Sempre a tossir, sempre cansado, não consegue correr, sempre a
coçar-se, sempre constipado, sempre a tomar antibiótico, acorda sempre com sono, ressona tanto, diziam que passava com a idade mas começo a duvidar.

Perante estas afirmações, a pergunta que se coloca aos pais é incontornável.

Será que é alergia? Descubra agora.

As doenças alérgicas res­piratórias (rinite e asma) e o eczema atópico são as manifesta­ções de alergia mais frequentes na criança. «Em muitos casos, estas doenças coexistem. A maioria dos asmáticos tem rinite, quase metade das crianças com rinite podem ter ou vir a sofrer de asma, e mais de metade das crianças com eczema atópico podem vir a desenvolver asma ou rinite», indica Mário Morais de Almeida, presidente da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imuno­logia Clínica (SPAIC).

«No entanto, apesar de estas doenças alérgicas serem muito frequentes, continua a existir um significativo problema de falta de diagnóstico e de ausência de tratamento», acrescenta este especialista. As alergias afetam mais de um terço das crianças portuguesas, desde a primeira infância, acentuando-se na idade escolar.

«A rinite é a manifes­tação alérgica mais frequente. Mais de 25% das nossas crianças em idade escolar têm sintomas actuais de rinite. E 10% têm ao mesmo tempo queixas oculares de conjuntivite. Aasma afeta 10 a 15% e o eczema atópico mais de 10% das crianças em idade escolar», salienta ainda Mário Morais de Almeida.

Como diagnosticar as alergias infantis

O diagnóstico é fundamentalmente clínico. Conforme explica o
presi­dente da SPAIC, «valorizam-se os sintomas e os sinais, caracterizando o calendário e a sazonalidade, os desencadeantes e o que os alivia».

Os relatos da criança e dos pais são, por isso, essenciais. «Falamos com os pais e sempre que possível com as crianças, que colaboram ativamente em estudar as pistas que levam a resolver o mistério das suas alergias», explica Mário Morais de Almeida.

O seu envolvimento é sempre desejável até porque tudo o que vier a ser feito depende de um contrato entre a criança, os pais e a equipa de saúde. Alguns exames auxiliares de diag­nóstico podem ser necessários, mas habitualmente poucos.

«Os testes cutâneos, a que as crianças aderem com entusiasmo e interesse, encontram-se na primeira linha, mas não são fundamentais para a abordagem inicial. Algumas análises e estudos da função respiratória estão indicados em várias situações de doença. É tão simples dar alegria à maioria das crianças que sofre de alergia», esclarece o especialista.

Se suspeita que o seu filho sofre de alergias infantis, contacte com o seu médico assistente, pediatra ou clínico geral. Quando indicado, o médico assistente promoverá a articulação com o imunoalergologista.

Estratégias simples para prevenir as alergias infantis

Evitar os alergénios do ambiente interior. Os ácaros do pó doméstico representam a principal causa de alergia na população portugue­sa.

As medidas aconselhadas para evitar a exposição estes alergénios são:

- Manter um arejamento e ventilação adequadas

- Evitar alcatifas e carpetes (substituir por pavimento de linóleo, mosaico ou madeira envernizada)

- Utilizar colchões recentes

- Colocar coberturas anti-ácaros nos colchões e almofadas

- Utilizar lençóis de algodão, almofadas e edredão sintéticos

- Lavar a roupa da cama e as cobertas plásticas com água a 60º C

- Remover do quarto peluches ou objectos que acumulem pó (por exemplo, livros)

- Usar aspirador com filtro de alta eficiência (HEPA)

- Controlar a humidade relativa em valor inferior a 50% (os desumidificadores podem ser úteis)

- Nos doentes alérgicos a animais domésticos (gato, cão, coelho, hamster, entre outros), pode ser necessário remover estes animais da habitação, não devendo estes frequentar os quar­tos de dormir e deve aumentar-se a ventilação da casa.

Evitar os alergénios do ambiente exterior

Os pólenes são os alergénios mais importantes do ambiente exterior.

Eis algumas medidas úteis:

- Conhecer o boletim polínico da região (disponível em www.spaic.pt)

- Planear viagens de fim de semana ou férias elegendo alturas do ano e locais livres do(s) pólen(es) aos quais a criança é alérgica

- Evitar o campo em fases de grande concentração de pólenes

- Manter fechadas as janelas de casa, durante o dia

- Usar óculos escuros

- Viajar com as janelas fechadas

Evitar o fumo do tabaco

- O fumo do tabaco aumenta o risco do aparecimento de asma e outras doenças alérgicas e nas crianças com asma é um conhecido fator desencadean­te das crises, associando-se a maior gravidade da doença, com aumento do risco de crises graves com internamento hospitalar e mortalidade.

- Os pais das crianças asmáticas deverão ter consciência de que se fumam ou deixam que outros fumem perto dos seus filhos (em casa ou no carro) estão a prejudicar gravemente a saúde dos seus filhos, aumentando de forma significativa o risco de uma crise e a gravidade da doença.

- É preciso não esquecer que a criança pequena não pode manifes­tar verbalmente o seu mal-estar e que a tosse é habitualmente a sua única forma de expressão.

- Não esquecer que o aleitamento materno é uma das medidas mais importantes para prevenir as aler­gias nos primeiros anos de vida.

Alergia versus asma

Há quem pense que a alergia e a asma signifi­cam a mesma coisa. Nada mais errado.

«Alergia não é uma doença, identi­ficando um distúrbio imunológico que traduz a existência de anticor­pos contra alergénios, geralmente proteínas, com que contactamos habitualmente (como por exemplo, os ácaros, os pólenes, os alimentos e os venenos de insectos)», reforça Mário Morais de Almeida. A alergia corresponde a um exagero ou excesso de resposta imunitária.

Por outro lado, «a asma é uma das doenças em que as alergias estão envolvidas. Na criança asmática, a alergia está muito presente, mas não é obrigatória para o diagnóstico. A asma até pode não ser alérgica. Os pais preocupam-se excessivamente com as alergias, mas aceitam mal os verdadeiros diagnósti­cos das doenças alérgicas. Até os evitam! E assim não se pode resolver o problema», salienta Mário Morais de Almeida.

Texto: Cláudia Pinto
Revisão científica: Mário Morais de Almeida (presidente da SPAIC - Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica)