Os miomas intrauterinos são tumores benignos ou malignos?
Benignos. Os tumores malignos do útero que se desenvolvem na camada muscular da parede uterina (conhecida como miométrio) não se desenvolvem de miomas. Os miomas são tumores benignos do miométrio e não estão relacionados com os tumores malignos do miométrio (também conhecidos como leiomiossarcomas). Os tumores malignos do útero são malignos à partida. O que acontece é que é impossível ou muito difícil distinguir por radiologia (RM ou TAC ou ecografia) os miomas dos tumores malignos. Desta forma, na maioria dos casos só se descobre que o tumor era maligno depois da cirurgia ou quando o tumor cresce muito rápido em pouco tempo. À partida, todos os tumores do miométrio são assumidos como benignos, ou seja, são miomas. Isto porque os miomas são muito frequentes (até 80% da população feminina) enquanto que os tumores malignos do miométrio são extremamente raros - menos de duas mulheres por cada 100.000 (0.002%). Ou seja, não tem lógica alterar o plano de tratamento de uma mulher com um tumor do útero (miométrio) que é praticamente sempre benigno - mioma - só porque pode ter uma probabilidade de ser maligno de 0.002%. Por outras palavras, todos os tumores do miométrio são miomas até prova em contrário.
Porque se formam os miomas?
Os miomas são tumores benignos que se desenvolvem na parede muscular do útero (miométrio). São tumores benignos que se desenvolvem desde o início da idade fértil após a primeira menstruação e que terminam com a menopausa. Isto porque são tumores que estão dependentes do estímulo hormonal da progesterona e estrogéneos para se desenvolverem e crescerem. Os principais fatores de risco para o desenvolvimento de miomas são a idade e a raça. São muito raros na adolescência, passando a ser cada vez mais frequentes até a mulher alcançar a menopausa. Ou seja, uma mulher entre os 40 e 50 anos tem uma probabilidade de vir a ser diagnosticada com miomas muito superior a uma mulher entre os 20 e 30 anos de idade. Frequentemente tratamos doentes entre os 30 anos e os 50 anos de idade. As mulheres de etnia negra têm 2 a 3 vezes mais probabilidade de vir a desenvolver miomas e de terem mais queixas do que as mulheres de etnia branca. As mulheres que tenham estado grávidas têm menor probabilidade de desenvolver miomas, uma vez que a gravidez tem sido associada a uma redução nas dimensões dos miomas. Dieta rica em carnes vermelhas, ingestão de álcool, dieta pobre em legumes e deficiência de Vitamina D tem sido associada ao desenvolvimento de miomas. Dieta com ingestão de 4 ou mais porções de laticínios diariamente está associada a uma menor probabilidade de vir a ter miomas. Os miomas sintomáticos (com queixas) ocorrem em aproximadamente 25%-50% das mulheres em idade fértil.
Em que consiste a embolização?
A embolização uterina para tratar os miomas foi iniciada em Paris, em 1995, por um grupo multidisciplinar de radiologistas de intervenção e ginecologistas que tinham experiência em embolização uterina para controlar a hemorragia após o parto. Experimentaram utilizar a mesma técnica para tratar eletivamente mulheres com miomas, com muitas queixas de hemorragia uterina. Em 1999 começamos a implementar esta técnica em Portugal, onde fomos pioneiros. Somos o grupo a nível nacional com maior experiência em embolização uterina e temos das maiores casuístas publicadas a demonstrar a segurança e eficácia da embolização uterina para os miomas e das potencialidades em engravidar após este tratamento numa escala mundial. Trata-se de um tratamento não invasivo, guiado por imagem, realizado por radiologistas de intervenção. É realizado sob anestesia local, sem necessidade de bisturi, nem de incisão cirúrgica na pele. Apenas é introduzido um pequeno tubo de plástico (catéter) numa artéria da virilha ou punho que guiamos por imagem até ao útero. No útero realizamos a embolização, ou seja, a obstrução das artérias que nutrem os miomas. Trata-se de um tratamento muito simples e seguro, feito sem dor, em 30-60 minutos. As doentes entram de manhã e têm alta ao fim do dia, podendo retomar toda a vida normal e voltar ao trabalho após 3 a 5 dias.
Porque é melhor do que outros tratamentos?
Trata-se de uma alternativa à cirurgia muito útil pois as mulheres têm menos dores e a recuperação é muito mais rápida. O risco de complicações graves é inferior e a taxa de sucesso no tratamento das queixas é superior a 90%, próximo do da cirurgia. Além disso, não são realizadas incisões ou cortes na pele, não é necessário o bisturi e não temos de "abrir" a barriga para remover o útero ou os miomas. Não é preciso anestesia geral e não há perdas de sangue com o tratamento. Acima de tudo, com a embolização, a mulher pode preservar o útero, sendo poupada a tratamentos mais invasivos com potencial para mais complicações e mais graves. Desta forma, mulheres que queiram preservar o útero ou mulheres que queiram engravidar e que a cirurgia possível seja apenas a remoção de todo o útero (histerectomia), a embolização deverá ser fortemente considerada. Apesar de todas estas vantagens da embolização uterina relativamente à cirurgia, menos de 7% das mulheres com miomas têm acesso à embolização uterina. Isto deve-se ao facto de haver pouca informação e divulgação desta técnica em geral e porque, mesmo dentro da comunidade médica, muitas mulheres não têm acesso a uma consulta de radiologia de intervenção para avaliarem as hipóteses de poderem ser embolizadas em vez de serem operadas.
Os miomas, quando não tratados, desaparecem por si próprios na menopausa?
Sim, após a menopausa os miomas diminuem de tamanho e deixam de dar sintomas ou queixas. Contudo, frequentemente dão queixas muito severas como hemorragia uterina intensa, dores pélvicas, aumento do tamanho da barriga ou compressão da bexiga e reto. Estas queixas podem ser tão graves que levem a mulher a procurar assistência médica urgentemente, pois chegam a ter anemia (redução dos valores de hemoglobina no sangue) por perderem muito sangue durante a menstruação. Infelizmente, muitas vezes as queixas são tão severas que a mulher nos seus 30 ou 40 anos não pode esperar 5 a 10 anos pela menopausa. Claro está que, se os miomas não derem queixas ou sintomas, não têm indicação para ser tratados. Apenas tratamos miomas sintomáticos, ou seja, que deem queixas às doentes. Os restantes podem ser vigiados até à menopausa pois não vão degenerar em malignos nem afetar a qualidade de vida das doentes.
O pior que pode acontecer é a infertilidade?
O pior é mesmo a hemorragia uterina que tem um enorme impacto negativo imediato. Ou seja, uma mulher que perca enormes quantidades de sangue durante 5 dias da menstruação, a precisar de vários pensos por dia, por vezes mesmo de toalhas na cama e que esteja sempre preocupada em poder sujar a roupa com sangue não tem condições para levar uma vida normal. A qualidade de vida fica fortemente prejudicada. Além disso pode levar a anemia que se manifesta por falta de forças e um cansaço geral que impede que a mulher tenha uma atividade diária dentro do deu normal. A infertilidade também é uma forma de manifestação dos miomas bastante angustiante. Não urgente, uma vez que nestas situações a mulher pode até nem ter outras queixas, mas complexa na sua abordagem. Nós temos das experiências mais vastas em gravidez após embolização uterina mesmo a nível mundial, mostrando que é possível engravidar após o tratamento dos miomas com a embolização uterina.
Um artigo do médico Tiago Bilhim, radiologista de intervenção no Hospital St. Louis.
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