A Coligação “Nação Invisível” surgiu de uma colaboração entre a Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, a Fundação Portuguesa de Cardiologia (FPC), Portugal AVC – União de Sobreviventes, Familiares e Amigos, e a Novartis, com o propósito de combater as doenças cérebro-cardiovasculares em Portugal. O Seu objetivo central é mobilizar a sociedade civil para uma abordagem integrada na prevenção, diagnóstico precoce e acompanhamento das doenças. Em entrevista exclusiva ao nosso jornal, Manuel Carrageta, explica que FPC desempenha um papel essencial nesta coligação ao conscientizar sobre a importância de um estilo de vida saudável e do controle de fatores de risco. “A Coligação busca sensibilizar não apenas a população, mas também profissionais de saúde e decisores políticos, visando transformar a saúde cérebro-cardiovascular em prioridade em Portugal. Com o intuito de enfrentar desafios como a alta mortalidade associada às doenças cardiovasculares, acrescenta o presidente da FPC”
Healthnews (HN) – Como nasceu, que organizações integra e quais os principais objetivos da coligação “Nação Invisível”?
Manuel Carrageta (MC) – A Coligação Nação Invisível pela saúde da saúde cérebro-cardiovascular dos portugueses resulta de uma colaboração entre a Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca (AADIC), a Fundação Portuguesa de Cardiologia (FPC); a Portugal AVC – União de Sobreviventes, Familiares e Amigos (PT.AVC) e a Novartis e tem como objetivo mobilizar a sociedade civil para combater o atual cenário das doenças cérebro-cardiovasculares (DCCV) em Portugal. Trata-se de um movimento que tem como objetivo agregar todas as esferas da sociedade que possam contribuir para uma atuação integrada na prevenção, diagnóstico precoce e acompanhamento adequado das DCCV,. É pois fundamental para o seu sucesso a participação da sociedade como um todo.
Healthnews (HN) – Que papel pretende desempenhar a Fundação Portuguesa de Cardiologia nesta “Coligação”?
Manuel Carrageta (MC) – Muito além da elevada carga de doença das DCCV, preocupam-nos o contexto e o seu impacto, numa sociedade que enfrenta hoje as consequências de viver e morrer de DCCV. Não podemos aceitar como inevitável o fardo que a sociedade suporta e que, no contexto do envelhecimento que caracteriza o nosso país, implica consequências que extravasam a saúde e se tornam avassaladoras. Ao longo dos anos temos trabalhado com a sociedade civil para a consciencialização da importância de um estilo de vida saudável e do controlo dos fatores de risco e para a necessidade de uma atuação a nível individual e coletivo. É com entusiasmo que o continuaremos a fazer de uma forma integrada através da Coligação Nação Invisível.
HN – Por que é importante sensibilizar não apenas a população, mas também os profissionais de saúde e os decisores políticos?
MC – A Coligação “Nação Invisível” nasce da preocupação com a falta de medidas adequadas e de ações concretas por parte das autoridades de saúde para reduzir, de forma eficaz, o impacto negativo que estas doenças têm na sociedade portuguesa. As organizações que atuam na área das doenças cérebro-cardiovasculares concordaram em unir esforços e trabalhar em conjunto para alterar o atual cenário das DCCV em Portugal. O objetivo principal será trabalhar para desencadear uma mudança de comportamento na sociedade, junto da comunidade de doentes e dos decisores, para que a saúde cérebro-cardiovascular passe a ser uma prioridade. Criar uma estratégia de abordagens integradas que fomentem a literacia dos portugueses sobre os fatores de risco para as DCCV, assim como mobilizar todos para definir metas concretas e a tomada de medidas públicas que permitam reduzir o impacto destas doenças no futuro.
Sendo um movimento agregador do maior número possível de atores que possam contribuir para uma atuação integrada na prevenção, diagnóstico precoce e acompanhamento adequado nas DCCV, a participação da sociedade como um todo, é fundamental para o seu sucesso.
HN – Quais são os dados mais recentes sobre os fatores de risco e mortalidade associada às doenças cérebro-cardiovasculares em Portugal?
MC – De acordo com os dados divulgados pelo Eurostat, as doenças cardiovasculares continuam a ser a principal causa de morte em 23 Estados-membros, com exceção para a Dinamarca, França, Irlanda e Países Baixos, onde prevalecem as mortes por cancro.
Estes dois grupos de doenças foram os mais fatais na UE, com um total de 1,7 milhões de óbitos. Em contrapartida, a Covid-19 foi a terceira maior causa de morte, com quase meio milhão de mortes.
Em Portugal, as doenças cardiovasculares são responsáveis por cerca de 33 mil mortes por ano, ou seja um terço do total de óbitos. Cerca de 8 em cada 10 óbitos que ocorrem precocemente (antes dos 70 anos) podiam ser evitados.
HN – Como esses dados justificam a necessidade de uma iniciativa como a “Nação Invisível”?
MC – Falta tornar visível o que não se vê nem se sente. O mau colesterol, LDL, só se vê que está elevado, quando fazemos análises, e o facto de estarmos medicados para o colesterol não significa que esteja garantidamente normal.
O Estudo LATINO, mostrou que mais de 90% dos doentes com risco cardiovascular elevado e muito elevado não conseguiram baixar o seu colesterol LDL para valores recomendados (inferior a 70 mg/dL para quem tem risco elevado e 55 mg/dL para quem tem o risco muito elevado). Cerca de 20% dos doentes com muito alto risco não estavam a fazer qualquer medicação para o colesterol.
Sabemos hoje, que o colesterol das LDL não é meramente um fator de risco, é a causa da aterosclerose e portanto deve ser o principal alvo terapêutico.
Um estudo da Fundação Portuguesa de Cardiologia mostra que cerca de dois terços da população adulta portuguesa têm o colesterol elevado. No entanto, o colesterol elevado não causa sintomas. Quando estes ocorrem, manifestam-se sob a forma de dor no peito devido a angina de peito ou enfarte do miocárdio. Estamos, pois, perante uma patologia grave em que é fundamental fazer prevenção.
Por outro lado, ainda não é suficientemente reconhecido que o colesterol, não é apenas um fator de risco cardiovascular; é a causa da aterosclerose e de enfarte do miocárdio, devendo ser por isso o principal alvo terapêutico.
HN – Duas em cada três mortes por doenças cérebro-cardiovasculares são devidas a DCCV não controlada. Quais são os principais desafios no controle desta doença?
MC – Quando o médico prescreve um medicamento é para se obter um efeito terapêutico que consiga diminuir a probabilidade de o doente ter um evento que à partida o médico sabe existir.
Quando o doente toma o medicamento que o médico lhe prescreveu não deve tomá-lo só para “fazer a vontade” ao médico. Deve fazê-lo com a perfeita convicção de que tomá-lo é salvaguardar uma esperança de vida com qualidade, é garantir um bem-estar não só individual, mas também familiar e social.
Mas tomar o medicamento não basta; há hábitos e comportamentos que muito ajudam a atingir os objetivos terapêuticos se forem modificados.
Está nas mãos de cada um tornar visível o que não se vê nem se sente.
Como panorama geral, podemos dizer:
Mais de um terço dos portugueses têm excesso de peso e cerca de um quinto são obesos, o que significa que mais de metade da população tem problemas de peso excessivo.
A diabetes é cada vez mais prevalente em Portugal atingindo cerca de 12% da população portuguesa adulta, sobretudo com idade superior a 40 anos
Em Portugal, cada dia que passa, cerca de 12 pessoas sofrem um acidente vascular cerebral, dos quais 6 são mortais. Embora a incidência dos AVC esteja a baixar em Portugal, continua a ser a principal causa de morte e também a principal causa de incapacidade de longo prazo, ao deixar o doente gravemente dependente do apoio de outros.
Todos os anos morrem cerca de 10000 portugueses devido a ataques cardíacos, enquanto outros vinte mil sobrevivem a este evento extremamente perigoso.
A insuficiência cardíaca afeta cerca de 700000 portugueses e é uma patologia cardíaca em franco aumento. Já é hoje a principal causa de internamento hospitalar dos indivíduos com mais de 65 anos.
A fibrilhação auricular (FA) é hoje a alteração mais frequente do ritmo cardíaco, sendo responsável por um em cada cinco acidentes vasculares cerebrais que ocorrem em Portugal
HN – Que medidas específicas a coligação pretende implementar para melhorar o controlo das DCCV?
MC – Pretende-se chamar a atenção para o impacto que as doenças cardiovasculares têm na população portuguesa e como ajudar na sua prevenção. Será importante referir que esta Coligação nasce da preocupação que os seus membros fundadores têm com o atual cenário das doenças cardiovasculares em Portugal e com a falta de medidas e ações por parte das autoridades de saúde para reduzir, de forma eficaz, o impacto negativo que têm em Portugal, não só numa perspetiva médica mas também social e económica. Será igualmente, importante, referir que a Coligação quer criar um sentido de urgência para alterar o atual cenário e desenvolver um programa de ações, para que a saúde cérebro-cardiovascular seja uma prioridade no cenário português das doenças cardiovasculares.
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