
Nos anos 1970, o Saraiva’s, junto ao Parque Eduardo VII, era um ponto de visita habitual dos lisboetas, onde a cozinha portuguesa tinha o seu destaque. Décadas depois, o espaço foi revitalizado, preservando alguma da sua decoração original, como os candeeiros vintage e os painéis cerâmicos do século XIX, bem como as peças de Bordallo Pinheiro, que se fundem agora com elementos tropicais. Esta fusão estética entre o passado e o presente prepara o cenário para uma nova narrativa culinária: a da Tailândia, como Bann Saraiva's.

Os fundadores, Caroline e Jérôme, trocaram carreiras em multinacionais — ela no setor do luxo, ele no mundo das FinTech — por uma outra paixão que também partilham, a da gastronomia tailandesa. Caroline, nascida na Tailândia e filha de pais laosianos, cresceu rodeada pelos aromas e sabores da comida tradicional, influência que moldou desde cedo o seu olhar sobre a cozinha. Profissionalmente, trabalhou com marcas de prestígio como a Estée Lauder e outras do grupo LVMH, numa carreira marcada por viagens constantes à Ásia, nomeadamente China, Japão, Hong Kong e Tailândia. Nessas experiências aprofundou, não só o contacto com diferentes culturas gastronómicas, mas também a consciência do lugar central que a alimentação ocupa na vida quotidiana asiática. Mais do que uma necessidade, falamos de um verdadeiro "hobby" coletivo.
Já Jérôme traz consigo o legado de uma família de chefs franceses, descendente direto de cozinheiros que trabalharam ao lado do lendário Auguste Escoffier no Savoy Hotel, em Londres.
Abrir um restaurante surgiu quase como um destino inevitável, depois da pandemia, e de terem o primeiro filho. Caroline sentia falta dos sabores genuínos da sua infância e Lisboa parecia ser o cenário ideal para transformar essa nostalgia numa proposta gastronómica. Para Jérôme, Lisboa tem um peso diferente, pois viveu na cidade há mais de 30 anos, após uma passagem profissional pela Citroën. “Era outra Lisboa?”, questionamos. “Sem dúvida”, responde. Mesmo depois de se mudar para a Suíça, Portugal nunca deixou de estar presente: fosse pela ligação profissional com Angola — onde Jérôme também chegou a viver —, fosse pela atração pessoal que o trouxe de volta, marcada pela proximidade com o mar e a paixão pelo surf na Ericeira.
"Foi uma decisão um pouco louca se pensarmos que estávamos a deixar uma vida profissional confortável e carreiras consolidadas na Suíça. Mas tínhamos esta vontade de abrir um restaurante — na realidade, não apenas um. Começámos com este, e já sabíamos o tipo de cozinha que queríamos fazer. Na altura, só precisávamos de clareza sobre como o queríamos concretizar, onde seria e todos esses detalhes. No fundo, era algo evidente, porque temos uma paixão enorme por comida", explica Caroline sobre a abertura em junho de 2023, mencionando o facto de, por gostarem de restaurantes com estrelas Michelin, ganharam ao longo dos anos, uma grande compreensão de como a comida deve ser preparada e servida.
Para a fundadora, abrir um restaurante é um ato de entrega total, sobretudo quando não se está atrás dos tachos. “Se não és tu a cozinhar, tens de ser ainda mais apaixonado. Estás a depender de outras pessoas para executarem aquilo que tens na cabeça”, explica. Essa paixão reflete-se num rigor absoluto com a qualidade: nada entra no menu sem antes passar por testes, discussões e validações. “Se não estivermos completamente convencidos, não fazemos.” Caroline e Jérôme criam as propostas em conjunto, afinam com os chefs e só seguem em frente quando todos os detalhes fazem sentido. O objetivo é simples, mas exigente: servir um prato com o mesmo cuidado, seja a um amigo, num almoço descontraído, ou a um cliente ao jantar.
É já sentados à mesa de almoço que os proprietários nos explicam a visão que têm para o Bann's Saraiva: a qualidade e os produtos locais são prioridades inegociáveis, desde o porco Duroc, uma raça produzida em Portugal e que tem a melhor proporção entre gordura e carne, ideal para a fritura, ao peixe fresco comprado no Mercado 31 de Janeiro, no centro de Lisboa, passando pelos legumes cultivados no Algarve, muitos a partir de sementes trazidas da Tailândia, como no caso da papaia verde e do feijão-verde “snake bean”. Tudo segue um circuito curto, pensado para garantir sabor, consistência e identidade. Os ingredientes que não podem ser substituídos por produtos nacionais, como galanga, folhas de lima kaffir ou citronela, chegam semanalmente da Holanda, o principal hub de produtos asiáticos na Europa.
A identidade do restaurante vai além de simplesmente replicar a gastronomia tailandesa, e sim prepará-la prepará-la de forma o mais autêntica possível. Para isso, contam com uma equipa de três chefs tailandeses, cada um especializado numa região do país: Andy, de Banguecoque, é o chef principal e especializado na cozinha da região centro do país, Runglawan, do nordeste, mais precisamente Isaan, domina a culinária dessa região e Tanavut, do sul, tem experiência internacional, incluindo na Embaixada tailandesa. Como resume Caroline, “o que propomos é uma cozinha do norte ao sul, do leste ao oeste.”
E se pensarmos que "Bann", significa casa, este é o lar daqueles que querem matar saudades dos sabores do sudeste asiático: de tailandeses a portugueses, passando por americanos, são muitas as nacionalidades que aqui vêm encher a barriga. Até Carlos Moedas é um cliente habitual.
Uma viagem pelos sabores da Tailândia sem sair do lugar
Antes de iniciarmos a nossa refeição, Caroline explica-nos os quatro pilares da gastronomia tailandesa: "A base é o doce, o salgado, o picante e o azedo. É realmente um emblema. Se quisermos ter sucesso num jantar ou almoço, temos de respeitar esses pilares."
No menu há muito mais do que o incontornável Pad Thai (21€). Entradas como os Rolos Primavera Thai Fresco ou Frito (3 peças por 9 €), Espetadas de Frango (3 peças por 11 €), caril como o Gaeng Keow (19 €) ou saladas tailandesas, como o Som Tum (14 €) e o Laab Moo (19 €), combinam esses quatro pilares. Entre as sopas, estão clássicos como o Tom Yum e o Tom Kha, disponíveis em porções pequena (10 €) ou grande (19 €).
O menu também inclui pratos de assinatura como o Kai Tod Hat Yai (21 €), o Seua Rong Hai (34 €) e o Chuchi Lavagante (39 €), que reforçam a proposta gourmet da casa. Há ainda opções mais acessíveis durante o dia, como o Nang Kai Tod (5 €).
A carta de bebidas inclui vinhos de produtores portugueses, como Filipa Pato, e mesmo cervejas sem álcool.
Para terminar, nada como um mango sticky rice, uma sobremesa típica que combina o sabor doce da manga madura com a suavidade do arroz "pegajoso" e leite de coco, que aqui assume cores diferentes. Se não quiser ir ao habitual, há muito por onde escolher.
O SAPO Lifestyle esteve no Bann Saraiva's a convite do restaurante.
Comentários