No Dia Internacional do Enfermeiro de 2025, deixamos uma mensagem clara: cuidar dos enfermeiros é essencial para cuidar da saúde da população, para sustentar o sistema de saúde e para desenvolver o país. Não se trata de uma reivindicação profissional, é uma exigência social, económica e ética.
Este ano, o Conselho Internacional de Enfermeiros (ICN) lançou um alerta e um compromisso com o lema “Our Nurses. Our Future. Caring for nurses strengthens health systems and economies”, ou seja, “Os nossos Enfermeiros. O nosso Futuro. Cuidar dos enfermeiros fortalece os sistemas de saúde e as economias”.
O mais recente relatório do ICN mostra que o mundo enfrenta uma escassez crítica de enfermeiros, que o abandono da profissão está a aumentar e que os sistemas de saúde que não cuidam dos seus profissionais estão a falhar na resposta às necessidades da população. E Portugal não é uma exceção.
Vivemos num país onde faltam mais de 14 mil enfermeiros no SNS, onde continuamos abaixo da média europeia no número de profissionais e onde se multiplicam os contextos em que se trabalha em esforço constante. Mas esta realidade não se limita ao setor público. No setor privado e no setor social, os enfermeiros enfrentam também condições injustas. Os dados mais recentes indicam que, só em 2024, os enfermeiros do SNS realizaram 5,6 milhões de horas extraordinárias. Estas horas não substituem profissionais, nem resolvem problemas estruturais — apenas prolongam a sobrecarga, perpetuam a exaustão e agravam a insustentabilidade de um sistema que insiste em não ouvir quem cuida.
Como bastonário, ouço diariamente relatos de exaustão, de sobrecarga e de frustração. Enfermeiros que se sentem impedidos de cuidar como sabem. Que veem condições mínimas falharem. Que deixam o sistema público ou o país porque não vislumbram qualquer futuro. Esta realidade tem um nome: ferida moral. A dor ética de não conseguir prestar os cuidados que se considera devidos. E tem um custo altíssimo na saúde dos profissionais, na qualidade dos cuidados e na confiança da sociedade.
Mas este também é um tempo de oportunidades. Já conseguimos conquistas importantes. A criação do Internato de Especialidade, em curso, permitirá finalmente alinhar a formação especializada da enfermagem com os padrões europeus. No SNS, a atualização da grelha salarial e a correção da contagem de pontos na carreira fizeram justiça a milhares de profissionais, embora os setores privado e social continuem a debater-se com problemas de retenção enfermeiros em virtude de salários baixos e falta de outros incentivos. Por outro lado, começa agora a discutir-se, com seriedade, a regulamentação da prescrição por enfermeiros, a antecipação da idade da reforma e um subsídio de risco, que possa refletir o desgaste acumulado de quem trabalha em contextos física e emocionalmente exigentes.
O ICN lembra-nos que cada investimento feito na proteção e valorização dos enfermeiros gera retorno em saúde, segurança e economia. Está demonstrado que equipas com mais enfermeiros produzem melhores resultados em saúde, reduzem o número de complicações e reinternamentos, diminuem custos, quer operacionais, quer na própria economia do país, e aumentam a satisfação dos utentes. Investir em Enfermagem é uma decisão racional, com impacto direto na produtividade, na equidade e na coesão dos sistemas.
A Organização Mundial da Saúde no relatório State of the World’s Nursing crítica a ausência de enfermeiros em áreas de liderança, salientando que representa um desperdício de conhecimento e de capacidade de gestão. Sabemos, por experiência, que onde há uma liderança de enfermagem sólida e presente, os resultados em saúde melhoram, os recursos são mais bem geridos e a qualidade dos cuidados é mais elevada.
O que falta agora é compromisso político. Um plano de ação para a enfermagem, com metas claras e uma visão integrada de recursos humanos, formação, regulação, retenção e liderança. É preciso que os enfermeiros também estejam onde se decide, que as suas competências sejam plenamente reconhecidas, e que a sua voz seja respeitada.
Neste Dia Internacional do Enfermeiro, não queremos atos simbólicos. Queremos mudanças. Mudanças que permitam aos enfermeiros continuar a cuidar com humanidade, com ciência e com dignidade.
Porque cuidar dos enfermeiros é, verdadeiramente, cuidar do país. Sem enfermeiros, não há cuidados. Sem cuidados, não há saúde. E sem saúde, não há futuro.
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