No decorrer da minha prática profissional tenho tido contacto com clientes que, apesar de procurarem ajuda, se mostram resistentes ao processo terapêutico numa fase inicial. E a principal razão resume-se a uma palavra: medo. Por um lado, receiam expor as suas vulnerabilidades e, por outro, podem até nem saber quais são os medos que os estão a sabotar, por ainda não serem plenamente conscientes. Abrir a Caixa de Pandora de cada um pode ser fascinante, mas assustador também, sobretudo para quem já vem com uma ideia pré-definida (e muitas vezes errada), do que é a terapia.

Sabemos que o medo nos mantém vivos. Trata-se de uma resposta vital desenvolvida ao longo dos anos de evolução, face aos perigos reais ou percebidos. No entanto, existem dois tipos de medos: os racionais – que põem a nossa vida em risco e que nos fazem ativar a resposta de luta/fuga de uma forma saudável porque está a garantir a nossa sobrevivência – e os medos irracionais, que despoletam a mesma resposta de luta/fuga em relação a estímulos que não colocam verdadeiramente a nossa vida em perigo, mas que a mente faz acreditar que sim. E isto tanto se aplica a medos específicos (exemplos: medo de cobras, medo de balões, medo do escuro), como a medos cognitivos, por vezes inconscientes (exemplos: medo de falhar, medo de não ser suficiente, medo de não corresponder às expectativas, medo de não ser merecedor de ser feliz ou bem-sucedido).

A experiência de medo constante e disfuncional pode desencadear uma vastidão de problemas de saúde mental, que passam desde a dificuldade em relaxar, a elevados níveis de ansiedade, fobias, depressão, falta de confiança, até ao modo de sobrevivência constantemente ativado, o que acaba por desgastar a pessoa física e emocionalmente. É por essa razão que uma das estratégias terapêuticas, para grande parte dos quadros clínicos, passa por enfrentar os medos, pois neles residem crenças, esquemas mentais e comportamentos disfuncionais que causam prejuízo na pessoa. Ao trabalharmos sobre os medos, trabalhamos em todas as dimensões da Terapia Cognitivo-Comportamental (pensamentos, emoções e comportamentos).

Como lidar com os medos em terapia

1. Reconhecimento dos medos existentes. Os medos racionais são sempre repentinos. Eles são como a sensação que temos quando, de repente, olhamos para o chão e vemos um buraco do qual temos que nos desviar para não cairmos, ou quando alguém está atrás da porta e nos assusta. A resposta é imediata. No entanto, na atualidade, a maioria dos nossos medos não são racionais e, por consequência, não causam respostas emocionais rápidas, mas sim níveis de ansiedade elevados e constantes. Analogamente, é como se estivéssemos com uma dor de cabeça depois de um longo dia de trabalho. Na maioria das vezes, não sabemos o que causou a dor de cabeça, mas sentimo-la fortemente. O mesmo acontece com os medos. Temos medos que são difíceis de enfrentar porque nem sabemos ainda quais são; no entanto, sentimos níveis de ansiedade elevados de forma constante, o que significa que quanto mais ansiedade e stresse sentimos, mais medos inconscientes podemos ter. Em terapia, existem técnicas específicas para identificá-los. 

2. Fisiologia e Desconstrução Cognitiva. Depois dos medos identificados, há que entendê-los e superá-los. Para isso, é necessário um trabalho conjunto entre o psicólogo e o cliente, onde é desenvolvido um plano de intervenção personalizado que ajuda o cliente a entender as respostas fisiológicas do medo, assim como as respostas emocionais e cognitivas. A partir daqui, são usadas técnicas validadas cientificamente para o processo de desconstrução cognitiva. Uma delas, a título de exemplo, é o uso da imaginação. Já pensou que a nossa imaginação, através dos olhos dos nossos medos, exagera o que pensamos e exagera os resultados negativos? Da mesma forma, podemos usar a imaginação para exagerar os resultados positivos. Não raras vezes, ouço clientes dizerem “não consigo fingir coisas que não são reais”, mas na realidade não está a fingir exatamente a mesma coisa com os seus medos?  Eles também não são reais e, no entanto, está a acreditar neles. Por que não mudar o prisma, então?

3. Enganar a mente através da ação. Depois de todas as técnicas aprendidas, chega o momento em que é necessária ação da sua parte. É necessário expor-se aos seus medos e sair gradualmente da sua zona de conforto. Infelizmente, este passo é algo que a maioria das pessoas nunca vai fazer, passando as suas vidas limitadas pelos medos irracionais, encontrando conforto naquilo que lhes é familiar – mesmo que isso signifique nunca evoluir. Se o leitor quer ficar acomodado, então não precisa de fazer terapia. Mas se quer sentir-se vivo, feliz e viver sua vida ao máximo, então precisa enfrentar os seus medos e resolvê-los com ajuda profissional. O ato de enfrentar os seus medos não é uma mera opinião ou sugestão: é um dos princípios básico da terapia.

Procure um profissional qualificado. A sua saúde mental agradece e a sua qualidade de vida incrementará, como consequência.