“O aumento da privatização dos serviços de saúde em Inglaterra entre 2013 e 2020 esteve ligado a taxas mais elevadas de mortalidade por causas tratáveis — mortes consideradas evitáveis com cuidados de saúde oportunos e eficazes — indicando uma diminuição da qualidade dos cuidados de saúde durante esse período”, adiantam as conclusões da investigação.
Este estudo analisou os efeitos da Lei de Saúde e Assistência Social de 2012, que levou a um aumento constante até 2020 da externalização de funções do Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS, na sigla em inglês) a empresas com fins lucrativos do setor.
“O aumento das privatizações foi associado a taxas mais elevadas de mortalidade tratável, com as alterações ao ‘outsourcing’ potencialmente ligadas a mais 557 mortes evitáveis em Inglaterra durante o período de estudo”, referem as conclusões.
De acordo com a revista científica, os autores analisaram um conjunto de dados que mostra quanto cada conselho regional de saúde gastou em ‘outsourcing’ entre 2013 e 2020, após a entrada em vigor da reforma do NHS.
As alterações à qualidade dos serviços de saúde foram determinadas através de uma análise estatística que avaliou a associação entre o ‘outsourcing’ e a mortalidade por causas tratáveis, um indicador considerado essencial para aferir a eficácia das intervenções em tempo oportuno dos cuidados de saúde.
Segundo o artigo publicado na Lancet Public Health, uma análise mais aprofundada permitiu ainda estabelecer a relação entre a privatização dos serviços e mortalidade evitável — mortes principalmente evitáveis com uma saúde pública eficaz.
A análise sugere que os níveis globais de ‘outsourcing’ em Inglaterra aumentaram consistentemente a partir de 2013, subindo de menos de 4% para mais de 6% do total dos gastos do conselho regional de saúde em 2020.
No total, foram gastos 11,5 mil milhões de libras (cerca de 13,3 mil milhões de euros) a subcontratar serviços de saúde ao setor privado durante esse período, com o montante a variar consideravelmente em cada conselho de saúde.
“A análise estatística revelou que um aumento anual da despesa com ‘outsourcing’ de 1% está associado a um aumento da mortalidade tratável de 0,38% (0,29 mortes por 100.000 habitantes) no ano seguinte”, refere o estudo.
Com base nas alterações observadas nos gastos de contratação de serviços a privados e nas mortes tratáveis para cada conselho de saúde, a “análise mostra que 557 mortes adicionais entre 2014 e 2020 podem ser atribuídas a mudanças no ‘outsourcing'”.
“Estes resultados têm claramente implicações para o debate sobre privatizações do NHS, sugerindo que o aumento do ‘outsourcing’ para o setor privado poderia levar a uma diminuição da qualidade dos cuidados prestados aos pacientes”, salientou Aaron Reeves, investigador da Universidade de Oxford e um dos autores do estudo.
De acordo com Aaron Reeves, embora sejam necessárias mais investigações para determinar as causas exatas da diminuição da qualidade dos cuidados de saúde em Inglaterra, as conclusões do estudo “sugerem que mais privatizações do NHS seriam um erro”.
Os autores reconhecem algumas limitações ao seu estudo e salientam que os resultados não constituem prova de uma relação causal entre as taxas de subcontratação e de mortalidade, pelo que não se pode excluir que outros fatores possam também estar associados.
Andrew Street, da London School of Economics and Political Science, alerta que comprometer a qualidade pode ser “uma via mais rápida para obter lucros” pelo setor privado, o que pode ser evitado através de contratos que espelhem as normas da qualidade dos serviços e um controlo rigoroso do desempenho.
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