Numa carta dirigida à direção da Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), à qual a Lusa teve acesso no domingo, os alunos falam em falta de equipamentos de proteção individual (EPI) e referem que, em caso de surtos em locais de estágio, não são tratados como profissionais de saúde, temendo ser "veículos de transmissão" quer para doentes, quer para as próprias famílias, entre outras denúncias e críticas.
“Não queremos contribuir para a rutura de um SNS [Serviço Nacional de Saúde] já fragilizado, por nos expormos a perigos desnecessários. Não queremos contribuir para a morte dos doentes de quem tratamos ou de um entre querido, porque não temos acesso aos EPI que seriam necessários ou porque não nos foi disponibilizado um teste de despiste. Queremos fazer parte da solução, não contribuir para o agravamento do problema”, lê-se na carta.
Reagindo a esta denuncia, a AEESEnfP ressalva, num comunicado enviado hoje à Lusa, que “esta não é uma opinião representativa dos mais de 600 estudantes que se encontram a frequentar ensinos clínicos”, não se revendo, assim, nas declarações daquele grupo de alunos.
A AEESEnfP, enquanto entidade oficial representativa dos mais de 1.600 estudantes matriculados na ESEP, realça que não lhe foi dirigida qualquer carta ou comunicação face ao desagrado dos estudantes e, “como tal, a mesma não se constitui uma representação oficial daqueles que são os interesses de todos os estudantes”.
No comunicado, a presidente da associação de estudantes, Diana Lopes Cardoso, refere que divulgou na sexta-feira, face às recomendações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) e ao despacho emitido pelo presidente da ESEP no que concerne a continuação dos ensinos clínicos, um formulário com o intuito de averiguar as preocupações e perspetivas dos estudantes, de modo a ser possível colmatar os possíveis constrangimentos sentidos.
“Num total de 200 respostas, obteve-se apenas 70 por parte dos estudantes do 3.º e 4.º anos. Destas, foram evidenciadas pelos estudantes situações de ausência de EPI adequados, porém, nenhum estudante refere o local em que a situação decorre”, sustenta Diana Lopes Cardoso.
Deste modo, acrescenta que a AEESEnfP divulgou, novamente, um apelo a que os estudantes referissem concretamente as situações em que tal situação se verifica, mas “até à hora não foi obtida qualquer tipo de participação”.
Realça que “a esmagadora maioria dos constrangimentos que constam no documento integral, ao qual a AEESEnfP posteriormente teve acesso, em nenhum momento foi exposto no referido formulário ou em comunicação com a AEESEnfP, pelo que, sem conhecimento das situações, não é possível proceder à resolução das mesmas”.
“Todas as preocupações dos estudantes, nomeadamente aquelas a que a AEESEnfP teve acesso a partir do formulário indicado, foram remetidas aos órgãos de gestão da ESEP, pelo que os mesmos deram seguimento à sua resolução, tal como já acontecera previamente”, acrescenta.
Assegura ainda que a escola, “em contacto contínuo com a Associação de Estudantes e restantes Órgãos da ESEP, tem vindo a lutar e a trabalhar avidamente no sentido de proporcionar as melhores condições ao percurso académico dos estudantes, dado as condições pandémicas, esforço esse que merece ser reconhecido”.
Na carta dirigida à direção da ESEP, os alunos dizem-se “preocupados, indignados e frustrados com algumas situações que se têm passado”.
Contam que “muitas vezes” lhes é dada uma máscara cirúrgica “para um turno inteiro de trabalho”, no qual contactam “com inúmeros doentes com máscaras mal colocadas ou sem elas”.
“Nestas situações, e segundo a evidência científica, a eficácia da máscara cirúrgica torna-se diminuta”, referem.
Os alunos aproveitam para reivindicar testagem, apontando que “por mais cuidadosos” que se revelem podem constituir “um veículo de transmissão entre doentes” e lembram, entre outros cenários, que se deslocam em transportes públicos.
Dizem não se sentir “apoiados pela instituição” que escolheram, dizem-se “exaustos” e exigem “mais segurança, compreensão por parte dos professores”, bem como “preocupação” da escola com a sua “saúde mental”.
A agência Lusa contactou a direção da ESEP que remeteu esclarecimentos para um comunicado distribuído à comunidade educativa, no qual se lê que a escola “mantém a firme determinação de contribuir ativamente para a prevenção e o controlo da pandemia covid-19, mas também de garantir a qualidade do ensino e a conclusão, com sucesso, dos percursos formativos dos seus estudantes”.
No texto, assinado pelo presidente António Luís Carvalho, a ESEP garante que “nos contextos de ensino clínico e de estágio, os estudantes têm acesso aos EPI e aos testes de diagnóstico covid-19 nas mesmas condições que os enfermeiros dos respetivos serviços, em articulação com as instituições de saúde”.
“Apesar das inúmeras e significativas dificuldades, este momento tem vindo a ser identificado como de excecional oportunidade de aprendizagem para os futuros enfermeiros, que não pode deixar de ser aproveitada”, pode ler-se na comunicação.
Já quanto à vacinação, a ESEP lembra que os grupos prioritários foram definidos por entidades competentes exteriores, mas revela que a escola está em “articulação e sintonia” com a Ordem dos Enfermeiros, Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos e Federação Nacional de Estudantes de Enfermagem “a desenvolver as estratégias necessárias à inclusão dos estudantes nos grupos prioritários”.
A escola salvaguarda que as condições para a continuidade dos ensinos clínicos e estágios foi discutida com os ministérios da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e da Saúde, e as diferentes instituições de saúde, e que “a formação de enfermeiros e a conclusão dos cursos têm vindo a ser apresentadas como fundamentais para a estratégia de combate à pandemia”.
A direção refere ainda que, “consciente das dificuldades e dos constrangimentos do momento”, disponibiliza aos alunos a possibilidade de solicitarem a suspensão de matrícula, o que se traduz no adiamento os seus percursos formativos.
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