Já reparou que, sempre que entra num jardim ou num parque urbano ou passeia por uma qualquer paragem natural e encontra um pequeno espelho de água, para quase sempre para o apreciar melhor? Além de ser fundamental para a vida na terra, a água tem esse dom. Atrai! Atrai não só a atenção do homem como também a panóplia de bichos e plantas que nela vivem. Se quiser criar mais um ponto de atração no seu jardim e contribuir para a biodiversidade, então considere fazer um pequeno charco.
De todas as ações que pode fazer em prol da fauna e da flora, esta é, porventura, a mais importante que pode concretizar. Se o charco for bem desenhado e executado com planeamento e rigor, cedo se tornará um pequeno paraíso para uma miríade de animais e plantas, um microcosmos do mundo natural, com predadores e decompositores, herbívoros, algas e variedades botânicas. Seres vivos que irão proporcionar muitas horas de observação e descoberta para toda a família, mesmo à saída de casa.
Sejam os girinos em desenvolvimento, os diferentes e estranhos insetos que vivem na água ou ainda os movimentos cómicos dos pássaros que se vão banhar num quente dia de verão. Para fazer um charco, terá, primeiro, de escolher um local no seu jardim. O ideal é um canto solarengo, afastado de árvores grandes, por causa das folhas mortas e das raízes, que poderão perfurar o plástico impermeabilizador usado no processo de construção. E, se possível, com uma linha de visão boa desde a sua janela, para poder observar atentamente o que lá se vai passando de dentro de sua casa.
Uma vez escolhida a área do charco, retire toda a manta morta do terreno e marque a forma, definindo as dimensões finais, com uma corda atada a pedaços de madeira espetados no chão. Escave, depois, um buraco. Lembre-se que este terá de ser ligeiramente maior do que a forma final do seu charco. Já vai perceber porquê! Ponha, depois, a terra num canto do jardim. Poderá utilizar alguma dela para refazer as margens ou até para criar uma pequena ilha, caso o seu charco tenha dimensões razoáveis.
Quando estiver a escavar, não se esqueça de criar um perfil de profundidade que garanta margens com zonas de pouca profundeza. Deposite, depois, uma camada de jornais velhos, de areia e/ou uma carpete velha sobre a cova, para proteger o plástico impermeabilizador que elegeu para a obra. Deve evitar que seja perfurado por baixo. Sobre os jornais, a areia ou a carpete, coloque uma camada de folha de plástico impermeabilizadora (polietileno) e prenda-a nas margens com pesos. Pode usarpedras.
A fórmula que deve usar para determinar as dimensões do charco
Para calcular a quantidade de plástico que precisa, utilize a seguinte fórmula:
comprimento – (comprimento do charco mais o dobro da profundidade) + 10%; largura – (largura do charco + dobro da profundidade) + 10%
Por exemplo, se quiser fazer um charco com 2x3 metros e 0,50 centímetros de profundidade, precisará de uma folha de plástico de 3,30 metros por 4,40 metros. A quantidade desse material deverá ultrapassar um pouco as margens projetadas do seu charco. Não estique demasiado o plástico impermeabilizador quando o colocar. Deposite, depois, uma fina camada de areia ou terra, para evitar estragos devido à exposição solar direta. Mantenha os pesos nas margens para que o plástico estabilize.
Encha, seguidamente, o seu charco com água ou, melhor ainda, deixe que a chuva do inverno, da primavera ou do outono o vá preenchendo aos poucos. Assim que o seu novo reservatório de água estiver cheio e o plástico estabilizado, pode retirar os pesos e tapar as margens do plástico com terra, para fazer as tais margens suaves. Com o passar do tempo, começarão a surgir naturalmente algumas variedades botânicas expontâneas. Se preferir, pode lançar para lá umas sementes de relva.
Outras regras a observar
Quanto maior for o seu charco, mais rico será em fauna e flora. As rãs podem viver num reservatório deste género com apenas um metro quadrado, mas outras espécies de anfíbios requerem, pelo menos, 15 metros quadrados de habitat para o fazer, dimensão já suficiente para atrair um casal de galinhas-de-água, se à volta do charco existir habitat palustre adequado. A forma do charco e o que existe à sua volta também irão influenciar o tipo de animais e plantas que nele poderão viver.
Em geral, quanto mais extensas e variadas forem as margens, melhor será este para a biodiversidade. Por isso, tente construir o seu charco com forma irregular e com margens com pequena inclinação para que os animais possam chegar à água sem cair ao charco. É nessas margens com pequena profundidade que as aves irão beber e que as rãs irão pôr os seus ovos, em média a uma profundidade de 10 centímetros, entre plantas subaquáticas. Para além das zonas pouco profundas na margem, o ideal seria fazer um charco com cerca de meio metro de profundidade, como recomendam os especialistas.
Assim, muitos insetos e anfíbios poderão esconder-se dos predadores e aumentar a diversidade dos habitats e, consequentemente, da fauna existentes. Os tritões, por exemplo, geralmente precisam apenas de 30 centímetros de profundidade para pôr ovos, pelo que não se exige uma grande profundidade. Mas, atenção, tal como as piscinas, os charcos, sem vigilância, podem ser muito perigosos para crianças pequenas e bebés. Tenha sempre este fator em consideração quando estiver a planear construir um.
Texto: José Pedro Tavares (membro da Royal Society for the Protection of Birds, BirdLife no Reino Unido, organização parceira da SPEA, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves)
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