O tema da saúde mental em Portugal tem interessado apenas às pessoas que sofrem desta complexa doença, às famílias, a alguns amigos e a muitos profissionais de psiquiatria e saúde mental que se ocupam de pessoas com doença mental, ouvindo as queixas sobre os serviços de saúde que não têm, o emprego que desejam, as dificuldades financeiras, o isolamento e o estigma que frequentemente vivenciam.
Entre nós, portugueses, uma em cada cinco pessoas (22,9%) está em risco de sofrer uma vez na vida de uma perturbação mental de que necessitará de cuidados médicos de psiquiatria. O suicídio, enquanto consequência máxima das doenças mentais, é responsável pela morte de uma pessoa a cada 40 segundos e é a segunda causa mais comum de mortalidade em todo o mundo, entre os jovens dos 15 a 29 anos (OMS, 2013).
Para dar resposta às necessidades das pessoas com doença mental, teremos que pensar nos serviços de saúde destinados a distúrbios mentais comuns (ansiedade e depressão); distúrbios mentais graves (esquizofrenia e doença bipolar); distúrbios alimentares, (anorexia nervosa, bulimia); demências, nos quais se inclui a doença de Alzheimer, e a doença mental da infância e adolescência.
Em tese, os modelos da organização defendem que a prestação de cuidados seja feita de um modo prioritário a nível da comunidade, num meio menos restritivo possível, com serviços integrados nos hospitais gerais, com estruturas de reabilitação/ inserção psicossocial de proximidade e unidades residenciais adequadas ao grau específico de autonomia de cada pessoa.
Em 2007, elaborou-se o Plano Nacional de Saúde Mental – PNSM- (2007-16 e agora 2017-2020), que ditava um conjunto de princípios, como o Clínico Geral faria o diagnóstico e o tratamento da doença psiquiátrica de menor gravidade, assim como o acompanhamento médico do doente com doença mental de evolução prolongada estabilizado (Esquizofrenia nas suas diversas formas e a Doença Bipolar), e referenciava para os serviços especializados hospitalares os casos mais "complexos".
Este mesmo Hospital Geral, trataria as pessoas com doença mental mais "complexa", ficaria também responsável pela criação de serviços e programas de tratamento e reabilitação/inserção. Esta visão é construída na base de que a pessoa com doença mental só necessita que lhe prescrevem os medicamentos, a maior parte das situações seriam tratadas no Centro de Saúde e o doente e a família fazem tudo o resto.
Os princípios acima referidos demonstram uma total ausência de decisão política. Tudo isto tem sido decidido e vertido em sucessivos planos que se transformam em meras sugestões por não serem minimamente cumpridos. Fazem-se relatórios com o ponto de situação e respetivas recomendações e todos apontam para as mesmas conclusões: "Escasso grau de autonomia e de capacidade de decisão da estrutura responsável pela implementação do Plano Nacional de Saúde Mental, reduzida autonomia dos centros de decisão a nível local, modelo de financiamento e gestão inadequados às necessidades específicas do setor, dificuldades no desenvolvimento de modelos formais de articulação com os cuidados de saúde primários e débil implementação da Rede de Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental".
Tratar a pessoa com doença mental grave exige conhecimento, estruturas e o reconhecimento político de uma realidade da saúde que tem sido votada ao total desprezo porque não tem peso político (22,9% da população) mas de grande dano para as pessoas.
Pede-se responsabilidade governativa de dizer apenas o que realmente vai ser feito, de fazer o que escrevem e, de uma vez por todas, colocar como ideologia apenas a humanista, com um claro sentido clínico em que a pessoa com doença mental é posta no centro das decisões.
Tenho esquizofrenia e agora? É um assunto sem "importância".
Um artigo de opinião da médica Lurdes Santos, especialista em Psiquiatra, adjunta da Direcção do Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus.
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