O meu filho Tomás ontem implorou a uma professora para lhe passar trabalhos de casa. A tabuada do 1 ao 10, exercícios, interpretação de textos. Pediu-me para fazer os TPC’s no final da tarde e, depois do jantar, ainda me perguntou se eu lhe podia passar “contas” para ele resolver antes de ir para a cama.

O meu filho Tomás não é um rato de biblioteca nem um apaixonado pela escola. Acontece que, um mês e meio depois do arranque do ano letivo, ele e o irmão continuam sem professora. Andam desterrados em outras salas para que alguém os acompanhe, assistindo a aulas de 1º e 2º ano que nada contribuem para o seu desenvolvimento académico.

[Vá, não vou ser exagerada: em sete semanas de aulas, os meus filhos tiveram professora durante cinco dias. Uma benção do nosso sistema educativo!]

Venham agora falar-me da dificuldade de colocação de professores, da complexidade do sistema de contratação, dos entraves que o ministério e os processos colocam ao tema. Mas também gostava que me explicassem por A+B como é que existem tantos professores desesperados por uma colocação efetiva, mesmo tendo de acordar duas horas mais cedo para picar o ponto à hora exata. Já agora, expliquem-me também o que é que eu devo fazer com um dos meus filhos que, tendo necessidades educativas especiais, já perdeu um mês e meio de matéria no ano que, no ensino básico, é considerado mais complexo e exigente.

Pormenores, num sistema em que as ilusões do sucesso camuflam as incoerências reais, levando a que 20 crianças sem aulas numa qualquer rua escondida sejam um detalhe supérfluo para os senhores que se deixam conduzir por motoristas milionários.

“Estamos a fazer os nossos melhores esforços”, diz-me quem de direito, pedindo-me “paciência” para o processo. Algo que, como “quem de direito” também já terá compreendido, já comecei a perder há muito tempo.
Torna-se ironicamente ridículo termos de andar a implorar para que deixem os nossos filhos estudar. Para que um sistema que devia ser justo, racional e organizado garanta o que já devia ser assegurado à partida: o ensino e a educação de quem, um dia, poderá estar a assumir as funções que hoje são ocupadas por estes senhores engravatados.

[Por senhores que, com toda a certeza, mais tarde quererão que os seus filhos ou netos possam simplesmente estudar. E que, no desespero, não tenham de implorar por contas de dividir que possam praticar em casa.]

Alda Benamor