No relatório global sobre prevenção da violência contra crianças, hoje divulgado em Genebra, analisam-se dados de 155 países e conclui-se que embora 88% deles tenham leis para proteger as crianças, em mais de metade (53%), estão praticamente só no papel, faltando dinheiro ou estruturas para as fazer aplicar.
Nos números compilados no relatório, estima-se ainda que 40.150 crianças (entre os zero e os 17 anos) são assassinadas anualmente em todo mundo, a maioria rapazes (28.160), com maior taxa de homicídios de crianças por 100.000 habitantes - 5,8 para ambos os sexos -, bem acima da média mundial, que é de 1,7 por 100.000 habitantes.
“Nunca há desculpa para exercer violência sobre crianças”, afirmou o diretor geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Ghebreyesus, apelando a todos os países para “protegerem a saúde e o bem-estar das crianças” na apresentação do relatório, feito em conjunto com a Unicef e a Unesco.
No relatório, reconhece-se que o número de crianças sujeitas a violência no ano passado é incerto mas “a melhor estimativa é mil milhões de crianças entre os 2 e os 17 anos”, ou seja, metade das crianças do mundo.
Quase três quartos das crianças entre os 2 e os 4 anos (300 milhões) são regularmente sujeitas a castigos físicos ou violência psicológica às mãos dos seus pais ou cuidadores e um quarto das crianças com menos de 5 anos vive com uma mãe sujeita a violência doméstica.
No que toca à violência sexual, estima-se que em todo o mundo, 120 milhões de meninas e raparigas com menos de 20 anos já sofreram um qualquer contacto sexual forçado.
Na escola, um terço dos alunos entre os 11 e os 15 anos afirma ter sofrido uma forma de ‘bullying’.
Quanto às consequências a longo prazo, as agências da ONU afirmam que os abusos sexuais, físicos ou psicológicos aumentam 30 vezes a probabilidade de se cometer suicídio em adulto e sete vezes a probabilidade de se estar numa relação íntima com violência, quer como vítima quer como agressor.
Os abusos físicos ou sexuais sofridos na infância fazem aumentar em 14 vezes a probabilidade de os homens serem agressores sexuais e 16 vezes a probabilidade de as mulheres sofrerem esse tipo de abusos.
No relatório, estima-se ainda que as consequências para a vida da violência sofrida durante a infância tenham um custo económico anual de 228 mil milhões de dólares, só nos Estados Unidos.
As agências da ONU olharam para mais de 300 estudos publicados entre 2000 e 2017 e concluíram que os abusos sexuais têm uma prevalência média de 14% entre meninas europeias e 20% entre meninas norte-americanas.
Quanto aos meninos, 06% dos europeus e 14% dos norte-americanos sofreram abusos sexuais.
A prevalência de violência física é maior no continente africano, afetando 60% dos rapazes e 51% das raparigas.
Quanto à violência psicológica, afeta 28% das meninas e 14% dos meninos no continente americano, 13% das meninas e 06% dos meninos na Europa.
Embora 80% dos países analisados tenha planos e políticas nacionais para prevenir a violência sobre crianças, só um quinto tem financiamento para as aplicar ou metas tangíveis: “a falta de fundos e de capacidade profissional são provavelmente os fatores que contribuem para a aplicação lenta” desses programas, consideram as agências da ONU.
Entre 32 e 37% dos países concedem às crianças vítimas de violência acesso a serviços de apoio, e embora haja dados sobre violência infantil, só em 21% é que esses dados estão na base de metas nacionais a atingir sobre o assunto.
Na sua análise a Portugal, o relatório indica que há sete setores do governo com responsabilidade na questão da violência infantil.
As agências recomendam aos governos que exista “uma agência com recursos adequados e um mandato explícito para coordenar a ação multissetorial para acabar com a violência sobre crianças”.
Recomendam ainda que as crianças tenham “proteção legal universal” na legislação de cada país, notando que embora haja leis dirigidas a fatores de risco como o acesso a armas de fogo e abuso de álcool, costuma faltar-lhes “qualidade e aplicação adequada”.
“É necessária uma ação global para garantir que todos os países têm acesso ao apoio financeiro e técnico de que precisam. A monitorização e avaliação são cruciais para determinar até que ponto os esforços de prevenção chegam a quem deles precisa”, recomenda-se no documento.
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