
O sistema imunitário é o sistema de defesa do nosso organismo, que normalmente nos protege contra invasores como bactérias e vírus. Nas doenças autoimunes, o sistema imunitário reconhece as próprias células como estranhas ao corpo, atacando as células saudáveis.
Existem dezenas de doenças autoimunes, que podem envolver qualquer órgão ou sistema. Algumas das mais frequentes são a artrite reumatoide, o lúpus eritematoso sistémico, a esclerose múltipla, a diabetes mellitus tipo 1, a doença inflamatória intestinal que inclui a doença de Crohn e a colite ulcerosa, a psoríase e a tiroidite de Hashimoto.
A etiologia das doenças autoimunes depende de vários fatores, nomeadamente genéticos, havendo um risco aumentado em caso de história de doenças autoimunes na família, ambientais, hormonais e imunológicos.
O stress emocional pode desencadear ou agravar os sintomas das doenças autoimunes, mas existem outros fatores, tais como o stress físico, as infeções, a exposição a radiação ultravioleta, a exposição a toxinas ou produtos químicos, as cirurgias ou a gravidez.
As doenças autoimunes são mais comuns em mulheres, sugerindo que as hormonas sexuais podem desempenhar um papel no seu desenvolvimento. Alterações hormonais, como as que ocorrem durante a gravidez ou menopausa, podem influenciar o aparecimento ou agravamento dos sintomas. Algumas doenças autoimunes afetam diretamente a tiroide, levando a alterações nos níveis de hormonas tiroideias. Também níveis elevados de cortisol, relacionados frequentemente com o stress, podem agravar os sintomas.
A maior incidência de doenças autoimunes em mulheres sugere um papel das hormonas sexuais, em particular os estrogénios. A presença de dois cromossomas X nas mulheres pode influenciar a expressão de genes relacionados com a imunidade, evidenciando o papel dos fatores genéticos. Outros fatores que podem contribuir incluem diferenças no sistema imunológico e diferenças na exposição a fatores ambientais e stress.
Não existe uma relação direta entre as doenças autoimunes e traços de personalidade, mas viver com uma doença autoimune, crónica, pode ser desafiante. A imprevisibilidade da doença e dos surtos, a incerteza relativa ao tratamento, a dor crónica, a fadiga e o impacto na vida diária podem fazer com que muitas pessoas sintam níveis aumentados de ansiedade, sentimentos de frustração, desejo de controlo, maior grau de autoexigência.
Prevenção
Não existe forma de prevenir o aparecimento destas doenças, uma vez que dependem de uma combinação de vários fatores. No entanto, existem algumas estratégias gerais que podem ajudar a reduzir o risco de desenvolver uma doença autoimune, tais como um estilo de vida saudável, com uma dieta equilibrada e exercício físico regular, evicção do tabaco e a exposição a outras toxinas, vacinação adequada, sono adequado e controlo do stress.
Diagnosticar uma doença autoimune é um processo desafiante, uma vez que os sintomas são muitas vezes inespecíficos e podem sobrepor-se a diferentes patologias. A história clínica e o exame físico constituem a base do diagnóstico e orientam a nossa investigação, não existindo nenhum teste padrão para despiste de doença autoimune. Dependendo da nossa suspeita, podem ser pedidas análises ao sangue com pesquisa de anticorpos e outros parâmetros, exames de imagem para avaliação de lesões em articulações ou órgãos, biópsias para análise de uma pequena amostra de tecido, testes funcionais para avaliar a função de órgãos-específicos.
Não é possível determinar qual a doença autoimune mais limitante no dia a dia, dado que cada uma apresenta desafios únicos e a mesma doença não afeta todas as pessoas da mesma forma.
No entanto, algumas doenças causam frequentemente impacto significativo na qualidade de vida. A artrite reumatoide afeta sobretudo as articulações, causando dor, rigidez e inchaço, frequentemente ao nível das mãos; com o tempo, pode levar a deformidades articulares e a dificuldades significativas na realização de atividades diárias. O lúpus eritematoso sistémico pode afetar múltiplos órgãos e sistemas, incluindo pele, articulações, rins, coração e sistema nervoso, causando uma ampla gama de sintomas que podem ser bastante incapacitantes.
Tratamento
O tratamento das doenças autoimunes pode ser muito variável, dependendo da doença específica e da gravidade dos sintomas. Como são doenças crónicas, normalmente requerem tratamento para a vida. Podem ser utilizados medicamentos imunossupressores, que reduzem a atividade do sistema imunológico, diminuindo assim a inflamação e o dano dos tecidos. Em alguns casos, são utilizados medicamentos biológicos, que atuam em alvos específicos do sistema imunológico. Para alívio dos sintomas, são frequentemente usados analgésicos e anti-inflamatórios.
As medidas de estilo de vida podem ter um impacto significativo na gestão das doenças autoimunes, ajudando a melhorar a qualidade de vida e a reduzir os sintomas, pelo que devem ser sempre promovidas como forma complementar ao tratamento farmacológico.
Devemos promover uma dieta equilibrada, rica em frutas, legumes e boas fontes de gordura e cálcio, exercício físico regular, que deve ser adaptado às capacidades individuais, controlo do stress através de técnicas de relaxamento, como yoga ou meditação, sono adequado, parar de fumar e limitar o consumo de álcool, manter um peso adequado, identificar e evitar certos alimentos ou exposição solar que possam agravar os sintomas.
Um artigo das médicas Patrícia Pinto e Catarina Silva, reumatologistas da Sociedade Portuguesa de Reumatologia.
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