O que se passa nos mercados energéticos?
Os preços dos combustíveis têm subido. Por exemplo, o mercado Brent para o barril de petróleo, em relação ao início do ano passado, passou de menos de 60 dólares americanos para passar a rondar os 90. O preço do gás, no índice dos Países Baixos, referência para a Europa, passou de menos de 20 euros no ano passado para acima dos 90 atualmente, tendo ultrapassado os 130 em dezembro. Por arrasto, os preços da eletricidade – muita dela produzida através de combustíveis fósseis – têm acompanhado a tendência. O mercado ibérico MIBEL, referência para a eletricidade em Portugal, disparou de menos de 50 euros por MWh em janeiro passado para cerca de 230 atualmente.
Porque sobem os preços?
Em primeiro lugar, com o recuo das restrições derivadas da COVID-19, as economias têm recuperado os níveis de atividade, e em várias partes do mundo, a produção já está acima de níveis pré-pandemia. Além disso, um conjunto de fatores conjunturais está a impactar os mercados. Um inverno frio em certos lugares, problemas de manutenção em algumas infraestruturas, tensões políticas entre o ocidente e a Rússia (fornecedora de cerca de 40% do gás para a Europa), secas e ondas de calor, dificuldades de países produtores em aumentar a oferta, a desvalorização do euro face ao dólar (que afeta a zona-euro), entre outros. Apesar de aumentos acontecerem em mercados distintos, dado os combústiveis funcionarem como substitutos, o aumento de um dos preços afeta o resto do mercado. Por exemplo, um aumento do preço do petróleo pode tornar a electricidade de um carro elétrico mais cara, mesmo que a sua origem seja 100% renovável. Em suma, o aumento da procura por energia não está a ser compensado pela oferta. Mas apesar do papel da falta de oferta de combustíveis, o papel dos mercados financeiros não pode ser ignorado.
Os preços sobem só devido à falta de oferta?
Em parte, a subida dos preços deve-se à especulação financeira, escreve a Bloomberg. Produtos financeiros (não muito diferentes daqueles que causaram a crise do subprime na primeira década deste século) são utilizados tendo como ativos subjacentes os preços de combustíveis fósseis. Por especulação ou por motivos mais legítimos – como proteger um negócio de preços elevados – têm-se vindo a acumular vários ativos financeiros que apostam numa alta de preços. Uma aposta não é feita só por um agente, estes contratos necessitam de ter uma contraparte – geralmente um banco. Para a contra-parte, para evitar perder com a aposta, a solução é encomendar o ativo subjacente através de contratos no mercado de futuros – compras antecipadas a 3, 6, 12, etc meses. Com as novas compras, a procura sobe e o mercado ganha vida própria – aspetos da econima real deixam passam para segundo plano, o casino do mercado guia os preços. As novas compras aumentam a pressão sobre outras contrapartes perdedoras no negócio dos ativos financeiros, que por sua vez as pressiona a comprar. À medida que isto é percebido pelo resto do mercado, este antecipa altos preços e estes tornam-se uma realidade. Pode-se então, ter o inverso da situação de abril de 2020, em que os preços do barril de petróleo chegaram a valores negativos, como relata a BBC.
Quais as consequências da subida de preços da energia?
O aumento dos preços da energia podem levar a uma subida geral dos preços – inflação. A energia tem vários fins produtivos, como os fertilizantes para a agricultura, as rações para a criação de animais, o aço que é utilizado em diversos instrumentos, fazer mover os transportes, etc. Assim, na persistência de altos preços da energia, é de esperar que o aumento se difunda por todos os mercados. Apesar de não ser a única causa da subida dos preços, isto tem-se refletido no regresso de altas taxas de inflação. Por exemplo, nos Estados Unidos da América, a inflação está em máximos de 40 anos e chegou a 7%, segundo a BBC. Em Portugal, para já, máximos de 10 anos estão a ser atingidos, com a inflação a chegar perto dos 3%.
Os novos preços da energia vieram para ficar?
Os preços no futuro são impossíveis de adivinhar, mas, mesmo que desçam dos enormes valores atuais, não se prevê um retorno aos preços de pre-COVID. A Bloomberg diz que os contratos futuros, que não são os preços que se vão realizar no futuro, mas que podem ser vistos como uma estimativa, prevêem um novo paradigma de preços mais altos.
A transição energética está a causar os altos preços da energia?
Não. Numa análise feita no Reino Unido, o preço do gás é apontado como culpado de 85% da causa do aumento do preço da energia, mesmo quando considerada a taxação de carbono. Por outro lado, o preço da eletricidade gerada através de fontes renováveis tem vindo a registar quedas sucessivas, ficando já abaixo do dos combustíveis fósseis. Apostar em combustíveis fósseis – quer investindo em novas infraestruturas ou recuando no encerramento das antigas – como solução para a subida dos preços da energia seria contraprodutivo; o equivalente a curar uma bebedeira ingerindo absinto.
Qual o caminho a seguir?
Investir em energias renováveis livres de emissões de gases com efeito de estufa. Os apelos para conduzir uma transição energética têm sido feitos pelo movimento pela justiça climática desde há décadas. Agora, além dos benefícios óbvios de evitar alterações climáticas irreversíveis que colocam em causa a própria sobrevivência da espécie humana, existem benefícios económicos imediatos de planos massivos de investimento em energias como a solar e a eólica.
Basta investir em energias renováveis?
Não. Esta transição energética não pode persistir com as dinâmicas atuais. É necessário que:
1. O investimento em energias renováveis assegure uma transição energética – que reduza drasticamente as emissões de gases com efeitos de estufa – e não uma expansão energética – em que as renováveis façam parte de uma nova combinação de fatores energéticos, dentro da qual os combustíveis fósseis continuam a ter espaço para continuar a degradar a atmosfera;
2. O empregos e direitos dos trabalhadores das infraestruturas fósseis a serem encerradas são privilegiados;
3. A produção energética ponha em primeiro lugar as necessidades essenciais, como os serviços públicos;
4. Os mercados de energia não podem ser deixados à mercê da selvajaria dos mercados, e assim sujeitos a flutuações de preços derivadas da especulação.
E para garantir estas condições, a produção e a infraestrutura energética têm que estar sob controle público.
As explicações são do Climáximo, um coletivo anti-capitalista que faz parte do movimento internacional pela justiça climática.
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