Ao longo do tempo, a prevalência das doenças cardiovasculares tem vindo a crescer resultado de estilos de vida desadequados e consequente aumento de fatores de risco modificáveis (fumar, beber álcool, obesidade, hipertensão arterial e hipercolesterolémia, por exemplo).

Em Portugal, de acordo com dados do estudo e COR, cerca de 68% da nossa população apresenta dois ou mais fatores de risco para doença cardiovascular e 22% quatro ou mais. Entre estes fatores de risco, destaco o excesso de colesterol, a hipercolesterolémia, que, segundo a Organização Mundial de Saúde, é responsável por mais de metade dos enfartes agudos do miocárdio.

Então o que é o colesterol e porque é que o seu excesso é prejudicial?

No nosso organismo circulam três tipos principais de gorduras: as lipoproteínas de baixa densidade (Colesterol LDL) que transportam o colesterol do fígado para as células, as lipoproteínas de elevada densidade (Colesterol HDL) que levam o colesterol das células para o fígado onde é processado e eliminado e os triglicerídeos que se depositam no tecido adiposo e muscular e servem como reserva de energia.

O colesterol é uma gordura produzida pelo fígado ou obtida a partir de produtos animais ricos em gordura como as carnes vermelhas, os ovos e lacticínios, entre outros. É necessário para o funcionamento normal do nosso organismo, estando presente nas membranas (camadas externas) de todas as células. No entanto, para satisfazer as nossas necessidade só precisamos de uma pequena quantidade. Quando existe excesso, o colesterol vai-se acumular nas paredes arteriais formando as chamadas placas de ateroma. Este processo, geralmente assintomático, quando afeta a parede das artérias coronárias pode impedir que o sangue chegue em quantidade suficiente ao miocárdio e provocar dor no peito (angina de peito) e, caso a placa determine obstrução completa ao sangue, desenvolve-se um enfarte agudo do miocárdio.

A abordagem terapêutica

Uma vez que se percebeu que a redução de colesterol diminuía as doenças cardiovasculares, sentiu-se necessidade de desenvolver medicamentos com este propósito. As estatinas foram o primeiro grupo de fármacos utilizados com eficácia e segurança. O benefício clínico da sua utilização encontra-se mais que comprovado, tendo-se verificado que o risco vascular está essencialmente associado ao Colesterol LDL, por isso geralmente denominado como o “colesterol mau”, e que uma redução de 40 mg/dL no seu valor corresponde a uma redução do risco de cerca de 22%. Esta evidência deu origem à expressão “quanto mais baixo melhor” no que concerne os níveis de Colesterol LDL.

Mais recentemente temos disponíveis novas terapêuticas, cuja associação às estatinas permite, de forma segura, uma redução ainda mais significativa dos valores de Colesterol LDL e paralelamente uma diminuição significativa dos eventos cardiovasculares e da mortalidade. Os investigadores perceberam ainda que, mesmo para valores de Colesterol LDL muito reduzidos os ganhos em termos de proteção cardiovascular se mantinham. Fruto desta crescente evidência, as últimas recomendações europeias, propõem-nos metas cada vez mais ambiciosas para redução do Colesterol LDL.

Apesar disso, constatamos que ainda estamos longe dos objetivos a que nos propomos como podemos depreender dos resultados do estudo DISGEN-LIPID realizado em Portugal e no qual se concluiu que mais de metade dos doentes com elevado risco cardiovascular não atingem as metas definidas. Apesar de termos um arsenal terapêutico cada vez maior e mais eficaz, importa não esquecer que é essencial modificar estilos de vida: devemos adotar uma dieta equilibrada com baixo teor de gorduras saturadas e praticar exercício regular, medidas que para além de reduzirem o colesterol LDL podem ajudar no controlo do peso, da diabetes e pressão arterial, outros fatores de risco para doença cardiovascular.

A hipercolesterolémia é uma doença que evolui de forma silenciosa mas cuja primeira manifestação pode ser catastrófica. Assim, a introdução precoce e manutenção de alterações do estilo de vida e terapêuticas específicas, são um grande desafio e responsabilidade para profissionais de saúde e, também, para toda a população. Esta é a única forma de conseguirmos evitar eventos cardiovasculares, evitar mortes prematuras e melhorar a qualidade de vida de todos.

Um artigo do médico Rodrigo Leão, do Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Central, Coordenador da Região Sul do Núcleo de Estudos de Prevenção e Risco Vascular da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, Vogal da Sociedade Portuguesa de Aterosclerose, Professor Universitário na NOVA Medical School.