Existem coisas que nos mudam a vida, nos fazem mudar o caminho, e esta foi uma delas.

Vem aí o mês de agosto, o meu querido mês de agosto... Para mim passou a ter algo de transcendental, sofri uma perda enorme, mas tive o maior ganho da minha vida, será que Deus tira e dá na mesma medida? Há três anos publiquei um texto no meu blog denominado "24 de agosto" sobre a minha experiência acerca da perda gestacional.

De vez em quando leio aquilo e tenho tanto pena... não, pena não... não é um sentimento muito bom de se ter por alguém, talvez compaixão, daquela Bárbara naquela altura, pois para todos os efeitos eu não sabia mesmo se ia ser mãe algum dia e isso é tão desanimador e triste para alguém que tanto o deseja! A esperança é mesmo isso, saltar para a outra margem sem saber o que se vai encontrar do outro lado. Sim, a esperança e confiança é mesmo isso e o acreditar é tão difícil. Claro que depois de passarmos pelas coisas, parece tudo muito fácil e pensamos como duvidei? Claro que ia correr bem! Mas digo-vos que podia ter tudo para não correr e, em última análise, somos nós que decidimos as ações que tomamos e as suas consequências e temos que viver com elas, boas ou más.

Deixem-me dar-vos uma visão meia infantilizada e com humor da coisa: Deus tem um pote lá em cima com diversos males, e vai distribuindo por aqui e ali… “Tu aguentas um bocadinho mais disto” … São pequenas-grandes provas de vida, que nos fazem crescer e evoluir. Acredito na aprendizagem contínua nas passagens da vida e esta é uma delas: a energia catalisadora vai-nos fazendo evoluir e tornar-nos cada vez mais parte de um universo, de um todo holístico, como se de um regresso à "nave" mãe se tratasse...

É assoberbante, transformador até, quando olhamos para trás e vemos o percurso que percorremos. Eu tenho mesmo que escrever mais sobre isto para que possa inspirar igualmente outras pessoas a nunca desistirem dos seus sonhos, podem crer que ouvir experiências bem-sucedidas e doses de otimismo foi o meu maior ânimo.

Eu podia muito bem ter ficado por ali. Mas se tivesse ficado seria um ser humano muito mais pobre e incompleto, pois não teria comigo a luz da minha vida: o meu Pedro Lucas.

Como cronista de alma que sou, e humilde aspirante a poeta, prometo escrever mais sobre o assunto e tornar-me um motor para que germinem sementes de esperança noutros corações. Lembro-me de ser pequena e declamar Sophia, a minha eterna musa, em público e a plenos pulmões:

“Porque os outros se mascaram mas tu não

Porque os outros usam a virtude

Para comprar o que não tem perdão

Porque os outros têm medo mas tu não”

É certo. Coragem mulher, bola para a frente. Venham mais desafios, sempre, isso sim é viver.

Prosseguindo, preocupamo-nos tanto com as coisas mais práticas e ficamos tão ansiosos em fazer bem as coisas ou ter bons resultados (isto como em tudo na vida) que depois nos esquecemos do que experienciámos no processo, o que sentimos, como lidámos com as nossas emoções. Por exemplo, na educação e crescimento do meu filho: mais do que dar banho, mudar fraldas, fazer a sopa mais nutritiva do mundo ou conviver com as mais diversas e variadas birras, importante sim é a forma como lidamos com tudo. Isso e o impacto que tem nos nossos filhos se formos muito ansiosos ou receosos. E às vezes temos tanto medo e queremos tanto protegê-los que podemos cair no erro de dizer coisas exageradas (“não faças isso senão cai-te um braço”, ou na pior das hipóteses morres) e damos por nós a criar uma criança/futuro adulto com ansiedade debilitante, cheia de medos e inseguranças.

Atenção, o medo será sempre necessário, como tempero da vida (Q.B), como mecanismo de defesa e sobrevivência, mas mais uma vez não nos deixemos levar por ele, é inimigo da mudança e, em última instância, da concretização dos nossos objetivos e sonhos. Se me tivesse deixado levar pelo medo nunca seria mãe, profissional, praticante de qualquer coisa ou qualquer outro papel que implicasse mudança: resumindo, percorrer outros caminhos sem certeza do seu fim, tenho muito orgulho nisso.

Li há pouco tempo num prefácio de António Damásio, a respeito de um livro de Nuno Lobo Antunes: “Há no médico o desejo de ser santo, de ser maior. Mas na sua memória transporta, como um fardo, olhares, sons, cheiros e tudo o que o lembra de ser menor e imperfeito. Uma peregrinação interior em que a bailarina torce o pé, o saltador derruba a barra, o arquiteto se senta debaixo da abóbada, e no fim, ela desaba.” Eu torci o pé várias vezes, na realidade e metaforicamente falando, e levantei-me e continuei a dançar no palco da minha vida.

Sendo assim, e como se de agradecimentos numa tese de doutoramento se tratasse, sendo que esta tese é a da especialidade mais importante para mim, "a minha vida", nada seria possível se não fosse a minha família nuclear, o meu amor, a minha irmã e os meus pais, que estiveram sempre do meu lado, a sonhar, a cair e a levantarem-se comigo todas as vezes necessárias. E em breve, com muito orgulho e emoção, a iniciar o meu querido mês de agosto, que afinal de contas me devolveu o meu maior tesouro da vida, celebramos juntos os dois deliciosos aninhos do meu querubim de caracóis de ouro.