“Não estou ainda muito otimista, mas não quer dizer que as coisas não venham a correr melhor até lá”, afirmou João Pedro Matos Fernandes em entrevista à agência Lusa a propósito da 26.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP26), que vai decorrer entre 31 de outubro e 12 de novembro na cidade escocesa de Glasgow.

Esta é “uma COP mais importante que todas as outras”, desde que quase 200 países assinaram o Acordo de Paris, alcançado em 2015, para limitar o aquecimento global até ao fim do século, uma vez que se espera que os países apresentem compromissos mais ambiciosos de redução de emissões de gases com efeito de estufa e abandono da produção de energia a partir de combustíveis fósseis.

“Há dias atrás, ainda faltavam entregar 75 novas declarações de compromisso”, três das quais de países responsáveis por uma grande quantidade de emissões carbónicas: Índia, China e África do Sul, disse o ministro.

Matos Fernandes reconheceu “não ter resposta” para a meta efetiva de aumento da temperatura global até 2100 que sairá de Glasgow: “2,5 graus até ao final do século XXI, com estes novos compromissos, era de facto um grande salto em frente. Seremos capazes desse número? Não tenho a certeza”.

“Se não conseguirmos [as contribuições nacionais mais ambiciosas], a COP, por muito que venhamos a dizer que correu bem, não vai correr tão bem como isso”, advertiu.

Portugal apresenta-se em Glasgow como “o país que foi o primeiro no mundo que disse que ia ser neutro em carbono [em 2050] e o país que presidia à União Europeia quando se comprometeu com ser o primeiro continente neutro em carbono em 2050 e, depois disso, ter emissões negativas”, argumentou Matos Fernandes.

Em 2015, no âmbito do acordo de Paris sobre redução de emissões de gases com efeito de estufa, o compromisso português era reduzir as emissões carbónicas em 40 por cento até 2030. Agora, esse compromisso é uma redução de 55%.

Portugal vai ainda à COP26 com o compromisso de “em dez anos contribuir com 35 milhões de euros para o financiamento aos países em vias de desenvolvimento que têm também que fazer um trajeto para apostar nas energias limpas”.

“Muitos destes países, mormente os que em África falam português, têm já problemas graves de adaptação e sabem bem já hoje quais são as consequências da mudança do clima”, salientou o ministro.

O financiamento climático, destinado a criar condições para a transição energética para fontes renováveis será sempre “o dossiê mais quente” em Glasgow, tal como aconteceu nas anteriores cimeiras do clima, considerou Matos Fernandes, que apontou outro tópico que “tem que arrefecer”: a transparência.

“De uma vez por todas, temos que ter regras que sejam as mesmas para Portugal, para os Estados Unidos da América ou para a República Centro-Africana de como é que se contabilizam as emissões”, advogou.

Portugal defende que os créditos de emissões poluentes gerados desde o Protocolo de Quioto de 1997, “devem ser todos deitados ao lixo porque os valores que têm são muito discutíveis, com métricas muito estranhas, pouco transparentes e difíceis de comparar agora”.

“Temos sempre uma posição de negociação, mas a nossa posição de entrada é que esses créditos não fazem qualquer sentido”, reforçou o ministro do Ambiente.

Matos Fernandes considerou que “é inevitável que seja ainda mais desafiante uma COP em tempos de crise energética, porque essa crise não tem rigorosamente nada a ver com sustentabilidade”.

“A eletricidade encareceu porque o gás natural, que é o combustível fóssil, encareceu. Os combustíveis estão mais caros porque o bem original — petróleo — está mais caro”, disse.

“É essencial que todos se comprometam, também por razões de preço mais baixo e por razões de estabilidade no preço, a avançar muito depressa para um mundo neutro em carbono. Para o ter, temos mesmo que chegar a 2050 com um mundo mais eletrificado e com 100% da eletricidade gerada a partir de fontes limpas”, defendeu.

Apesar de considerar que “o discurso apocalíptico não acrescenta nada” ao esforço por um ambiente melhor, Matos Fernandes reconheceu que “uma posição mais alarmista tem sido determinante na consciencialização do cidadão comum”.

“Nunca podemos é criar um discurso de ‘já não vale a pena’, esse temos que retirar de cima da mesa e, às vezes, o alarme pode fazer com que alguns encontrem esse álibi. Nenhum [país] se deve desculpar com os outros não fazerem”, concluiu.