Adoraria acreditar, dizia eu, mas a verdade é que não tenho a menor crença nestes contos de fadas e que até se me erriçam os pêlos mais recônditos de cada vez que me cruzo com confissões onde apenas (e só!) parece reinar a mais calma e calorosa convivência parental. Porque, em minha casa, os dias não são todos belos nem maravilhosos. Aliás, há muitos dias em que a minha casa parece o estádio dos leões em dia de dérbi, tal é a confusão e a gritaria que por cá se vive. Ou, como diria o meu filho Tiago, “há dias em que parecemos uma família de doidos”.

Talvez seja por esta coisa de, durante 26 dias por mês, ser “só” eu para eles, mas há alturas em que me sinto exausta. Em que dava tudo por umas horas só minhas, sem ter de me preocupar com a arrumação, com a roupa acumulada, com as rotinas e com os trabalhos de casa que me encanitam até aos limites (curtos!) da paciência. Aliás, há alturas em que a minha própria voz – esganiçada e autoritária – me leva ao abismo da (in)sanidade, fazendo-me chegar ao fim do dia com uma rouquidão tal que, noutro contexto, poderia soar à mais melódica entoação de acasalamento.
E depois aparecem os castigos. Aqueles que são para eles mas que, afinal, me saem da pele. “Esta semana não vais aos treinos” revela-se, então, na perda de três horas semanais de (mais) silêncio. “As tarefas de hoje vão ser todas assumidas por ti”, transforma-se num copo que escorrega das mãos do mais novo e que me obriga a afastar frigorífico e fogão para apanhar os cacos (do dito e os meus) do chão. E o “ficas sem telemóvel até amanhã” não é mais do que 24 horas de respostas cansadas e arrastadas à permanente pergunta de “o que é que eu faço agora?”.

Hoje foi dia de despachar trabalhos de casa. E de, como terapia consequente, ter decidido que era dia de fazer limpeza geral à cozinha. Depois de estar séculos (o tempo desagradável parece sempre mais longo, certo?) a explicar contas de dividir, a responder a dúvidas sobre aritmética (Google, adoro-te!) e a ajudar a diferenciar a pequena da grande circulação, senti que o meu próprio sistema circulatório estava altamente comprometido e estipulei uma hora para outros afazeres. De esfregona e lava-tudo em riste, pus a minha cozinha num brinco e a minha alma em estado zen.

Até que, por ironia do destino, me telefonou uma amiga a pedir conselhos para lidar com a exaustão a que o seu filho único a leva. A minha solução? Descomplicar. Rir. Um copo de vinho no dia ‘sem filhos’. E, naquele dia em que nos sentimos no limite, uma limpeza geral à casa, que parece ter efeitos terapêuticos únicos.

Alda Benamor