Estes dados constam de um relatório da Direção-Geral da Saúde (DGS), do Ministério da Saúde, divulgado ontem e que traça um panorama de casos verificados ou comunicados em unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
A mutilação genital feminina — que consiste na retirada total ou parcial de partes genitais, com consequências físicas, psicológicas e sexuais graves, podendo até causar a morte — ainda é uma prática comum em três dezenas de países, sobretudo africanos.
A nível global, estima-se que a prática ponha em risco três milhões de meninas e jovens todos os anos e que cerca de 200 milhões de mulheres e meninas tenham já sido submetidas à MGF.
De acordo com os dados da DGS, divulgados no Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, dos 433 casos, sete foram considerados inválidos por apresentarem informação incongruente, o que significa que no relatório foram analisados 426 registos de MGF entre 2018 e 2021.
O documento adianta que, “maioritariamente, os registos foram feitos no âmbito da vigilância da gravidez (43,4%) e os restantes durante o puerpério (22,1% – período que decorre desde o parto até ao restabelecimento da mãe), em consulta (17,6%) ou aquando de internamento (16,9%)”.
O relatório adianta que desde 2014, quando começaram a ser contabilizados estes casos, foram registados um total de 668 casos de mutilação genital feminina em Portugal.
Em 2019 ocorreu uma duplicação do número de registos, seguido de uma queda de 21,4%, “provavelmente devido à pandemia por covid-19, seguido novamente de um aumento de 39,4% do número de registos anual em 2021”, lê-se.
O estudo dá conta de que, nos quatro anos em análise (2018-2021) nas mulheres observadas, continua a existir uma predominância de casos realizados na Guiné-Bissau (63,8% – 272 casos) e na Guiné Conacri (27,2% – 116 casos), assim como um aumento gradual dos registos de mutilações praticadas no Senegal, com 16 casos assinalados.
Existe apenas um caso registado como tendo sido realizado em Portugal.
Na Guiné-Bissau, na Guiné Conacri e no Senegal é onde se regista a predominância de tipos de mutilação genital mais grave.
Os dados apontam que, entre 2018 e 2021, a média da idade aquando da realização do procedimento foi 8,4 anos, variando entre o primeiro ano de vida e os 39.
Em cerca de 75% dos casos, a mutilação ocorreu até aos nove anos de idade, tendência que se mantém relativamente aos anos anteriores. A média de idade atual destas mulheres é de 30,6 anos, variando entre os sete e os 56 anos.
Verifica-se ainda que os registos muitas vezes não disponibilizam a informação completa, pois especificamente sobre a idade em que ocorreu a MGF, 59,2% dos registos, entre 2018 e 2021, não tem essa informação.
O relatório da DGS refere que, entre 2018 e 2021, foram registadas complicações em 196 mulheres (46,0% da totalidade dos registos), entre as quais: 120 relativas à resposta sexual, 120 a complicações do foro psicológico, 113 com consequências obstétricas e 87 com sequelas uro-ginecológicas.
Muitas vezes, acrescenta, as complicações resultantes da MGF sobrepõem-se.
Em 54,0% dos registos efetuados não consta informação sobre eventuais complicações.
A maioria dos registos foi efetuada nos cuidados hospitalares (81,8%) e 18,2% nos cuidados de saúde primários.
A quase totalidade dos casos foi registada em unidades inseridas na ARSLVT, existindo apenas um em Braga.
A nível hospitalar, o Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (Amadora/Sintra) isola-se na quantidade de registos efetuados e nos cuidados de saúde primários destaca-se o Centro de Saúde de Queluz.
Segundo dados da UNICEF de 2021 citados no relatório, pelo menos 200 milhões de adolescentes e mulheres vivas atualmente foram submetidas a MGF em 30 países diferentes.
De acordo com a informação sobre os perfis estatísticos dos países sobre a MGF publicados pela UNICEF, na Guiné-Bissau quase metade (45%) de todas as raparigas e mulheres em idade reprodutiva já foram submetidas à MGF.
Em algumas regiões essa percentagem é de 80%. Na Guiné Conacri, a percentagem de raparigas e mulheres dos 15 aos 49 anos de idade que sofreram MGF é ainda mais elevada (95%), com algumas variações por etnia e religião.
As mulheres que constam nos registos em Portugal são provenientes de países como a Costa do Marfim, Egito, Eritreia, Etiópia, Gâmbia, Gana, Guiné Conacri, Guiné-Bissau, Nigéria, Senegal, Serra Leoa, Somália e Sudão.
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