A doença renal crónica, caracterizada pela perda da função renal mantida no tempo, instala-se silenciosamente no organismo. Sem quaisquer sintomas, os rins perdem a capacidade de filtrar e de eliminar substâncias tóxicas oriundas do metabolismo. Esta alteração pode mesmo ter consequências graves a longo prazo. Em Portugal, surgem anualmente cerca de 2.500 casos em fase terminal, estimando-se que cerca de 800.000 portuguesas sofram desta patologia.

Fique a conhecer, de seguida, os principais quadros que podem surgir associados a esta doença:

- Hipertensão

Além de ser um fator de risco, é uma consequência comum da doença renal crónica, uma hipertensão de causa renal. "Um rim que deixa de filtrar leva à  acumulação de substâncias no organismo. Algumas têm um grau de toxicidade, como a ureia, que provoca náuseas e vómitos. Outras são simples, como a própria água. A hipertensão também ocorre graças à retenção de líquidos e de sal, pelo que há tendência para os pés e a zona à volta dos olhos incharem", refere.

- Problemas cardiovasculares

Podem causar doença renal crónica através da hipertensão, já que o rim é um dos órgãos que mais tem pequenos vasos. Além disso, "quando há uma doença vascular disseminada, podem surgir apertos na artéria renal que diminuem a irrigação. O rim começa a sofrer e a encolher [rim isquémico], levando a perda irreversível da sua função", descreve Jorge Dickson. Fruto da doença renal crónica, "há alterações  metabólicas que lesam as células vasculares", adverte.

E, nalguns casos, os medicamentos anti-hipertensores usados para tratar a doença renal fazem aumentar o potássio. "São um ião fundamental para o organismo mas, acima de certos níveis, constitituem um fator de risco gravíssimo para problemas de ritmo cardíaco", adverte, no entanto, este especialista. O ideal é seguir uma alimentação que previna os problemas do foro cardíaco, sem sal, gordura e açúcar, com um aporte regular de frutas e de vegetais.

- Hemorragias

A seguir aos problemas cardiovasculares, estas são uma das alterações que mais surgem em doentes renais crónicos. "Por exemplo, as gastrites ou as úlceras do tubo digestivo com perda de sangue tendem a surgir com mais frequência nestes pacientes porque têm as mucosas mais frágeis e a função das plaquetas [células do sangue que desempenham um papel fundamental no controlo da hemorragia] está diminuída", sublinha o nefrologista Jorge Dickson.

- Infeções

A doença renal crónica afeta o sistema imunológico e o organismo sofre infeções com  facilidade. Os doentes "também têm mais tumores que as outras pessoas, porque a depressão da imunidade aumenta o risco de cancro", sublinha ainda este nefrologista.

- As alterações do metabolismo fósforo-cálcio

À medida que o rim vai excretando menos, o fósforo vai-se acumulando, "o que se traduz em níveis de fósforo elevados no sangue, níveis de cálcio baixos e numa diminuição da produção de vitamina D", explica Jorge Dickson. Estas alterações "induzem respostas hormonais do organismo nem sempre adequadas e fazem deteriorar a qualidade do osso, podendo levar a diversos tipos de doença óssea, nalguns casos com expressão clínica severa", diz.

- Aumento do stresse oxidativo

Em muitas doenças renais, há um conjunto de agressões oxidativas que levam a  processos de inflamação local que, por sua vez, conduzem a uma proliferação reativa de células que acaba por ser patológica. "Este processo tem tendência para se  autorregenerar e, ao curar, muitas vezes leva à substituição de um tecido saudável e funcionante por um tecido cicatricial, que não tem função [fibrose]", explica. Esta situação é comum em doentes hipertensos e em diabéticos.

- Anemia

O rim fabrica uma hormona, a eritropoetina, que obriga a medula óssea a produzir glóbulos vermelhos. "Na doença renal crónica, esta hormona vai lentamente deixando de se produzir, levando à anemia", explica Jorge Dickson.

- Desnutrição

É outro dos principais quadros que podem surgir associados a esta patologia que afeta a vida de milhares em todo o mundo. Em fases avançadas de doença renal crónica, "a anemia e o aumento da ureia  promovem falta de apetite", alerta o nefrologista Jorge Dickson. Por outro lado, "à medida que a doença avança, o organismo entra num estado catabólico em que, em vez de armazenar proteínas e  gordura, começa a destruí-las", afirma ainda este especialista.

Texto: Rita Miguel com Jorge Dickson (nefrologista)