo é fundamental para as condições de vida da relva.
Debaixo dos arbustos, à medida que estes vão crescendo, o convívio com a relva vai-se tornando mais difícil. Assim, se a relva desaparecer será melhor substitui-la por uma camada de mulch ou inerte. No caso das árvores é fundamental a remoção das folhas de cima do relvado, a poda dos ramos abaixo de 2,5 ou 3 metros, sempre que possível, é uma medida importante no aumento da transparência.
No caso das suas áreas de sombra não permitirem sequer ao relvado obter quatro horas de sol por dia, então terá que equacionar se a relva é o coberto mais adequado para essas zonas. Não se esqueça que existem numerosas espécies herbáceas menos exigentes que as espécies de relva, mesmo as mais tolerantes ao ensombramento.
Conselhos úteis
- As relvas que estão à sombra são mais suscetíveis ao ataque de pragas e doenças por isso mantenha-se alerta aos sinais/sintomas destas e reaja prontamente.
- Quando estiver a planear o seu jardim tenha o cuidado de escolher árvores com maior potencial para o crescimento da relva.
- Nas zonas de sombra transparente a quantidade de luz equivale a uma percentagem de horas de luz em zonas de pleno sol.
- Quando a relva morre completamente à sombra então considere a sua substituição por ouro tipo de coberto vegetal ou mesmo inerte.
- Em situações de sombra em que a relva não morre mas definha considere como uma opção para manter a qualidade do seu relvado a sua remoção e substituição por tapete de relva, com mistura adequada a entre cada dois a cinco anos, dependendo a qualidade da manutenção e do grau de ensombramento.
- O fato de uma espécie de relva ser tolerante ao ensombramento não significa que não prefira o sol, pode assim utilizar o tapete adequado para a sombra no sol, sabendo que as espécies da misturam oscilaram na quantidade relativa, nas diferentes situações.
Texto: Ana Caldeira Cabral (engenheira agrónoma)
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