
“Bem-vindos ao Walden 7, provavelmente um dos projetos habitacionais mais utópicos e ambiciosos que já foram desenhados.” É assim que Rafael Gómez-Moriana, professor universitário e guia responsável pela visita, descreve aquele que é um dos marcos da arquitetura de Barcelona localizado em Sant Just Desvern, a cerca de 40 minutos do centro da cidade.
Fascinado pelas pequenas aldeias de terracota que existem em Marrocos, o arquiteto Ricardo Bofill teve a ideia de construir a City in Space: um projeto que consistia em agregar pequenas aldeias numa única estrutura. Apesar de nunca ter saído do papel, a City In Space acabou por ser adaptada para o complexo residencial que conhecemos atualmente como Walden 7. “É preciso compreender que, nos anos 1960, havia aqui uma ditadura. Uma das ideias do Walden 7 era também viver um pouco mais livremente, um pouco fora da cidade”, explica.
A construção desta estrutura de estilo pós-modernista, cujas obras arrancaram em 1970, foi levada a cabo pelo Taller de Arquitectura, um atelier composto por uma equipa multidisciplinar de arquitetos, sociólogos, engenheiros, urbanistas e filósofos, encabeçado por Ricardo Bofill, famoso pelos seus projetos de habitação, e pela sua irmã, Ana Bofill.

“Este edifício baseia-se num sistema que consiste na repetição de módulos básicos [de 30 metros quadrados] de diferentes formas, agregando-os verticalmente e horizontalmente, e é uma espécie de jogo em que depois têm os terraços nos telhados dos vizinhos”, refere o também crítico de arquitetura sobre o grau de complexidade deste edifício de forma irregular que consegue juntar formas côncavas e convexas e cuja construção demorou cinco anos.
Este símbolo da arquitetura modular conta com 446 apartamentos, cinco pátios interiores, muitas escadas e inúmeras passagens de acesso que se espalham pelos seus 16 andares e permitem múltiplas entradas. “É um labirinto. Basicamente, a partir do 10º andar há corredores por toda a parte mas até ao oitavo andar, todas as portas principais são interiores”, diz Marta Nebot, uma das primeiras residentes do Walden 7 que completa 50 anos em 2025. O nome é uma homenagem ao livro “Walden Two”, escrito por B. F. Skinner na década de 1940, onde o autor detalha a experiência de viver numa sociedade composta por seis tipos de comunidades batizadas de Walden. “A equipa de Bofill decidiu que esta era uma nova experiência e chamou-lhe Walden 7.”
Em termos de dimensões, cada apartamento - ou módulo - varia entre os 30 e os 120m2 que, por sua vez, podem estar concentrados em um ou dois pisos. Praticamente todos têm vista para os pátios interiores e o facto de não terem divisões predefinidas, exceto a cozinha e a casa de banho, permite aos moradores tirar partido do espaço de acordo com as suas necessidades.

“Estávamos nos anos 1960 e era um período de grandes mudanças sociais. Não se pretendia fazer um edifício residencial para famílias tradicionais, mas para solteiros ou outro tipo de famílias alternativas. A ideia era que este fosse um módulo de habitação individual. E caso fosse uma família, poderia ter três ou quatro destes modelos, e poderia combiná-los de diferentes formas”, explica o guia.
Marta Nebot é um dos 1.200 inquilinos para quem é um orgulho viver no Walden 7 que é uma declaração de amor às cores Marrocos que pintam o seu interior, como terracota, amarelo e os azulejos azuis vibrantes que decoram as paredes. Desde 1995 que chama de casa a este icónico marco da arquitetura e que nos recebe de braços abertos durante a visita. “Os nossos corredores são as nossas ruas. Temos desportistas, atores de Hollywood, cantores, músicos, Kafka, Quevedo, os Irmãos Marx, e todos os corredores que atravessam de um lado para o outro têm nomes engraçados, como a Galeria da Vergonha. Até temos a Galeria dos Idiotas”, adianta, entre risos, sobre este espaço localizado no 14ª andar onde habita.

“Há várias rotas em diferentes pisos. As passagens de acesso a pé têm diferentes trajetórias e, em cada piso, existe uma forma diferente de percorrer estas ruas”, completa Rafael Gómez-Moriana referindo que, consoante o caminho escolhido por cada morador da apelidada ilha Walden, pode demorar mais ou menos tempo a chegar ao seu apartamento.
O Walden 7, que veio quebrar com o funcionalismo defendido pelo The Congrès Internationaux d'Architecture Moderne (CIAM), destaca-se por promover um conceito habitacional onde a vizinhança e comunidade desempenham um papel central. Prova disso são os espaços comuns onde os residentes onde os vizinhos se podem encontrar para trocar dois dedos de conversa ou desafiar para uma partida de ténis de mesa durante o dia. Durante o verão é possível subir até ao 16º andar e apanhar banhos de sol enquanto se refresca numa das duas piscinas. Quando lhe apetecer fazer algo diferente, pode usar este terraço para organizar festas ou jantares ao ar livre com os seus vizinhos e amigos.

De forma a dar uma nova vida aos espaços inutilizados e que caíram em desuso com o passar dos anos, o edifício passou por diferentes obras de restauro e reabilitações. Exemplo disso foi a construção de quatro estações para bicicletas e das salas das fontes que, por estarem desativadas, vão ser transformadas em espaços comunitários onde os mais pequenos podem brincar durante o dia. Salas de leitura ou salas para eventos são algumas das hipóteses que estão em cima da mesa. É de destacar que o Walden 7 apostou na criação de um programa cultural composto por eventos culturais, performances musicais, sessões de cinema ou mercados.
“Com o COVID-19, parámos e agora estamos a tentar trazer tudo isto de volta. Quando conhecemos os nossos vizinhos, sentimos que ao fazermos parte de algo, estamos a cuidar e a respeitar”, elucida sobre a importância destas atividades para promover um estilo de vida em comunidade, criar um sentimento de pertença e reforçar os laços entre os Waldenitos. “Todos os que vivem no Walden 7 devem sentir que são Waldenitos.”
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