O navio da Celebrity chega ao porto de Kusadasi no raiar da manhã, depois de serpentear pelas ilhas do Mar Egeu, nomeadamente Chios e Samos, que apesar de distarem da costa Turca uma mera meia dúzia de quilómetros, são na verdade Gregas de nacionalidade. Esta proximidade da Turquia, e a muito maior distância a que ficam de Atenas, mostra que esta zona for ao longo dos séculos, ou melhor, dos milénios, alvo de invasões, colonizações e guerras de algumas das mais poderosas e fascinantes civilizações da História da Humanidade. Um dos exemplos que nasceu desse verdadeiro caldeirão civilizacional que é o Egeu foi a cidade de Éfeso, uma das mais importantes de toda esta região, e das que melhor soube resistir ao passar do tempo, tendo chegado aos nossos dias ainda recheada de riqueza patrimonial.
A cidade hoje fica situada a cerca de 5km da costa, mas há 2000 anos atrás o mar chegava às suas portas através de um canal, hoje seco. Era por isso uma cidade portuária, o que justificou o seu apogeu, que fez dela a segunda maior cidade do Império Romano, depois de Roma, com mais de 300.000 habitantes. Nos nossos dias apenas almas e turistas vagueiam pelas suas alamedas e por entre as memórias do que a cidade já foi.
Antes dos romanos aqui chegarem, Éfeso foi uma das 12 cidades da Liga Jónia, durante o período clássico Grego. Foi nesta época que se ergueu em Éfeso o monumento que lhe iria conferir o cáracter do eterno, do imortal, independentemente do declínio de poder a que seria mais tarde votada. Tratou-se do magnífico Templo de Artémis, uma das 7 maravilhas da Antiguidade. Era o maior templo do Mundo, erguido em homenagem à Deusa da Caça e dos Bosques, Artémis para os Gregos e Diana para os Romanos (o templo de Diana em Évora foi-lhe dedicado). O templo, cuja construção durou 120 anos, era feito de 127 colunas de mármore com 20 metros de altura, das quais apenas uma subsiste no local, em virtude de séculos de catástrofes naturais e saques. O templo era habitado por centenas de sacerdotisas virgens, que praticavam artes mágicas e pregavam a superioridade feminina numa época na qual ela ainda não era tão evidente como se calhar é nos nossos dias, dirão as mulheres e se calhar muitos homens. Apropagação do Catolicismo às mãos de Constantino também deixou aqui a sua marca, tendo a cidade sido uma das sete igrejas citadas no livro do Apocalipse.
Não era apenas o grande templo de Artémis que fazia de Éfeso uma cidade monumental sobre o ponto de vista patrimonial. A lista de relíquias que guardava era extensa e incluía um dos maiores teatros do mundo, com capacidade para mais de 25.000 pessoas, a deslumbrante biblioteca de Celso e uma profusão de palácios e termas. A riqueza de Éfeso advinha do comércio, tendo Estrabão escrito que a cidade era "o maior centro de comércio exterior que havia na Ásia".
Éfeso é uma cidade deslumbrante para quem gosta de civilizações desaparecidas. Aqui, entre pedras soltas e vestígios mais ou menos visíveis dos seus monumentos, sente-se o peso da História, os ecos dos uivos dos animais que lutavam com os gladiadores no seu teatro romano, o murmúrio da água que alimentava as suas fontes e canais, os pregões de vendedores vindos dos quatro cantos do império romano, os cheiros das bancas que vendiam peixe vindo das águas transparentes do Egeu. Tudo converge na nossa visão, apesar de nada ser real, de apenas serem imagens de algo que lemos nos guias de viagem ou que nos vêm das memórias de filmes e séries que retratam a vida naquelas eras longínquas. É esse condensado de imagens tangíveis e intangíveis que faz com que a visita a uma cidade em ruínas como Éfeso produza um efeito tão avassalador num viajante esclarecido, e faça com que se criem nele, em nós,novas memórias para o futuro.
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