A alimentação é fundamental para a sobrevivência, crescimento e desenvolvimento das crianças. Por este motivo, desde cedo os pais preocupam-se com o tipo e quantidade de alimentos que as crianças ingerem diariamente.
Todos os comportamentos integrados no processo de alimentação (e.g., preferências alimentares, uso dos utensílios adequados, quantidade de alimentos) são essencialmente aprendidos. Esta aprendizagem é visível logo nos primeiros dias de vida da criança. É na interação com a mãe que o bebé aprende a distinguir os primeiros sinais de fome, descobre os alimentos, as diferentes texturas e sabores e, consequentemente, desenvolve as suas preferências alimentares.
Estas primeiras interações com os alimentos são muitas vezes fonte de ansiedade para pais e cuidadores. Nem sempre é fácil perceber os sinais que a criança transmite! Consequentemente, os momentos das refeições acabam por parecer autênticos campos de batalha, onde os pais tentam de todas as formas alimentar os seus filhos e os filhos tentam, da melhor forma que conseguem, mostrar aos pais o que estão a sentir nesse momento. Daqui surge o que comumente é conhecido como a “birra alimentar”.
Comecemos por desconstruir este termo, uma “birra” consiste numa explosão de fúria ou frustração por parte da criança que normalmente se traduz em períodos de choro, gritos e/ou agressividade. As “birras” são estratégias usadas pelas crianças para expressarem e gerirem as suas emoções. Neste sentido, quando temos uma “birra” é porque algo se passa no mundo desta criança, e esta é a forma encontrada para demonstrar essa inquietude.
Uma “birra alimentar” é uma manifestação comportamental que ocorre concretamente durante os períodos de alimentação. Mais uma vez, a criança está a tentar dizer-nos que algo não está bem durante estes momentos. Podem traduzir medo em experimentar novos alimentos (neofobia), dificuldade em lidar com a textura e/ou sabor dos alimentos, alterações sensoriais, orgânicas, entre outras. As causas destas birras particulares são diversas e, normalmente confundem pais e cuidadores. Com frequência os pais relatam que as refeições são longas e conflituosas, as crianças recusam comer ou não ingerem alimentos muito específicos ou cozinhados de uma determinada forma.
Por outro lado, são igualmente de considerar outros fatores, nomeadamente as expectativas dos pais e cuidadores quanto ao processo de alimentação e as práticas adotadas pelos mesmos. A aprendizagem do processo de alimentação exige tempo e paciência que, num mundo tão exigente, acaba por se tornar uma tarefa árdua para quem alimenta.
O processo de alimentação deve ser encarado como um processo dinâmico e interativo entre pais e/ou cuidadores e criança. Muitas vezes implica ter um espaço adequado para alimentar, livre de estímulos exteriores (e.g., tv, telemóveis, computadores, brinquedos), onde a criança possa tocar na comida, sujar-se a si própria e, muitas vezes, até aos próprios pais!
Para além disso, os pais devem estar disponíveis e atentos ao longo do processo. A atenção total dos pais é importante na resolução das birras alimentares. Os pais focam-se nos comportamentos e reações das crianças, percebem as suas preferências e os sinais de fome e saciedade. As refeições em que os pais se mostram focados na tarefa demoram menos tempo e levam à ingestão alimentar considerada adequada à criança.
A intervenção na área do comportamento alimentar é efetuada por uma equipa multidisciplinar que pretende ajudar pais e cuidadores a perceberem e lidarem com as “birras alimentares” e outros comportamentos alimentares mais graves, despistar possíveis causas orgânicas e, auxiliar na adoção de estilos de vida saudáveis.
Da nossa experiência junto de pais e respetivas crianças, deixamos algumas dicas:
- analise os sinais que a criança transmite durante o processo de alimentação: respeite sempre os sinais de fome e saciedade que a criança transmite;
- ofereça um novo alimento pelo menos 8 vezes: deve sempre incentivar a provar, se após cada exposição a criança recusar o alimento, então é porque não gosta por algum motivo;
- não force a criança a comer;
- estabeleça um horário para cada refeição e procure segui-lo;
- as refeições devem ser feitas num ambiente agradável e interativo;
- as crianças são os nossos maiores fãs, se quer que ela coma um determinado alimento, mostre que também o come e aprecia!
Texto: Joana Fernandes e Andreia Leitão
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