O que é a epilepsia?
A epilepsia é uma doença neurológica caracterizada pela existência de uma predisposição mantida do cérebro para a ocorrência de crises epilépticas. As crises epilépticas são perturbações transitórias do funcionamento normal do cérebro ou, mais frequentemente, de parte dele, e são geradas por uma descarga anormal dos neurónios cerebrais. Dependendo da localização cerebral dessa descarga, diferentes sintomas e sinais neurológicos transitórios podem surgir. Se, por exemplo, a crise epilética tiver origem numa área cerebral que é responsável pelo processamento visual, a pessoa pode ter uma alucinação visual. Se for a área responsável pela função motora que é ativada, poderão surgir tremores dos braços, da face ou das pernas ou posições fixas (posturas distónicas).
Todas as funções que sabemos que têm representação no córtex cerebral podem manifestar-se em crises epiléticas. Por exemplo, sentimentos de medo, tristeza, riso, sensações de dor ou choque elétrico, ouvir sons ou músicas, falar, mastigar ou mesmo ficar com “pele de galinha”. Quando a crise epilética afeta áreas cerebrais mais extensas e áreas que controlam a nossa consciência, a pessoa perde a noção do que está a fazer, do meio que a rodeia, não interage com os outros e não se recorda do que aconteceu depois de a crise ter terminado. A crise epilética mais conhecida é a crise tónico-clónica generalizada (“convulsão”). Este tipo de epilepsia resulta de uma ativação cerebral que afeta o cérebro todo e é por isso chamada de crise epiléptica generalizada.
A epilepsia é uma doença comum?
A epilepsia é uma das doenças neurológicas com maior prevalência, calculando-se -que cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo tenham epilepsia. Em Portugal, foi estimado que existam 4 a 7 pessoas com epilepsia por cada mil habitantes.
A epilepsia pode surgir em qualquer idade, mas existem 2 grandes picos de incidência – na infância e no idoso.
Porque que é que se desenvolve epilepsia?
As causas principais da epilepsia variam com a idade e nem sempre é possível identificar a causa de todas as epilepsias. Dentro das causas identificáveis distinguem-se as causas genéticas, as infeciosas, as metabólicas, as imunológicas e as estruturais. Neste último caso, existe uma lesão identificável no cérebro, como por exemplo uma anomalia do desenvolvimento cerebral, um acidente vascular cerebral, uma cicatriz relacionada por exemplo com um traumatismo craniano, ou um tumor.
Como deve ser tratada uma pessoa com epilepsia?
A maioria dos doentes com epilepsia consegue controlar a sua doença com tratamento médico, isto é, com os chamados fármacos anti-epilépticos (FAE). Existem ainda outras alternativas terapêuticas, incluindo alguns tipos de dieta e várias técnicas cirúrgicas e de modulação dos circuitos elétricos cerebrais, que em geral estão reservadas para os casos que não respondem ao tratamento com os FAE.
A epilepsia é uma doença grave?
Existem muitos tipos de epilepsia, com gravidade e evolução variável. Algumas formas de epilepsia, sobretudo na infância, evoluem com lesão cerebral progressiva (encefalopatias epilépticas). Contudo, há muitas outras formas de epilepsia (aproximadamente 2/3 das pessoas com epilepsia), que ficam bem controladas com apenas 1 FAE.
Ter epilepsia não é apenas ter crises epilépticas. As pessoas com epilepsia têm muitas vezes outros problemas de saúde (co-morbilidades), por exemplo perturbações de ansiedade e outras patologias psiquiátricas, dificuldades de memória e outras alterações cognitivas. É, também, uma patologia que tem um importante estigma social e profissional. Uma das limitações importantes para as pessoas com epilepsia é a limitação da condução. As limitações dependem do tipo de carta de condução, do controlo da epilepsia e estabilidade dos FAE.
A avaliação destes vários problemas pela equipa de saúde que acompanha a pessoa e a integração em grupos de pessoas com epilepsia pode ajudar a suplantar estas dificuldades.
Como deve atuar se estiver próximo de uma pessoa com uma crise epilética?
Assistir a uma crise epilética pela primeira vez, sobretudo se for uma crise epilética tónico-clónica generalizada (“convulsão”), pode ser muito assustador. Mantenha a calma. O cérebro tem mecanismos para abortar a crise epiléptica e consegue-o na maioria das crises. Deve ter duas principais preocupações:
1) Proteger a pessoa de lesões - se for uma “convulsão”, deite a pessoa no chão ou numa cama, espere que os movimentos passem e depois deixe a pessoa recuperar deitada de lado (na chamada posição lateral de segurança). Retire das proximidades ou das mãos da pessoa qualquer objeto com que se possa magoar. Acompanhe a pessoa até recuperar os sentidos. A crises em que há perturbação da consciência têm habitualmente um período depois da crise, cerca de 10-15 minutos, em que a pessoa está prostrada, confusa, sonolenta. Aguarde junto à pessoa até que esta recupere totalmente. Se este período depois da crise (pós-crítico) se tornar muito duradouro, a pessoa deve ser avaliada num hospital.
Atitudes que não deve tomar
- Colocar objetos na boca
- Tentar parar os movimentos
- Tentar dar água ou outro alimento
2) Tentar contar o tempo que dura a crise - uma crise epiléptica não dura mais de 5 minutos. Se a crise durar mais de 5 minutos peça ajuda e chame o INEM.
Um artigo das médicas Ana Catarina Franco, Carla Bentes e Ana Rita Peralta, especialistas em Neurologia a exercer funções no Laboratório de EEG/Sono – Unidade de Monitorização Neurofisiológica, no Centro de Referência para Epilepsias Refratárias, membro do EpiCARE, no Hospital de Santa Maria – Centro Hospitalar e Universitário Lisboa Norte e na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
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