Cerca de 736 milhões de adolescentes e mulheres com 15 anos ou mais sofreram algum tipo de agressão, principalmente nas mãos dos seus parceiros, afirma a Organização Mundial da Saúde (OMS) num relatório publicado um dia após o Dia Internacional da Mulher.

"A violência contra as mulheres é endémica em todos os países e culturas e prejudica milhões de mulheres e as suas famílias", disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

Embora no momento não haja dados sólidos, a pandemia, que obrigou centenas de milhões de pessoas à reclusão e causou uma crise económica global, está a ter um impacto claramente negativo, ressaltou Claudia García Moreno, uma das autoras do relatório.

"Sabemos que a situação de muitas mulheres provavelmente piorou", disse à AFP, observando que 641 milhões, ou 26% de todas as mulheres com 15 anos ou mais, foram vítimas de violência pelos seus parceiros. "As mulheres que já sofriam abusos foram apanhadas nesta situação. De repente, viram-se mais isoladas e continuamente na presença do parceiro abusivo", ressaltou.

Além disso, as dificuldades financeiras e o stress de ter os filhos em casa e outros problemas criados pela pandemia podem levar ao aumento da violência.

"Sabemos que alguns desses fatores que agravam a violência doméstica estão presentes", disse Garcia Moreno.

"Índices elevados"

O relatório desta terça-feira é o segundo do tipo e é baseado em dados recolhidos entre 2000 e 2018. No entanto, uma mudança na metodologia dificulta as comparações com um primeiro artigo sobre o assunto publicado em 2013.

Para a investigadora, o que fica claro "é que os índices [de violência doméstica] estão muito elevados e é preciso agir com urgência".

O relatório estima que 6% de todas as mulheres foram abusadas sexualmente por alguém que não é o seu parceiro, mas o tabu em torno dessa questão sugere que o número real é muito maior.

Esse tipo de abuso geralmente começa muito cedo. Um quarto das adolescentes com idades entre os 15 e 19 anos que estiveram num relacionamento sofreram abuso físico ou sexual por parte dos seus parceiros. "Isso é preocupante porque a adolescência e o início da vida adulta são períodos importantes para a saúde e o desenvolvimento e também para a construção de bases para relacionamentos saudáveis", afirma a médica. Também aponta para diferenças regionais, embora o nível de violência "seja muito alto em todos os lugares".

Os países pobres tendem a experimentar níveis mais elevados de violência contra as mulheres do que os países mais ricos, sendo a Oceania a região mais afetada por este flagelo, uma vez que 51% das mulheres com idades entre os 15 e 49 anos são vítimas deste tipo de abuso.

O sul da Ásia e a África Subsaariana também são gravemente afetados. Já o sul da Europa apresenta a menor taxa, com 16%. "Isso pode ser porque as mulheres têm mais oportunidades de sair de relacionamentos abusivos, com maior acesso aos serviços e maior proteção jurídica", afirma a autora.

O chefe da OMS pediu aos governos que ajam porque, "ao contrário da COVID-19, a violência contra as mulheres não pode ser interrompida com uma vacina".