Enquanto cirurgião de coluna, as notícias sobre as lesões desta natureza são, sem dúvida, as mais devastadoras que tenho de transmitir sempre que trato de um doente. Para evitar isto, torna-se importante informar, esclarecer e ajudar na prevenção.

Nos Estados Unidos da América e, de uma forma similar, na sociedade ocidental, a incidência de novas lesões vertebro medulares é de aproximadamente 40 a 80 casos por milhão de habitantes. Aproximadamente 80% destes casos surgem em homens com uma idade média de 40 anos à data do acidente. As causas mais frequentes destas lesões são geralmente acidentes de viação, correspondendo a cerca de 45% dos casos, quedas em altura (30%-35%) e desporto recreativo/atividades radicais de lazer relacionadas, com aproximadamente 8-10% dos casos.

Tendo em conta a percentagem de lesões devido a acidentes de viação, torna-se muito importante sensibilizar para a importância de ter alguns cuidados de prevenção: realizar pausas em viagens mais longas e não utilizar o telemóvel enquanto conduzimos.

A utilização do telemóvel durante a condução tem-se constituído como um dos principais riscos de acidente durante a última década. Dados da organização mundial de saúde (OMS) mostram que condutores que utilizem o telemóvel durante a condução apresentam um risco 4x superior de se envolverem num acidente de viação. Os dados não parecem distinguir diferenças entre utilizar o telemóvel de forma manual ou em sistemas de alta voz, uma vez que a distração cognitiva parece ser semelhante.

Por outro lado, a utilização cada vez mais frequente de novas formas de locomoção nas cidades, como trotinetes e bicicletas, muitas vezes sem o devido treino e equipamentos de proteção, está associada a um aumento de risco de lesões potencialmente graves da coluna vertebral. Devemos, enquanto sociedade, reforçar a importância da utilização de capacete, moderar a velocidade e reconhecer o risco.

As quedas em altura surgem muitas vezes em atividades fora do contexto laboral estruturado e vigiado, nos quais os princípios de segurança são, por vezes, ultrapassados. A subida a árvores ou telhados para pequenos trabalhos devem também merecer uma atenção redobrada e primar pela utilização de métodos de retenção de forma a evitar consequências graves.

Temos também assistido, nos últimos anos, a um aumento das atividades recreativas radicais outdoor e, com este fenómeno, a um aumento de lesões traumáticas. Apesar de a maioria destas lesões incidir sobre os membros, o número crescente de lesões na coluna que chegam às salas de emergência merecem atenção e justificam um alerta. O mergulho é um dos exemplos, sendo a quarta causa mais comum de lesões da espinal medula, ocorrendo maioritariamente na população jovem e durante os meses de verão.

Segundo um estudo português de 2012 sobre este tipo de acidentes, 87% dos acidentes de mergulho acontecem em jovens do sexo masculino e mais de metade destes com uma idade inferior a 29 anos. Um especto curioso deste estudo é o facto de todos estes acidentes acontecerem em períodos de lazer e não em práticas desportivas estruturadas.

Além disto, alguns estudos internacionais referem que algumas atividades que se têm tornado muito populares, como o BTT e o Down-hill, têm um risco de incidência de lesão da espinal medula muito semelhante ao do mergulho. Estes tipos de desportos envolvem grandes velocidades em áreas de declive muito acentuado, sendo que a maioria dos acidentes surgem após a projeção sobre o guiador ou em queda de altitudes mais elevadas. Em ambos os casos, resultam de um impacto severo sobre a cabeça, coluna cervical e dorsal. Nestes casos, os capacetes são excelentes para prevenir a lesão craniana, mas infelizmente não são suficientes para prevenir as lesões da coluna.

O tratamento inicial de uma lesão vertebro-medular é uma corrida contra o tempo e o reconhecimento de uma potencial lesão pode ser fundamental no prognóstico. Num contexto de acidente com trauma da coluna vertebral, devemos inquirir a vítima sobre sintomas do foro neurológico, como fraqueza ou incapacidade de mover os braços ou as pernas, e alterações da sensibilidade, como formigueiros ou dormência nos membros. Em caso de suspeita, é sempre melhor agir com excesso de zelo e ativar com celeridade os meios de socorro.

A pensar nisto, a campanha “Olhe pelas suas costas” (olhepelassuascostas.pt), foi lançada em 2009 com o objetivo de sensibilizar a população para a problemática das dores nas costas, alertando para as suas consequências na vida pessoal e profissional dos portugueses. A iniciativa, que pretende ainda educar a população sobre as formas de prevenção e tratamento existentes, tem a chancela da Sociedade Portuguesa de Patologia da Coluna Vertebral, da Associação Para o Estudo da Dor, da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, da Sociedade Portuguesa de Neurocirurgia, da Sociedade Portuguesa de Medicina Física e de Reabilitação e da Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia e conta com o apoio da Medtronic.

Um artigo do médico Rui Duarte, especialista em Ortopedia e Diretor de Serviço de Ortopedia no Centro Hospitalar do Médio Ave.