
A moda como sobrevivência de Bárbara Atanásio
“Estamos a viver e andamos todos um bocadinho a sobreviver a este mundo, um bocado caótico. Acho que a forma como o fazemos é não olhar para a realidade, por um lado, ou é através do sentido humor por outro. É sobrecarregar-nos e ao mesmo tempo não. Portanto, foi um bocadinho isso que tentei fazer nesta coleção”, reflete Bárbara Atanásio, em declarações ao SAPO Lifestyle. O desfile materializa esse paradoxo com uma estética que funde revolta e rendição, numa abordagem que desafia tradições e convenções estéticas.

Sobre a abordagem da coleção, Atanásio explica: "Eles estavam todos a sobreviver." Essa sobrecarga visual traduz-se em silhuetas que desafiam intencionalmente as convenções: "A minha silhueta é tudo. É pôr tudo em cima. Mesmo quando estão super despidos, têm três pares de calças."
O desfile é um espelho do momento atual, onde a realidade se mistura com distopias pessoais. "Eu quis que fosse mesmo um espelho, no sentido em que qualquer pessoa que olhasse não achasse 'eles estão tão lindos, tão contentes'. Eu disse logo: ‘malta, é para entrar com ar zangado’, porque não estamos muito contentes com a situação atual." Essa intenção reflete-se na escolha de materiais, com uma aposta em fibras naturais, que permitem manipulações técnicas e sustentáveis, contrastando com a alienação tecnológica.
A metamorfose dos materiais e da estrutura de ARNDES
Ana Rita de Sousa, com a sua ARNDES, apresentou uma investigação sobre a transformação de materiais clássicos, explorando contrastes entre forma, textura e conceito. "Tenho materiais muito finos e fluidos, mas ao mesmo tempo também tenho materiais mais estruturados, como burel e denim selvedge. Portanto, acho que é tentar mostrar esta dualidade," explica a designer.

Cada peça surge como uma construção feita de pontes invisíveis, onde os moldes se conectam por fios de intenção, criando formas que só existem nesse ponto de convergência. "Os tricôs feltrados foram uma surpresa, nunca os tinha trabalhado antes. Foi um desafio e acho que bem conseguido."
A coleção de ARNDES transita entre o slim e o oversized, equilibrando-se entre dualidades estéticas e funcionais. "Faz sentido ter essa dualidade, esses extremos nas texturas. É muito da minha identidade." O seu processo criativo parte sempre da seleção de materiais deadstock, permitindo um olhar mais consciente sobre a moda. "A questão da contenção também de looks faz todo o sentido e é um reflexo disso."
Do Sangue Novo à afirmação
Tanto para Bárbara Atanásio como para Ana Rita de Sousa, o Workstation representou uma afirmação das suas linguagens criativas depois de ambas terem começado a sua trajetória como novos talentos do concurso Sangue Novo. "Sangue Novo foi o fim do ciclo escolinha, foi a passagem para uma vida nova. E esta coleção representa isso: o caos de estar a descobrir e a sobreviver neste novo mundo que é, se calhar, ser jovem adulto," conclui Bárbara Atanásio.
O Workstation não foi apenas um desfile, mas uma manifestação visual da nossa era de incertezas e contradições. No universo destas designers, a moda não é apenas uma expressão estética, mas uma ferramenta de dissociação, metamorfose e sobrevivência.
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