O Plano Nascer em Segurança, que surgiu em dezembro de 2022 e começou por ser uma resposta às dificuldades de funcionamento no período de natal e ano novo, reorganizando a resposta na Obstetrícia e Ginecologia, acabou por se estender a 2023.
As alterações causaram polémica, com os utentes a contestarem o encerramento em muitas situações. No caso do maior hospital do país - Santa Maria (Lisboa) – a necessidade de construir uma nova maternidade acabou por ditar as mudanças, transferindo serviços para o Hospital São Francisco Xavier, mesmo com grande contestação dos profissionais.
Em Santa Maria, a polémica levou ao afastamento da direção do Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina de Reprodução, que incluía Diogo Ayres de Campos, que coordenou a comissão de acompanhamento de resposta em urgência de ginecologia, obstetrícia e bloco de partos ainda no mandato da ministra Marta Temido.
A reorganização das urgências começou pela Obstetrícia e por ser provisória, mas acabou por se estender a outras especialidades, que hoje integram o plano de resposta na rede de serviços de urgência desenhado pela Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) e que entrou em vigor em novembro.
Quando anunciou este plano, que é revisto semanalmente, a direção executiva assumiu que a reorganização era imposta pela falta de meios para uma resposta plena dos serviços, sobretudo depois das minutas que milhares de médicos entregaram ao longo do ano a rejeitar fazer mais do que as 150 horas extraordinárias previstas na lei.
Este protesto ganhou força com o aparecimento do Movimento Médicos em Luta, que promete não baixar os braços.
A necessidade deste plano para as urgências mostrou bem as limitações provocadas por décadas de desinvestimento na Saúde, com falta de valorização dos profissionais e de investimento em condições de trabalho, o que faz com que uns fujam para o privado e outros emigrem, no meio de uma classe que tem visto centenas de médicos reformarem-se todos os anos.
Aliás, a carreira médica continua a ser tão pouco atrativa que em novembro ficaram por preencher um número recorde de vagas para o internato da especialidade. Foram mais de 400, mais do dobro do ano anterior, grande parte delas em Medicina Interna, uma especialidade central nos serviços de urgência.
A Ordem dos Médicos, este ano com um novo bastonário, tem insistido na necessidade de valorizar o trabalho médico e manter a qualidade da formação médica. A este respeito, o bastonário chegou mesmo a criticar o diploma aprovado pelo Governo para agilizar o reconhecimento de competências de médicos estrangeiros, prometendo que a Ordem “não vai facilitar”.
Foi um ano de luta intensa dos médicos, com negociações que já vinham do ano passado e que só parcialmente viram a luz do dia e já no final de novembro - à beira da aprovação do Orçamento do Estado -, quando o Governo chegou a um “acordo intercalar” com o Sindicato Independente dos Médicos. A Federação Nacional dos Médicos rejeitou assinar, considerando o acordo discriminatório.
Ainda quanto aos médicos, o Governo fez aprovar o diploma relativo à dedicação plena, sem o acordo dos sindicatos.
Foi igualmente este ano, que fecha com uma polémica sobre alegadas pressões políticas para o tratamento de duas gémeas luso-brasileiras no Santa Maria, que a Direção Geral da Saúde mudou de mãos: saiu Graça Freitas e entrou Rita Sá Machado.
Com a DE-SNS a exercer em pleno, finalmente com estatutos aprovados, foi também um ano em que houve uma redefinição da organização do SNS, que levará ao desaparecimento das Administrações Regionais de Saúde, com as funções operacionais transferidas para as Unidades Locais de Saúde (ULS), que integram hospitais e centros de saúde de uma região na mesma instituição, com autonomia administrativa e financeira.
No acesso ao sistema, foi igualmente este ano que o Governo decidiu alargar o modelo B (pagamento por objetivos) a todas as Unidades de Saúde Familiar.
Contudo, as propostas do Governo para regular o funcionamento das USF modelo B não são pacíficas e, em outubro, mais de mil médicos de família já tinha assinado uma carta de contestação.
Atualmente, há mais de 1,5 milhões de portugueses sem médico de família, um número que o Governo do PS não conseguiu baixar, apesar das promessas eleitorais.
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