No Dia Internacional dos Ensaios Clínicos, assinalado recentemente, não celebramos apenas o papel essencial da investigação clínica no desenvolvimento de novas vacinas e terapêuticas, mas, também, a revolução silenciosa que está a transformar este processo: a Inteligência Artificial (IA). Esta tecnologia está a redefinir a forma como desenhamos, conduzimos e monitorizamos ensaios clínicos, tornando-os mais rápidos, eficazes e inclusivos.

Portugal tem vindo a afirmar-se como um polo emergente de inovação clínica, com talento científico de excelência e infraestruturas de investigação de ponta. No entanto, o número de ensaios clínicos per capita ainda está aquém de países como a Bélgica, República Checa e Espanha, falta financiamento público estruturado e a investigação clínica a nível hospitalar está subaproveitada, uma realidade que muito contribui para limitar o acesso a terapêuticas inovadoras e que compromete o pleno aproveitamento do potencial nacional.

Neste contexto, a IA surge como uma ferramenta transformadora e catalisadora. Com um ecossistema colaborativo já existente — entre universidades, centros de investigação, start-ups e indústria farmacêutica — a integração da IA representa um fator impulsionador para aumentar a atratividade de Portugal como destino para ensaios clínicos internacionais, gerar poupanças significativas para o Serviço Nacional de Saúde, atrair investimento direto estrangeiro em saúde digital e biotecnologia, e reduzir desigualdades no acesso à inovação terapêutica.

Em 2025, é impossível falar de inovação em saúde sem reconhecer o impacto crescente da IA em todas as fases do desenvolvimento de vacinas e medicamentos — da descoberta à monitorização pós-comercialização. Esta tecnologia permite analisar grandes volumes de dados clínicos e do mundo real, otimizando o desenho dos ensaios, a seleção de participantes e a eficiência operacional, incluindo em modelos descentralizados e com tecnologias digitais de saúde.

Além de acelerar processos, a IA contribui para ensaios mais inclusivos e personalizados, ajudando a prever respostas a tratamentos, identificar riscos, melhorar a adesão e até antecipar eventos adversos. Também tem um papel crucial na promoção da diversidade, ao orientar estratégias de recrutamento e retenção mais eficazes, garantindo que os ensaios refletem melhor a realidade da população.

A IA está também a potenciar áreas-chave dos ensaios clínicos em Portugal. Permite, por exemplo, otimizar a seleção de participantes através da análise de grandes volumes de dados clínicos e genómicos, reduzindo o tempo e os custos associados ao recrutamento. Melhora a monitorização e análise de dados em tempo real, antecipando efeitos adversos e aumentando a segurança dos participantes. Acelera a investigação translacional ao integrar dados de múltiplas fontes — como biobancos, registos eletrónicos de saúde e literatura científica — e automatiza tarefas administrativas, libertando recursos para áreas críticas. Adicionalmente, apoia a decisão clínica, permitindo aplicar os resultados dos ensaios de forma mais eficaz e personalizada, com impacto direto na melhoria dos cuidados de saúde.

Apesar dos desafios — como o viés nos dados, a transparência dos modelos e a sua degradação ao longo do tempo — os benefícios da IA são inegáveis. Está a tornar os ensaios clínicos mais acessíveis e centrados no doente, alinhando-se com a definição da Organização Mundial da Saúde de inovação em saúde: melhorar a eficácia, a segurança e a sustentabilidade dos cuidados, especialmente onde os recursos são escassos.

A propósito do Dia Internacional dos Ensaios Clínicos, reafirmamos o nosso compromisso com a investigação clínica e com um futuro onde a inovação, impulsionada pela IA e pela colaboração, está ao serviço da saúde humana. Um futuro onde os ensaios clínicos, cada vez mais eficientes e inclusivos, continuam a ser a chave para desbloquear novas vacinas e terapêuticas e melhorar a vida de milhões de pessoas em todo o mundo.

Um artigo de Duarte Mesquita, Country Medical Lead Sanofi Portugal.