O conceito FODMAP surgiu em 2004 na Universidade Monash, na Austrália. É o acrónimo inglês das palavras fermentable oligo, di, mono-saccharides, and e polyols. Designa, como explica o nutricionista Fábio Cardoso, "um conjunto de hidratos de carbono de cadeia curta e álcoois de açucares, oligossacarídeos [frutanos e galactanos], dissacarídeos [lactose], monossacarídeos [frutose] e polióis [incluindo o manitol e o sorbitol] frequentemente mal absorvidos", esclarece o especialista.

Extensamente fermentescíveis, estes carboidratos fermentam ao nível intestinal, "podendo desencadear sintomatologia gastrointestinal funcional específica", explica ainda. Encontrá-los é fácil. Os FODMAP encontram-se disseminados "por todos os grupos de alimentos da roda da alimentação mediterrânica, à exceção do grupo das gorduras e do da carne, do pescado e dos ovos, quando estes não sofrem qualquer tipo de processamento e/ou transformação", sublinha o nutricionista.

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Tal sucede porque, apesar de estes componentes se encontrarem naturalmente nos alimentos, "também podem ser artificialmente adicionados aquando do seu processamento", acrescenta ainda, em jeito de alerta, Fábio Cardoso. Os FODMAP têm, na realidade, um conjunto de caraterísticas comuns, "o que lhes confere um elevado potencial desencadeador de sintomatologia gastrointestinal funcional, como a baixa taxa de absorção intestinal, em consequência de existir uma atividade diminuída das enzimas envolvidas na sua digestão e/ou pela própria inexistência de enzimas humanas necessárias a essa digestão", refere o especialista. O elevado efeito osmótico é outra das possíveis consequências.

"Como resultado da sua baixa absorção intestinal e do reduzido tamanho molecular, [o organismo] gera um gradiente de concentração, com a consequente movimentação de água para o lúmen [o espaço interior dentro do tubo] intestinal e [espoleta] uma rápida fermentação pela microbiota, potenciada pelo tamanho molecular reduzido, o que acelera o processo", explica o nutricionista. Nas últimas décadas, os dados recolhidos sugerem que este(s) problema(s) tenha(m) vindo a atingir mais pessoas.

Também contribuem para esta intolerância "fatores individuais relacionados com a composição e a capacidade de metabolização da microbiota, a coexistência de patologias digestivas e/ou absortivas e a existência de uma hipersensibilidade visceral de base", elucida ainda. Os efeitos no organismo também têm vindo a ser estudados. "Os FODMAP apenas desencadeiam sintomas gastrointestinais funcionais em indivíduos suscetíveis e com algum tipo de hipersensibilidade visceral", garante o médico.

Nestes, o consumo de alimentos ricos nestes componentes leva "à ocorrência frequente de alterações na motilidade intestinal, distensão e dor abdominal", salienta Fábio Cardoso. Os FODMAP não são, contudo, moléculas prejudiciais ao organismo. Pelo contrário. Existem subgrupos que atuam como prebióticos. "Estimulam uma proliferação seletiva de determinadas estirpes de microrganismos que exercem efeitos benéficos na saúde do hospedeiro", tranquiliza o especialista.

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"Não devem ser restringidos na alimentação de indivíduos que não sofram de sintomatologia gastrointestinal funcional associada ao seu consumo", adverte o nutricionista. "Deve procurar ajuda sempre que se verifiquem sintomas gastrointestinais funcionais», indica Fábio Cardoso. Meteorismo (acumulação de gases), dor, desconforto e/ou distensão abdominal e/ou alterações da motilidade intestinal (diarreia e/ou obstipação) são as manifestações mais comuns e é a essas que deve prestar particular atenção. "Nestas situações, deve-se recorrer tanto a um gastrenterologista, para se estabelecer um diagnóstico e realizar um acompanhamento clínico do doente, como a um nutricionista, para se planear e instituir a terapêutica nutricional e alimentar mais adequada à condição clínica diagnosticada", defende.

"Posteriormente, este deve fazer um acompanhamento e monitorização periódica do estado nutricional do individuo", explica o nutricionista. O diagnóstico é simples. "Atualmente, a forma mais exequível e económica de se determinar a existência de uma intolerância aos FODMAP é através do recurso a testes de provocação oral", esclarece Fábio Cardoso. "São usados alimentos específicos ricos num subgrupo de FODMAP a testar e numa quantidade teoricamente suficiente", elucida.

"A ideia é espoletar sintomas gastrointestinais, aquando da existência de uma suscetibilidade no indivíduo", acrescenta ainda este profissional de saúde. No entanto, há outra forma de determinar e/ou corroborar a ocorrência de intolerância a um ou mais subgrupos de FODMAP. "É também possível obter essa informação através da realização de testes respiratórios de hidrogénio/metano", informa o nutricionista. Uma dieta restritiva pode ser a solução. A decisão é do(s) médico(s).

As situações que exigem uma dieta

Mudar a alimentação é uma das formas de combater o problema. "Existe a evidência para a aplicação de uma dieta restrita em FODMAP no controlo da síndrome do intestino irritável", afirma o nutricionista. "A sua aplicação poderá estar indicada no alívio da sintomatologia gastrointestinal funcional nas doenças inflamatórias intestinais, fibromialgia, endometriose e diarreia, distensão e/ou obstipação funcional", refere. A restrição de FODMAP é uma forma de tratamento do problema.

"Naquelas cuja restrição não é suficiente, poderá ser equacionado o uso de outras terapêuticas, nomeadamente medicamentosa, cognitivo-comportamental e/ou o uso de probióticos", adverte ainda o nutricionista. A informação que existe hoje ainda não é muita. "Apenas se sabe que a restrição na quantidade de FODMAP ingerida permite reduzir a carga osmótica e os níveis de fermentação ao nível do cólon, conseguindo-se com isso controlar, no imediato, a sintomatologia gastrointestinal", diz.

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Em paralelo, tem sido especulado que a restrição do seu consumo possa provocar uma modificação mais duradoura na composição da microbiota intestinal, "intimamente envolvida na sua fermentação e na produção de gases, como o hidrogénio e o metano", avança o especialista. "No entanto, ainda não se sabe concretamente qual a extensão e as reais consequências dessa modificação", clarifica, no entanto, o nutricionista. E no caso do doente não poder fazer dieta? Esta é outra das dúvidas muito comuns. Pelas características restritivas e pela proibição do consumo de um grande número de alimentos processados, uma dieta restrita em FODMAP "conduz a uma redução no aporte energético total, tornando-a aliciante para quem deseja perder peso", sublinha.

Contudo, o objetivo da redução ponderal "não deverá justificar a sua adoção por indivíduos sem sintomatologia gastrointestinal sugestiva de intolerância aos FODMAP", explica o nutricionista, habituado a ser confrontado com esta questão. E mesmo os indivíduos que sofram dessa sintomatologia "não deverão seguir esta dieta sem uma avaliação e acompanhamento regular por um nutricionista, dado o risco de ocorrência de desequilíbrios nutricionais", acrescenta ainda Fábio Cardoso.

As principais fontes da intolerância

A lista de alimentos ricos em FODMAP inclui hortícolas como a beterraba, a alcachofra, a couve-de-bruxelas, o funcho, a cebola, o alho, o alho-francês, o espargo, a ervilha-de-quebrar, o brócolo e a couve-flor e frutos como a maçã, a pera, a manga, a melancia, o pêssego e a ameixa. Nos laticínios, os mais comuns são o leite, o iogurte, o queijo mole, os gelados com natas e outras sobremesas com leite. O feijão, o grão-de-bico, a fava, a ervilha e a lentilha são as leguminosas mais apontadas.

Nos cereais e derivados, o centeio e trigo estão sob alerta, tal como frutos oleaginosos como o caju e o pistácio. No outro lado da barricada, a lista de alimentos restritos em FODMAP inclui hortícolas como a cenoura, o aipo, a couve bok choy, a beringela, o pimento, o chuchu, feijão-verde, a alface, a abóbora, a cebolinha, a pastinaca e a acelga e frutos como a banana, o mirtilo, a uva, a meloa, o quivi, o limão, a lima, a tangerina, a laranja, o maracujá, a framboesa, o morango e o tomate, que é uma fruta.

Nos lacticínios e nas bebidas vegetais, são apontados o leite sem lactose, as bebidas vegetais de coco, de arroz e/ou à base de proteína de soja e queijos como o cheddar, o mozarela e o parmesão. A lista inclui ainda a carne, o peixe, o tofu, o seitan e os ovos. Em termos de cereais e derivados e tubérculos, a batata, o milho, o arroz e outros cereais sem glúten são, a par de frutos oleaginosos como a noz, a noz-pecã, o amendoim e o pinhão, ingredientes alimentares restritos em FODMAP que deve privilegiar.