A defesa do médico no exercício da profissão exige uma necessidade de ser acautelada

numa sociedade cada vez mais agressiva e litigante.

Esta circunstância leva a insistir na instituição contínua, mas a intervalos definidos de programas validados pela comunidade científica, susceptíveis de dar visibilidade à progressão global dos médicos e ao esforço permanente em prol das populações.

O que a não ter acolhimento quer pelo SNS, quer pelos Privados, deveria ser ao Estado que, em sede de IRS caberia a correspondente dedução fiscal.

Considero que, como nunca, a Ordem dos Médicos que representa todos os médicos, independentemente da sua relação jurídica de emprego com quaisquer terceiras entidades, carece de reforço estratégico para a defesa a longo prazo dos médicos portugueses.

A principal questão é entender de que maneira se dá a relação entre profissionalização e proletarização entre os médicos.

Assumamos a proletarização basicamente como a desqualificação do trabalhador e a degradação do trabalho e a profissionalização como um processo aparentemente oposto no âmbito social e ocupacional do trabalho médico.

Então e voltando ao argumento desta divagação, o primeiro ponto relaciona-se com a evolução geracional verificada na classe médica lusitana.

São jovens nascidos no final do século passado ou já neste, numa época bem diferente, filhos de pais que foram surpreendidos pelo 25 de Abril e por uma transformação alargada das mentalidades, das instituições, das relações e das ambições.

Alguém dizia no final doa anos 90 que Portugal iria ter um médico em cada família, em vez da prometida relação de um médico para cada família…

Todos os sistemas de saúde têm evoluído no sentido da industrialização e massificação dos cuidados de saúde. O SNS seguiu esse exemplo.

Depois o tremendo e rápido desenvolvimento tecnológico e do bem-estar social teve o condão de colocar as dificuldades de então, a falta de acessos – estradas e autoestradas, transportes públicos, automóveis ou telecomunicações – ou as taxas de analfabetismo e pobreza, a anos de luz da realidade. Os jovens médicos ainda não compreenderam que, a confiança é a base fundamental da relação médico-doente e que conhecemos estudos sobre a relação entre a forma de pagamento do médico e a confiança do doente e aquilo que torna a confiança robusta.

O terceiro ponto, em época de oportunidades e de riscos, recorda aos novos clínicos uma profissão de muito esforço e trabalho e um desafio para ser assumido e vencido.

Existe uma tendência crescente para ver a medicina como uma qualquer outra ocupação ou profissão, tal como o sentido economicista contabiliza cirurgias ou consultas, como sapatos ou garrafas de gás.

Os Médicos não estão imunes, a esta lógica capitalista de produção tendente à racionalização, padronização e rotinização do trabalho, centrada em indicadores…

O quarto aspecto relaciona ser médico como profissão idealmente com a vocação, sendo exigido muito trabalho e esforço, um estudo e desenvolvimento pessoal permanente e contínuo, enquanto activo de valorização. Assim, os incentivos não financeiros à actividade dos profissionais de saúde podem ter um papel considerável na sua motivação e impacto como complemento e reforço do poder dos incentivos financeiros.

A seguir, a rigidez do serviço público em si e o desânimo que provocam nos seus quadros. A complexidade cretina de enquadramentos e disposições legais e aspectos burocráticos que cerceiam o envolvimento público, e ainda pela responsabilidade partidária das gerações governativas incapazes de celebrar os tais Pactos de Regime que, quanto à Saúde e ao SNS são indispensáveis. Veja-se o ponto a que chegamos já e a deterioração que se avizinha!

Por fim a evolução remuneratória. Em teoria o pagamento por salário não facilita a relação médico-doente, pois incentiva o desenvolvimento da organização centrada no

profissional e não no doente. A Administração Pública não se compatibiliza com quem tem por objectivo de vida ganhar muito dinheiro. Por isso os concursos e as vagas permanecem desertos ou quase, dependendo das perspectivas…

13Creio que a criação de um Estatuto do Médico global, multidimensional e para o Futuro, entre a Ordem e o Estado, beneficiando dos erros identificados e de uma nova era sociológica e da Inteligência Artificial que já nos substituiu enquanto depositários de conhecimentos e saberes, recolocando os médicos no patamar de credibilidade e de reconhecimento que já usufruíram, daria respostas quanto à igualdade das condições de exercício profissional em todas as unidades de saúde, seja qual for o respetivo estatuto jurídico e desmentir Einstein, quando afirmava que “é muito desanimador viver-se num tempo em que é mais fácil rebentar um átomo do que um preconceito”!