Na base da maioria das dietas e dos regimes de perda de peso hipocalóricos, existe uma restrição. Algumas limitam o consumo de hidratos de carbono (pão, bolachas, arroz e massas), outras reduzem a ingestão de alimentos gordos (manteiga, fritos, molhos, queijos e carnes vermelhas). Uma equipa liderada pelo norte-americano Kevin Hall do National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases, do National Institutes of Health, nos Estados Unidos da América, tentou perceber afinal qual a melhor estratégia.

Após a observação de 19 adultos obesos submetidos a cada um dos regimes durante duas semanas, os investigadores verificaram que uma dieta pobre em gordura permitiu perder mais massa gorda do que uma dieta de restrição de hidratos de carbono, contrariando pesquisas anteriores que sugerem ser mais vantajoso, no que toca à perda de massa gorda, restringir os hidratos de carbono.

Apesar dos resultados observados a curto prazo, quando os investigadores usaram um modelo matemático para extrapolar os efeitos das duas dietas no tempo, não houve grande diferença nos resultados. "Tudo indica que, a longo prazo, o organismo age de forma a reduzir as diferenças de gordura corporal entre dietas que tenham o mesmo número de calorias, mas teores de hidratos de carbono e de gordura bem diferentes", lê-se nas conclusões do estudo, publicado na revista Cell Metabolism.

Está longe de existir um consenso científico sobre a forma mais eficaz de combater a obesidade. Como lembra o autor do livro "O dilema do omnívoro", Michael Pollan, "nunca como hoje estivemos tão inseguros no que toca a escolher o jantar". Para Teresa Branco, fisiologista na gestão do peso, existem estratégias que funcionam com umas pessoas, mas não com outras. Em entrevista à Prevenir, a especialista dá pistas sobre como escolher o melhor plano para si.

O que traz de novo este estudo ao conhecimento científico já existente sobre a perda de peso?

O grande valor do estudo é ter sido controlado, uma vez que a maior parte das pessoas não diz a verdade em relação ao que come, mas serão precisas mais pesquisas para tirar conclusões. Uma das reticências que coloco é o facto de não ter sido feita uma real restrição de hidratos, o que só acontece a partir dos 50 gramas [eles consumiram 140 gramas].

Os investigadores também não levaram em conta os fatores do metabolismo individual. Sabemos hoje que cada pessoa metaboliza os alimentos de forma única. Perante a mesma ingestão de hidratos de carbono, duas pessoas podem produzir quantidades de insulina bem diferentes, falta perceber porque é que a metabolização dos macronutrientes é tão específica.

São muitos os fatores envolvidos, como a fase da vida, o nível de atividade física, o facto de ser mais gorda ou mais magra... Por isso, defendo que qualquer dieta tem de ser prescrita individualmente após uma avaliação do metabolismo.

Que certezas tem hoje a ciência sobre a metabolização das gorduras e dos hidratos no que toca à perda peso?

Sabemos que, à partida, se tiver açúcar disponível, o organismo utiliza prioritariamente a energia proveniente dessa fonte. O organismo está mais apto a queimar um grama de açúcar do que de gordura. Só na ausência de açúcar na alimentação é que o corpo começa a ter necessidade de queimar as reservas de gordura.

O problema é que somos mais eficazes a gastar o açúcar mas também somos mais eficazes a armazená-lo porque a produção de insulina promove o seu armazenamento e conversão em gordura. Além disso, as pessoas, quer a gastar quer a armazenar são diferentes entre elas. Há muitas variáveis a influenciar o mecanismo que leva o organismo a entrar num processo de queima exclusiva de ácidos gordos, a que se dá o nome de cetose e que é o que nos permite perder peso.

Há pessoas que entram mais rapidamente em cetose do que outras e não sabemos o que determina essa diferença. Também aqui são muitos os fatores envolvidos. Por exemplo, se tiver um défice de vitaminas e minerais, de vitaminas D e C ou do complexo B, isso pode comprometer o processo de metabolização da gordura.

Que outros fatores são consensuais no que toca a ganhar ou a perder peso?

Sabemos que ingerir uma grande quantidade de gordura, sobretudo de menor qualidade, contribui para a obesidade. E de açúcar também, uma vez que o seu consumo estimula a produção de insulina e esta promove a conversão do açúcar em gordura e o seu armazenamento. Mas toda a gente converte da mesma maneira? Não. E à mesma velocidade? Não. E a mesma pessoa converte da mesma maneira em diferentes fases da vida? Não...

Que perigos há em fazer uma dieta sem levar em conta o metabolismo individual?

O principal perigo é não conseguir manter a perda de peso a longo prazo e engordar ainda mais. Uma pessoa até pode fazer uma dieta destas que estão na moda com redução de hidratos e muita proteína e emagrecer uma dezena de quilos rapidamente sem consultar ninguém, mas há consequências.

A tiróide, glândula que ajuda no controlo do nosso metabolismo, adapta-se negativamente a uma dieta proteica com perda de peso agressiva e isso faz com que se volte a engordar novamente. A prova está que 95 por cento das pessoas que perde peso rapidamente volta a ganhá-lo.

Há diferenças no metabolismo das gorduras e dos hidratos de carbono entre homens e mulheres?

Podemos dizer que, à partida, o homem, por ter um metabolismo mais acelerado, pesar mais, ter mais percentagem de massa muscular, metaboliza melhor os nutrientes. Mas, depois, entram em jogo os outros fatores, como características individuais do metabolismo, o perfil da tiroide, deficiências vitamínicas e ter ou não fígado gordo. Se tiver gordura acumulada no fígado este fica resistente à insulina, sendo que podemos ter o fígado gordo numa fase da vida e noutra não.

Em termos psicológicos, o que é mais fácil de reduzir na dieta? Os hidratos de carbono ou as gorduras?

De forma geral, no princípio, cortar nos hidratos custa mais. Precisamente porque estes estão disponíveis, o primeiro impacto em termos fisiológicos é grande. Sente-se um cansaço imediato, porque o corpo tem de começar a usar as gorduras e estas não são uma reserva energética eficaz. Até entrar em cetose e queimar as gorduras, as pessoas sentem cansaço. Depois, há o fator psicológico.

As pessoas são viciadas em hidratos de carbono pelo fator de recompensa que estes proporcionam, pois ativam zonas do cérebro associadas ao bem-estar. O mecanismo cerebral de recompensa é semelhante em homens e mulheres, mas é mais frequente as mulheres comerem emocionalmente, ou seja, comer sem fome.

Se concluirmos que, pelo nosso perfil, é melhor optar por uma dieta de redução de lípidos que gorduras deveremos cortar e quais devemos sempre manter, mesmo fazendo uma dieta?

Devemos sempre manter as gorduras insaturadas, os ómega-3 [presentes nos peixes gordos e nos frutos secos] porque têm beneficios para a saúde, ajudam o metabolismo a funcionar melhor e parece contribuir de forma indireta para uma perda de peso já que os processos metabólicos se fazem de forma mais saudável.

A quantidade a ingerir vai variar de pessoa para pessoa, dependendo do peso, altura e até do perfil sanguíneo. No que toca às gorduras a cortar, sabe-se que as saturadas [presentes na carne bovina e nos fritos, por exemplo] devem ser ingeridas de forma mais controlada em todas as pessoas.

Que hidratos de carbono devemos eliminar e quais devemos manter, mesmo que estejamos a seguir um plano de emagrecimento focado na redução deste macronutriente?

Devemos cortar em todas as formas processadas de açúcar, nos bolos e no pão branco, porque não são bons para a saúde. Quanto aos hidratos de carbono a manter, diria os chamados hidratos lentos, como o arroz intergral, o pão de centeio e os vegetais. A quantidade que cada um tolera é difícil de determinar porque varia. Há pessoas que conseguem perder peso ingerindo um pão de centeio de manhã e outro ao lanche, mas outras não.

Porque mesmo sendo o centeio, o cereal que mais recomendamos. Ainda assim, o aporte em termos de hidratos de carbono pode ser suficiente para não conseguir começar a queimar gordura corporal. Dou outro exemplo. Algumas pessoas conseguem perder peso comendo uma peça de fruta e duas bolachas Maria a meio da tarde. Outras não, porque esta refeição, embora pouco calórica, é maioritariamente rica em açúcar, o que pode elevar à produção de insulina e impedir a queima de gordura.

A altura do dia em que se consomem hidratos de carbono ou gordura influencia a sua metabolização?

Teoricamente, a ingerirmos hidratos de carbono, devemos fazê-lo na primeira metade do dia, quando o metabolismo está mais acelerado. Mas isto não serve para toda a gente. Se uma pessoa sofrer de fome emocional e cortar radicalmente os hidratos de carbono, ela vai ter uma compulsão alimentar às dez da noite.

Outras, se lhes der um bocadinho de açúcar, não conseguem ficar por aí e comem mais. Depende da fisologia cerebral e comportamento de cada um. Quanto às gorduras, não existe nenhuma referência relativamente à hora. Sabe-se que uma alimentação rica em gordura e proteína estimula as hormonas associadas à saciedade, seja de manhã ou à noite.

No final do estudo, Kevin Hall concluiu que enquanto não houver outras certezas da ciência, a melhor dieta é aquela que uma pessoa conseguir manter. Concorda?

Concordo. Porque de outra forma, nunca haverá uma perda de peso a longo prazo.