“Estas redes pretendem dar um apoio mais virado para as crianças e jovens, mas também para as famílias, para conseguirem integrar-se e refazer as suas vidas” nos locais de acolhimento, referiu Carolina Reis, gestora da iniciativa que a organização não-governamental para o desenvolvimento está a lançar em aldeias de Mieze, junto à capital provincial, Pemba.

O projeto Redes para a Proteção funciona juntando pessoas de cada comunidade que estarão atentas a vulnerabilidades, abusos, casos de exploração, entre outros problemas, em articulação com os atores institucionais e as lideranças locais.

A maioria dos beneficiários que se prevê alcançar são crianças: cerca de 19.500.

É mais um “olhar atento” às crianças deslocadas, uma atenção extra que se justifica pelo contexto específico de fuga da violência: “saíram das suas casas, perderam familiares e têm as condições básicas de vida postas em causa”, acrescentou Carolina Reis.

As escolas e comunidades devem estar capacitadas para acolher e devem ser ultrapassadas barreiras ao ingresso e progressão escolar.

“Cada rede tem um representante que irá a Mieze uma vez por mês”, para uma reunião geral das 14 comunidades e instituições, como a administração local, polícia ou outras autoridades, para debater as situações detetadas e encontrar soluções.

O fundo de emergência escolar será uma das faces visíveis do projeto, destinada às famílias mais vulneráveis entre os deslocados e que mais crianças deixam fora da escola.

“O fundo dá para abranger 3.000 crianças nas 14 comunidades”, com base no valor inicial, “depois podem vir outros apoios” e o número crescer, sublinhou a gestora da iniciativa.

A incapacidade em adquirir material escolar e uniforme são duas dificuldades já identificadas pelos 11 ativistas do projeto junto das comunidades – apesar de os diretores das 16 escolas envolvidas já terem anunciado que as crianças deslocadas não precisam de usar o tradicional uniforme para frequentar as aulas.

“Às vezes, o que se passa, é as famílias não conseguirem pagar” nem as despesas mínimas, “porque o número de filhos é grande e, assim, algumas ficam por ingressar”, referiu – sendo que cada mulher moçambicana tem, em média, cinco filhos.

Despesas que podem ser também de deslocação até à escola ou alimentação, custos elevados, seja quanto for, para quem perdeu tudo.

É aqui que o fundo de emergência escolar deverá entrar em ação.

Para já, decorrem levantamentos para que sejam definidos critérios que permitam, depois, dentro das redes de proteção, escolher quais as famílias que vão beneficiar do apoio em cada comunidade.

O fundo servirá para apoiar a frequência da primeira classe ao 12.º ano de escolaridade.

A iniciativa da Helpo está também a dar formação inicial na área da psicologia para que cada comunidade possa estar atenta a sinais de trauma por parte das crianças deslocadas.

A ideia é “capacitar as comunidades para que possam dar algum tipo de apoio, uma espécie de primeiros-socorros psicológicos”, face a problemas que alguma criança possa apresentar, para depois as encaminhar para os serviços apropriados.

O projeto Redes para a Proteção é apoiado pela cooperação portuguesa através do instituto Camões e ainda pela Mozambikes e pela Fundação Galp, com um orçamento total a rondar os 180 mil euros para um ano – de janeiro a dezembro de 2022.

A iniciativa surge na esteira de outra ação da Helpo em Pemba, o projeto Karibu, uma iniciativa de integração de deslocados em ambiente escolar.

No âmbito do Karibu foram inaugurados, em fevereiro, dois blocos de três salas de aula cada qual, nas escolas primárias completas de Mahate e de São Carlos Lwanga.

A província de Cabo Delgado é rica em gás natural, mas aterrorizada desde 2017 por rebeldes armados, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

Há 784 mil deslocados internos devido ao conflito, de acordo com a Organização Internacional das Migrações (OIM), e cerca de 4.000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED.

Desde julho de 2021, uma ofensiva das tropas governamentais com o apoio do Ruanda a que se juntou depois a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) permitiu recuperar zonas onde havia presença de rebeldes, mas a fuga destes tem provocado novos ataques noutros distritos usados como passagem ou refúgio temporário.