O que o IPCC diz sobre os regimes alimentares?
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), uma agência da ONU, defende que mudar os hábitos de consumo e de produção alimentares é uma das chaves para combater o aquecimento global. "Alguns regimes alimentares necessitam de mais solo e água e produzem mais emissões que outros", resumiu um dos seus copresidentes, Jim Skea, ao apresentar o resumo do documento. Uma frase do texto destaca este ponto:
"Dietas equilibradas à base de alimentos de origem vegetal, como aquelas baseadas em cereais secundários [outros que não os principais, como o arroz e o trigo], leguminosas, frutas e verduras, oleaginosas e sementes, e alimentos de origem animal produzidos em sistemas resistentes, sustentáveis e com baixas emissões de gases de efeito estufa, apresentam grandes oportunidades".
Esta perspetiva evoluiu ao longo das diferentes versões redigidas nos últimos meses. A versão final é fruto de um consenso político, após a análise do texto pelos Estados.
O IPCC recomenda uma dieta em particular?
Este grupo de cientistas, sob os auspícios da ONU, encarrega-se de guiar as decisões que os Estados adotam sobre a questão climática. "O IPCC não formula recomendações sobre os regimes alimentares", especificou Skea. "O que indicamos, com base em testes científicos, é que alguns [...] deixam uma menor pegada de carbono" que outros.
O grupo não recomenda adotar uma dieta vegetariana (sem carne ou peixe) e menos ainda um regime vegano (sem nenhuma proteína animal), ao contrário do que alguns meios afirmaram antes da publicação do relatório.
Essa alegação foi baseada numa citação truncada do texto, omitindo a passagem sobre "alimentos de origem animal produzidos em sistemas resistentes, sustentáveis e com baixas emissões de gases de efeito estufa", salienta a agência de notícias France-Presse.
A carne é uma questão central?
Estudos científicos precedentes concluíram que a produção de carne, por meio da pecuária intensiva, tem mais impacto ambiental que a de outros alimentos. "É evidente que reduzir a procura de carne é uma forma importante de diminuir o impacto ambiental do sistema alimentar", recordou esta quinta-feira um especialista britânico, Alan Dangour, em reação a um estudo simultâneo ao relatório do IPCC.
Mas o relatório da Plataforma Intergovernamental de Ciência e Política sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos (IPBES), publicado no início de maio, não recomendava diretamente comer menos carne. A formulação foi suavizada em relação à versão preliminar, um sinal provável da hostilidade de alguns países produtores de carne.
Como se alimentar no futuro?
O IPCC segue o mesmo caminho de recomendações recentes ao falar de cereais, verduras e oleaginosas. Em janeiro, um relatório realizado em conjunto pela revista médica The Lancet e pela ONG Fondation EAT recomendava uma "transformação radical": reduzir para metade o consumo mundial de carne vermelha e de açúcar e duplicar o de frutas, verduras e oleaginosas.
Segundo estes especialistas, a dieta diária ideal seria composta por 300 gramas de verduras, 200 de frutas, 200 de cereais integrais, 250 de leite integral e apenas 14 gramas de carne vermelha, ou seja, dez vezes menos do que um bife tradicional. As proteínas seriam obtidas da carne de ave, do peixe, dos ovos ou das oleaginosas.
Como se adaptar em cada país?
Estas mudanças variariam em função do país.
A contribuição de proteínas animais às vezes é insuficiente nos países pobres, mas abundante nos países ricos da Europa e da América. Além disso, os hábitos alimentares também diferem.
"As práticas de produção locais e os costumes culturais influenciam na hora de escolher alimentos", lembrou Jim Skea.
O informe da The Lancet levou em conta este parâmetro e estabeleceu "faixas de ingestão recomendadas por grupos de alimentos" para uma ingestão diária total de 2.500 calorias, a serem adaptadas localmente segundo "a cultura, a geografia e a demografia".
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