O que é a Colangite Biliar Primária e quais são os seus sintomas?
A Colangite Biliar Primária (CBP) é uma doença rara do fígado que se caracteriza por um estado inflamatório crónico, sobretudo ao nível dos pequenos canais biliares do fígado. Sem tratamento, a doença poderá provocar uma reação fibrótica (como uma espécie de cicatriz), que ao progredir acaba por levar à cirrose e menos frequentemente ao cancro do fígado. Atualmente afeta entre 1.000 a 2.000 portugueses.
A CBP tem poucos sintomas e estes são pouco específicos, o que poderá atrasar o diagnóstico. É uma doença com sintomas camuflados, mas os mais comuns são a fadiga e o prurido. A fadiga surge em mais de 80% dos doentes. O prurido é o segundo sintoma mais frequente, afetando 20 a 70% dos doentes, surgindo com maior intensidade durante a noite ou quando está calor. A sua gravidade varia muito, com impacto significativo na qualidade de vida do doente. A CBP poderá causar cirrose hepática e gerar icterícia, ascite, encefalopatia ou hemorragia digestiva.
Quem está mais suscetível a esta doença?
A CBP surge sobretudo em mulheres, com uma frequência de cerca de 9 mulheres em cada 10 doentes, e mais frequentemente na meia-idade, com maior incidência em pessoas entre os 40 e os 60 anos de idade.
Na sua fase inicial, poderá não ter quaisquer sintomas associados ou manifestar-se através de sintomas pouco específicos. Poderão decorrer vários anos até ao diagnóstico
É possível preveni-la?
A causa da CBP ainda não é conhecida. No entanto, acredita-se que esta patologia tenha uma etiologia multifatorial. Sabe-se que a CBP é mais frequente em zonas de maior atividade industrial e em países mais desenvolvidos. Adicionalmente, a CBP tem vindo a ser associada a hábitos tabágicos, bem como a alterações dos cromossomas sexuais e a antecedentes de infeções frequentes do trato urinário.
Porque pode demorar anos a ser diagnosticada?
Na sua fase inicial, a CBP poderá não ter quaisquer sintomas associados, ou manifestar-se através de sintomas pouco específicos. Assim, apesar de o diagnóstico ser relativamente simples, poderão decorrer vários anos desde as primeiras alterações até ao diagnóstico, período durante o qual a doença evolui, levando à deterioração progressiva do fígado. Durante o período assintomático, o diagnóstico poderá ser suspeitado pela alteração das análises do fígado, observada em avaliação laboratorial de rotina.
Adicionalmente, tratando-se de uma doença rara, a falta de conhecimento por parte do doente, e também dos profissionais de saúde, poderá contribuir para a desvalorização dos sintomas e para a confusão com outros quadros clínicos.
Quais são as principais dificuldades diárias de quem é portador da doença?
Com o projeto CBP (In)Forma Rara, distinguido em 2016 pelo prémio Practice to Policy da Intercept, a Raríssimas teve a oportunidade de contactar de forma mais próxima com os doentes com CBP, o que permitiu ter uma melhor noção das suas necessidades.
Ao longo do projeto, foram partilhadas dúvidas relacionadas com o tratamento e prognóstico desta doença, sobretudo quando o agravamento da patologia exige um transplante hepático. Por outro lado, muitos destes doentes revelaram não conhecer mais ninguém com a mesma patologia, com quem pudessem partilhar a sua experiência, dúvidas e preocupações. Tratando-se de uma doença que afeta, maioritariamente, mulheres em idade ativa, poderão surgir algumas dificuldades relacionadas com o trabalho. Algumas das pessoas que contactaram a Linha Rara colocaram questões sobre os seus direitos no trabalho e o acesso a possíveis benefícios sociais e fiscais.
Por outro lado, umas das principais dificuldades destes doentes continua a consistir no seu diagnóstico precoce. Com o CBP (In)Forma Rara iniciámos um caminho de sensibilização para esta doença, alertando para os seus sinais e sintomas, mas também para a forma de diagnosticar esta doença. No entanto, continuará a ser necessário aumentar a visibilidade da CBP, para que esta doença muitas vezes silenciosa possa ser diagnosticada o mais rapidamente possível. Este continua a ser um dos objetivos da Raríssimas no seu segundo projeto apoiado pelo Practice to Policy de 2017, o CBP Cidadania Rara.
Importa ainda referir a necessidade de prestar um apoio interdisciplinar a estes doentes. Para além da gestão e tratamento médico dos sintomas da CBP, será igualmente relevante disponibilizar apoio psicológico aos doentes e famílias que sintam dificuldade em lidar com o impacto desta patologia no seu bem-estar e qualidade de vida.
Porque é que esta doença pode conduzir à estigmatização?
Antes da alteração da nomenclatura, a doença designava-se por Cirrose Biliar Primária. A palavra “cirrose” tem uma conotação negativa, uma vez que é habitualmente associada ao alcoolismo. Atualmente, com o termo “colangite”, a comunidade em geral já não terá a mesma tendência para fazer essa associação, o que contribui de forma positiva para a redução da estigmatização destes doentes. Ainda assim, a evolução da doença para estados mais graves, como a cirrose, poderá levar a esta falsa associação ao consumo de álcool.
Porque é que a incidência da patologia está a aumentar nas zonas industrializadas?
A etiologia da CBP é complexa. No entanto, a comunidade científica acredita que o desenvolvimento desta patologia poderá ser impulsionado por fatores ambientais e genéticos. Ainda assim, apesar dos diversos estudos epidemiológicos realizados até à data, apenas o tabagismo e as infeções frequentes do trato urinário têm vindo a ser consistentemente associados a esta doença.
Quais são as esperanças no tratamento desta doença?
Atualmente não existe cura para a CBP. O principal objetivo do tratamento médico é a estabilização da doença, por forma a evitar a sua progressão para cirrose e insuficiência hepática. O tratamento médico permite ainda reduzir os sintomas associados, nomeadamente a fadiga e o prurido, contribuindo assim diretamente para a qualidade de vida do doente.
Até recentemente, o ácido ursodesoxicólico (UDCA) era a única medicação disponível para o tratamento da CBP. Contudo, 30 a 40% dos doentes não responde de forma adequada ou é intolerante a este medicamento. O tratamento da CBP não sofria alterações há mais de 20 anos, mas em 2016 foi aprovado na Europa um tratamento inovador, o ácido obeticólico, que vem dar resposta e esperança a estes casos.
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