A propósito da cimeira da ONU sobre o clima, a chamada COP26, que decorre entre 31 de outubro e 12 de novembro em Glasgow, na Escócia, organizações ambientalistas portuguesas consideram que a adaptação a um planeta em mudança a longo prazo exige uma transformação que, disseram, não será difícil e terá até muitos benefícios.
O grupo ambientalista Climáximo, composto por jovens que têm protagonizado protestos mediáticos a favor de medidas de descarbonização, responde à questão remetendo para a campanha “Empregos pelo Clima”, um relatório de sua responsabilidade que preconiza a criação de 200 mil novos postos de trabalho que podem cortar as emissões de gases com efeito de estufa em entre 70% e 80% em 10 anos.
O documento propõe medidas/empregos na área das energias renováveis, nos transportes públicos (construir e reabilitar a ferrovia por exemplo), na requalificação de edifícios, na indústria (fabricar máquinas elétricas), na agricultura, na economia circular ou na floresta.
Mas para já, diz Inês Teles, representante do coletivo, citando um relatório recente de uma organização não-governamental, o que está a acontecer a nível global não é uma transição energética mas uma expansão energética.
Francisco Ferreira, presidente da organização ambientalista Zero, diz que "se é verdade que há custos envolvidos em termos de trabalhadores, também existem muitas oportunidades novas, e todos os estudos demonstram que, no geral, a transição verde gera emprego líquido”. É certo, acrescenta, que terá de haver políticas públicas apropriadas para o setor.
E na mesma linha Jorge Palmeirim, presidente da direção nacional da Liga para a Proteção da Natureza (LPN), é também otimista e disse à Lusa que a “visão catastrofista” que alguns propagam de que a resposta à crise climática implica o colapso da economia “é falsa”.
“A resposta tem de ser rápida e em grande escala, mas será sempre progressiva, dando às empresas tempo para se adaptarem, tirando partido das inúmeras oportunidades geradas pelo crescimento verde”, afirma.
No transporte, exemplifica, muitos meios serão substituídos por outros com menor pegada ambiental, que já existem, e as empresas estarão envolvidas nesta transição, que também garante a continuidade do emprego.
Jorge Palmeirim conclui que “na verdade, as soluções tecnológicas necessárias já existem, e o que verdadeiramente tem faltado é vontade política para as implementar, contrariando fortes interesses instalados, à escala necessária para resolver a crise climática”.
Catarina Grilo, diretora de conservação e políticas da Associação Natureza Portugal (ANP/WWF), que trabalha com a internacional World Wide Fund for Nature (WWF), diz que o futuro passa por apostar em soluções baseadas na natureza.
“Só trabalhando com a natureza, e não contra ela, podemos ter uma transição justa em que são criados mais empregos verdes do que os ´cinzentos´ que se perdem, ou seja empregos que sejam ambientalmente sustentáveis, socialmente úteis, e economicamente viáveis”, afirma.
E nas estratégias de longo prazo tem de estar também, acrescenta, a adaptação às alterações climáticas, pelo que a ANP/WWF apoia a implementação dos Planos Nacionais de Adaptação (PNA), especialmente dos países mais pobres, o mais tardar até 2022. Só que até julho deste ano, lamenta, apenas 24 países em desenvolvimento submeteram os seus PNA à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC, na sigla original).
E em Portugal que medidas de adaptação? Começar, diz Catarina Grilo, por remover açudes e barragens obsoletas. Depois transformar o sistema energético, reduzir o transporte individual, tornar os edifícios mais eficientes, não licenciar junto à linha de costa e em leito de cheia, repensar o uso da água, reorganizar a paisagem,
“Mas acima de tudo temos de consciencializar os nossos cidadãos e os nossos decisores de que já sentimos na pele as alterações climáticas, e que todos temos um papel a desempenhar na mitigação e adaptação”, disse.
Francisco Ferreira, presidente da Zero, parece continuar o raciocínio de Catarina Grilo, defendendo que a transformação da sociedade tem de começar pela mudança de paradigma de consumo e desperdício, acompanhada de políticas baseadas na ciência, na investigação e inovação.
E diz também que é fundamental o recurso a soluções tecnológicas ambientalmente mais benéficas, “que têm tendência a ser simultaneamente as mais baratas a prazo”. Os automóveis elétricos estarão, em preço, a par dos convencionais dentro de poucos anos, assegura Francisco Ferreira.
E diz ainda que é “crucial” antecipar a retirada dos combustíveis fósseis, porque muitos dos equipamentos têm um longo tempo de vida e é preciso intervir proibindo nomeadamente a venda de caldeiras a gás, eventualmente já em 2025.
Mas quando fala de adaptação Francisco Ferreira é taxativo, considerando que é sobretudo crítica nos países mais pobres, mais expostos, mais vulneráveis, e sem responsabilidade histórica pelas emissões de gases com efeito de estufa.
É por isso que na COP26 um “ponto absolutamente chave” é o do financiamento por parte dos países ricos destinado a cobrir os esforços de adaptação dos países pobres e vulneráveis às alterações climáticas, insiste o responsável.
Trata-se, garante, “de uma questão de justiça climática e de solidariedade entre povos, vitais para o sucesso (da cimeira climática) de Glasgow”.
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