Neste artigo, vai aprender que podemos atuar em relação a alguns fatores de risco do cancro da mama, associados ao estilo de vida, além de descobrir o que temos de fazer para que seja detetado o mais cedo possível. Ficará também a conhecer as ferramentas da ciência que oferecem anos de vida a quem é afetado por esta doença. Sim, vamos contar-lhe o que qualquer mulher deve saber! Veja também a galeria de imagens com os gestos que podem salvar a sua vida.
Apenas 10% dos casos de cancro da mama têm origem em fatores hereditários. "Os restantes casos acontecem devido a um conjunto de situações que aumentam o risco de malignização das células", explica Fátima Cardoso, oncologista médica. Alguns fatores de risco, como a idade e a raça, não podem ser alterados. Outros estão associados a fatores cancerígenos ambientais e outros, ainda, estão relacionados com comportamentos individuais, como fumar, beber e o tipo de alimentação.
"Alguns influenciam mais o risco do que outros e o risco pode ir mudando ao longo do tempo, devido a fatores como o envelhecimento ou o estilo de vida", explica a American Cancer Society. Na prática, isto significa que "há fatores de risco em relação aos quais nada podemos fazer, como o facto de sermos mulheres, a idade, a genética ou os antecedentes familiares da doença", sublinha a especialista portuguesa Fátima Cardoso, uma das mais reputadas do país.
"Mas há outros que podemos e devemos combater, como ter um estilo de vida mais saudável", explica a também diretora da Unidade de Mama do Centro Clínico Champalimaud, em Lisboa. Além de (maus) hábitos a mudar, há comportamentos a rever. "Não há limites de idade no que toca a este cancro, apesar de ainda existirem muitas mulheres que acham que são demasiado novas para fazer uma mamografia", sublinha Lindsay Peyton, autora de artigos sobre o tema.
99% dos casos de cancro da mama ocorrem entre o sexo feminino?
Apesar de também atingir homens, embora muitos indivíduos do sexo masculino o desconheçam por falta de informação, as mulheres são as principais vítimas da doença. "Saudáveis, as células dividem-se a um ritmo lento e sabem que têm de desempenhar uma tarefa. Por exemplo, os neurónios, as células do tubo digestivo, do músculo cardíaco, entre tantas outras, sabem qual é a sua missão, é por isso que se chamam células diferenciadas", refere Fátima Cardoso.
"No seu ciclo normal de vida, as células saudáveis nascem, vivem e morrem, mas quando se tornam malignas começam não só a perder capacidade de se diferenciarem como de autocontrolarem a sua proliferação, multiplicando-se de forma exagerada", explica. "Ao focarem toda a sua energia no processo de multiplicação, as células deixam então de desempenhar as suas tarefas específicas, formando um tumor", prossegue ainda a médica oncologista portuguesa.
"E é assim que vão substituindo as células normais, impedindo os tecidos de exercer as suas funções", ilustra Fátima Cardoso. Para esta especialista, "o maior fator de risco desta doença é ser mulher", acrescenta. Uma condição que, por si só, obriga a uma autovigilância atenta e regular, uma lacuna, por descuido, falta de tempo e/ou desinformação, continua a ser muito comum na vida da muitas mulheres, como alteram os especialistas. Veja como fazer o autoexame mamário passo a passo.
Onde acontece o cancro?
O cancro da mama é uma "neoplasia maligna que afeta os tecidos localizados nas mamas", refere Fátima Cardoso. É, por isso, um tumor primitivo. Em 90% dos casos, o processo descontrolado de multiplicação celular que dá origem à doença ocorre nas células que formam a camada que reveste os canais ductais, por onde flui o leite materno. Numa fase inicial, as células malignas "situam-se no interior desses canais onde se multiplicam", sublinha. Nesse caso, falamos de carcinoma in situ.
Esse carcinoma é um pré-cancro, na realidade. "Mas quando ultrapassam as paredes dos ductos e se desenvolvem externamente, estamos perante um cancro invasivo. Nesse caso, o tumor já é maligno", revela a especialista. Ao contrário do que muitos chegaram a acreditar noutras décadas, está longe de ser uma doença que afeta apenas mulheres mais velhas. "Há muita gente, até físicos, que ainda tem essa ideia hoje", sublinha Jennifer Sasaki, oncologista norte-americana.
Por que atinge maioritariamente mulheres?
No nosso país, de acordo com números avançados pela Liga Portuguesa Contra o Cancro, surgem anualmente cerca 6.000 novos casos de cancro da mama. A esmagadora maioria deles regista-se entre o sexo feminino, confirmando a tendência internacional. "A explicação pode estar no facto de as mulheres produzirem maiores quantidades de hormonas que promovem o crescimento celular [estrogénio e progesterona]", refere a American Cancer Society (ACS).
De acordo com esta entidade, uma exposição mais prolongada ao longo da vida a estas hormonas pode explicar por que razão as mulheres que têm menstruações antes dos 12 anos e/ou entram na menopausa mais tarde, depois dos 55 anos, "têm um risco superior ligeiro de ter cancro da mama". Paralelamente, "a mulher", explica Fátima Cardoso, "tem uma glândula mamária muito mais desenvolvida do que o homem e que é sujeita a várias alterações durante a vida".
"Na puberdade, a mama sofre um grande desenvolvimento, ficando num estado que não é completamente diferenciado, o que aumenta o risco", refere ainda a especialista. "A mama só acaba de se formar completamente quando ocorre uma gravidez de termo [até o nascimento do bebé], daí que o facto de não se ter filhos ou de os ter muito tarde sejam fatores de risco desta doença", justifica também a oncologista, médica e investigadora portuguesa, uma das maiores especialistas nacionais.
A influência do estilo de vida é mesmo determinante?
Os números são alarmantes e não é de agora. "Nos países desenvolvidos, uma em cada oito mulheres virá a ter cancro da mama", revela Fátima Cardoso. A ciência ainda não sabe, contudo, "exatamente por que motivo o cancro da mama acontece a umas pessoas e a outras não", refere. "Ter um ou vários fatores de risco [sexo, idade, genética, história familiar e estilo de vida] para o aparecimento de cancro da mama não significa que se venha a ter a doença", alerta.
"Há quem tenha vários fatores de risco e não desenvolva a doença e há quem aparentemente não tenha nenhum fator de risco e a desenvolva. Mas também sabemos que o estilo de vida dos países industrializados conduz ao aumento de doenças malignas. Não podemos apontar o dedo a um só fator isolado, mas, em conjunto, por serem agressões contínuas ao nosso organismo, eles criam terreno propício para que as células se tornem malignas", explica Fátima Cardoso.
Nos últimos anos, têm havido avanços nas terapêuticas, mas a tão aguardada cura tarda em chegar. "A ciência ainda não encontrou uma forma de prevenção primária que nos salvaguarde da doença, mas podemos e devemos atuar em relação a alguns fatores de risco associados ao estilo de vida, assim como integrar o autoexame da mama na nossa rotina", defende ainda a especialista. Saiba também quais são os principais testes e indicadores do cancro da mama.
(Maus) hábitos e comportamentos a rever urgentemente
Para que o seu estilo de vida não seja um fator potenciador de cancro de mama, estas são algumas das estratégias que deve adotar de imediato:
- Controle o peso
Doses elevadas e exposição prolongada à hormona estrogénio aumentam o risco de cancro da mama. "Numa mulher obesa os níveis de estrogénio circulante são mais elevados do que os de uma mulher magra", explica Fátima Cardoso. Quanto mais gordura existir, mais estrogénio será produzido.
Na menopausa, altura em que os ovários deixam de produzir estrogénio, a maior parte desta hormona tem origem nos tecidos adiposos. Segundo um estudo desenvolvido pela American Society of Clinical Oncology (ASCO), a obesidade está, ainda, relacionada com piores resultados de tratamento do cancro, incluindo maior taxa de recidiva (o facto de voltar a acontecer) e de mortalidade.
- Reduza o consumo de álcool
"Existem estudos que confirmam uma associação entre o consumo de álcool e o aumento do risco de se desenvolver cancro da mama. E quanto maior o consumo, maior o risco", revela a especialista. Segundo a American Cancer Society, mulheres que ingerem uma bebida alcoólica por dia têm um ligeiro aumento do risco de desencadear a doença quando comparadas com outras que não o consomem. Entre as que bebem duas a três bebidas alcoólicas por dia, o risco aumenta 1,5 vezes em comparação com quem não bebe.
- Faça exercício
Dados da American Cancer Society revelam que praticar marcha rápida durante uma hora e meia a duas horas e meia por semana reduz o risco de cancro da mama em 18 por cento. Segundo a mesma fonte, caminhar 10 horas semanalmente, cerca de uma hora e meia por dia) diminui ainda mais esse risco.
Um estudo francês realizado pelo Institut Gustave Rousse concluiu que a atividade física regular reduz a probabilidade de se desenvolver cancro da mama na pós-menopausa, mas esse escudo deixa de funcionar se as mulheres pararem de se exercitar. Os investigadores realçaram, ainda, o facto de não ser necessário uma atividade física muito frequente ou vigorosa; uma caminhada diária de 30 minutos já traz benefícios.
- Durma mais
À noite... durma! "Estudos recentes sugerem que as mulheres que fazem turnos noturnos podem ter um risco mais elevado de desenvolver cancro da mama", revela a American Cancer Society. Segundo este organismo, trata-se de uma descoberta recente que implicará mais investigação, mas uma das hipóteses é que este ritmo de vida possa provocar alterações na produção da hormona melatonina, essencial no mecanismo do sono, que é afetada pela exposição do organismo à luz.
- Deixe de fumar
O tabaco é nocivo. "Estudos têm verificado uma relação entre o tabagismo elevado e o aumento do risco de cancro da mama. Alguns constataram que o risco é mais elevado em certos grupos, como mulheres que começaram a fumar antes de ter o primeiro filho", refere a American Cancer Society. Ainda assim, as conclusões são consideradas sugestivas mas insuficientes para estabelecer uma relação causa/efeito.
Num estudo internacional realizado em roedores, verificou-se que, quer o fumo inalado diretamente, quer o inalado de forma passiva, continham substâncias químicas que, em altas concentrações, causavam cancro da mama. Os mesmos químicos encontrados no fumo do tabaco foram detetados nos tecidos mamários e no leite materno dos ratos.
Mas as certezas em relação ao tabaco existem sobretudo em relação a mulheres já vítimas da doença. "Estudos interessantes demonstraram que, após o diagnóstico de cancro da mama, as mulheres que fumam têm mais recidivas. E, quando deixam de o fazer, o risco diminui", adianta Fátima Cardoso.
- Amamente
Pensa-se que, por reduzir o número de ciclos menstruais e, por esta via, a exposição do organismo ao estrogénio, contribui para a redução do risco de cancro da mama, embora o impacto não seja elevado e aconteça, sobretudo, se a mulher amamentar durante um ano e meio a dois anos, refere a American Cancer Society.
- Coma a pensar no coração
Há estudos que indicam que o cancro da mama é menos comum nos países onde a dieta é parca em gordura polinsaturada e saturada, mas outras investigações não encontraram essa relação. Segundo a ACS, serão necessárias mais investigações para "compreender o efeito do consumo dos tipos de gordura no risco de cancro da mama". Certo é que, avança esse organismo, "as calorias contam e a gordura é a maior fonte de calorias".
"Na globalidade, uma dieta demasiado rica em gordura está associada a um maior desenvolvimento de células malignas, sobretudo do cancro colorretal", explica Fátima Cardoso, que recomenda às suas pacientes que façam "uma alimentação saudável para o coração porque estarão também a diminuir o risco de cancro".
Na prática, isto significa o consumo equilibrado de gordura vegetal saudável, como o azeite, peixes ricos em ómega-3 e/ou frutos secos, dar primazia às carnes brancas, ao peixe, aos vegetais, aos cereais integrais e à fruta. Reduzir o sal, o número de alimentos fumados, as carnes vermelhas e a gordura de origem animal são outras das estratégias alimentares a adotar.
Texto: Catarina Caldeira Baguinho e Nazaré Tocha com Fátima Cardoso (oncologista, médica e diretora da Unidade de Mama do Centro Clínico Champalimaud em Lisboa)
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