A Ruff Dog destaca-se por ter uma secção dedicada à alimentação natural para cães e gatos. O que vos levou a apostar neste tipo de dieta, no que consiste e quais os seus benefícios?

Eu já me dedicava à alimentação natural do cão há alguns anos porque um dos meus cães tem uma alergia grave e não consegue digerir ração. Por causa dele acabei por escrever dois livros sobre alimentação natural do cão e, entretanto, conheci a Dra. Rita num seminário de treino de cães e começamo-nos a dar muito bem. Como tinha um problema semelhante com a cadela dela e também se estava a dedicar à alimentação natural acabamos por criar este projeto porque não havia nada em Portugal que desse resposta a este problema: o que é que se faz aos cães que não conseguem digerir ração?

A alimentação natural é aquilo que faz sentido qualquer animal comer. No dia a dia a maior parte da população dá ração porque é uma coisa muito prática: tira-se do saco, tem uma validade enorme e está feito. Mas na verdade é um alimento completamente desidratado e altamente processado. A longo prazo acabamos por ver consequências na saúde da maior parte dos cães e gatos. Na Ruff Dog fazemos dois tipos de alimentação natural: a crua, conhecida por BARF (Biologically Appropriate Raw Food) e que inclui uma percentagem de carne limpa, carne com ossos, vísceras, hortofrutícolas e suplementos, e a cozinhada, que só tem carne limpa, vísceras, uma percentagem de hidratos de carbono e depois os vegetais, frutas e suplementos.

A dieta crua, conhecida como BARF, foi desenvolvida nos anos 1990 pelo veterinário australiano Ian Billinghurst. Considerado uma referência em nutrição canina, é um defensor dos alimentos crus e dos seus benefícios em animais domésticos.  Os portugueses estão familiarizados com esta dieta?

Hoje em dia acho que há muita gente que já ouviu falar nela apesar de ainda haver uma grande confusão naquilo que é realmente a alimentação BARF. Às vezes vemos pessoas a dar carcaças de frango e que acham que estão a fazer alimentação BARF. Mas isso não é alimentação BARF, faltam aí muitos nutrientes que são importantes para o cão. Acho que começa a ser mais popular porque tal como as pessoas têm percebido o impacto que a alimentação tem no seu bem-estar, qualidade de vida e saúde, também têm compreendido que com os cães é exatamente igual. Dar um alimento completamente processado, cheio de químicos e aditivos não pode ser tão bom como dar um alimento fresco.

No dia a dia a maior parte da população dá ração porque é uma coisa muito prática: tira-se do saco, tem uma validade enorme e está feito. Mas na verdade é um alimento completamente desidratado e altamente processado

Nas nossas consultas nós fazemos uma avaliação do animal, os cálculos das suas necessidades e fazemos uma avença: os clientes pagam um mês de alimentação e recebem 30 embalagens com a dose exata para esse cão. Fazemos isto para ser a forma mais rápida para os donos. É só descongelar e servir. Para além disso também fazemos dietoterapia e essa é a nossa grande diferença no mercado. Ou seja, aparece-nos um cão com determinada patologia e nós desenhamos um plano alimentar e criamos receitas para a patologia desse animal.

A alimentação natural é personalizada de acordo com as necessidades específicas de cada animal. Como é feita a sua prescrição? Existe algum período de transição/adaptação? Como funciona em termos de custos?

Depende de animal para animal. A abordagem mais convencional quando temos cães com alergias é fazermos uma transição mais prolongada. Muitas vezes começamos pela alimentação natural cozinhada e depois passamos para a BARF. Há cães idosos ou com determinadas patologias que ficam sempre na cozinhada, mas também temos cães jovens e saudáveis que entram diretamente para a BARF. Os gatos, por exemplo, são muito mais difíceis de dar este tipo de alimentação do que os cães. Um gato que, enquanto jovem, não foi exposto à carne, dificilmente vai aceitar em adulto. E é preciso ter muito cuidado com estas transições. Por exemplo, temos dois casos de rejeição, que não aceitam a nossa comida de maneira nenhuma mas são cães obesos, que estavam habituados a comer comida dos donos temperada com tudo. Isto é um erro enorme porque a cebola e o alho cozinhado são dois alimentos extremamente tóxicos para os cães. Fazer alimentação natural não é dar restos ou dar a nossa comida. A alimentação natural tem percentagens, regras e quantidades específicas.

Porque motivo consideram que muitos donos continuam a preferir as rações face a este tipo de alternativas? A falta de conhecimento, abertura e poder económico poderá estar entre os principais fatores?

Sim, sem dúvida nenhuma. Infelizmente, mesmo entre a comunidade médico-veterinária está muito enraizada a questão das rações. A maior parte dos veterinários estuda nutrição de gado de consumo, não estuda quase nada sobre animais de companhia. Como tal, ou por gosto próprio se dedicam a estudar sobre isso ou o chip com que saem é muito virado para as rações, por ser mais prático e terem a certeza daquilo que o dono está a dar ao cão. Agora se a alimentação natural não for bem feita, a verdade é que também pode criar défices nutricionais aos cães. Trabalhamos cada vez mais com clínicas veterinárias que nos mandam animais com determinadas patologias para nós ajudarmos e fazer a dietoterapia como tratamento coadjuvante. Mas também o público em geral procura-nos cada vez mais e temos algumas pessoas que, quando experimentam alimentação natural, ficam completamente maravilhadas porque nunca sequer tinham ouvido falar.

Fazer alimentação natural não é dar restos ou dar a nossa comida. A alimentação natural tem percentagens, regras e quantidades específicas.

Agora não é económico. A carne mais barata no mercado custa dois euros e é o frango. Na nossa alimentação nós incluímos 10 proteínas diferentes, como é o caso do frango, pato, coelho, codorniz, borrego, vaca, porco e cavalo, portanto é impossível fazer esses valores. No supermercado encontra-se cinco quilos de ração por 10 euros. Nós não competimos de todo com isso, nem fazemos alimentação low-cost. Há donos que perguntam ‘Não posso ter uma alimentação só de frango para ficar mais barato?’ Não o fazemos porque achamos que o animal não tem tudo aquilo que precisa dessa forma. Temos cães de raça mais pequena a fazerem avenças de 20 euros por mês, mas também temos avenças de 600 euros porque são cães que comem dois quilos por dia. O valor varia consoante as necessidades do animal.

Em que casos é que os donos devem fazer a transição para a alimentação natural? A que sinais devem estar atentos?

Não é preciso ter nenhuma doença para fazer a nossa alimentação. Qualquer cão pode e deve fazer alimentação natural. Nós temos muitos casos de pessoas com cães com sensibilidades gastrointestinais, alergias e intolerâncias alimentares e problemas de pele e pêlo que nos procuram.

Para além da alimentação, a Ruff Dog também se destaca pelos seus serviços e produtos inovadores. Em que consistem?

Não somos a típica loja de animais e, em termos de produtos, procuramos ter brinquedos e artigos de estimulação cognitiva e mental para os cães que não há em Portugal. Trabalhamos com muitos desidratados de parte de animais que normalmente são desperdiçadas e que nós desidratamos para utilizar como snack. Tipicamente as pessoas dão o dentastix para limpar os dentes aos cães que, mais uma vez, é um alimento altamente processado, cheio de açúcares e que está provado que desenvolve muitas vezes problemas gástricos. Nós temos estas alternativas que, pela mastigação e salivação, fazem a limpeza na mesma e não têm qualquer consequência para o cão. Para além de ser um momento de estimulação cognitiva, os cães adoram, ficam malucos com isto. Como temos muitos cães da pandemia, este tipo de artigo ajuda-os a ficar entretidos na ausência dos donos.

Sendo a alimentação o nosso foco, temos ainda uma série de artigos que servem para os cães se alimentarem de uma forma melhor. Tanto os Licky Mats como os Slow Feeders têm o intuito de fazer o cão comer mais devagar. Numa taça normal, o animal abre a boca e põe tudo lá dentro. Ou seja, não mastiga porque os cães não têm movimento lateral da mandibula. Em 10 grãos, se trincarem um foi por acaso. E com este tipo de artigos – que podem ser utilizados com alimentação natural ou não - eles não conseguem abrir a boca e pôr uma mão cheia de ração lá dentro. São obrigados a lamber e a tirar um bocadinho aqui e ali. Em média demoram 10 vezes mais tempo a comer se usarmos um destes artigos do que uma taça. Temos ainda o Snuffle Mat que é espetacular para ração e brinquedos que são dispensadores de comida.

Quais são os principais mitos que ainda persistem atualmente sobre cães e gatos?

Sobre a Ruff Dog

A Ruff Dog disponibiliza diversos serviços e produtos, tais como:

  • Treats naturais (sem farinhas e açucares);
  • Tugs de interação ou jogos de enriquecimento e estimulação mental;
  • Artigos de treino e de desporto;
  • Suplementos alimentares e nutracêuticos;
  • Espaço de grooming.

Morada: Rua Cesário Verde, 35C, Queijas

Telefone: 964212930

Site: www.ruffdog.pt

Um dos principais problemas é os donos acharem que a ração é a melhor coisa do mundo. Em segundo lugar é que os cães são todos amigos uns dos outros, amigos das pessoas e que só querem brincar. Com isto acaba por haver pouco respeito por quem tem animais mais difíceis, que são reativos e que não podem ir passear a um parque porque há sempre alguém com o cão solto que diz que ele só quer brincar. E isto depois complica a vida a muita gente e acaba por gerar muitos problemas de stress, agressividade e ansiedade nos cães porque eles não gostam de toda a gente, não gostam todos uns dos outros e também não gostam muito de crianças. Este é outro mito muito grande. Os cães dão vários sinais antes de morder e rosnar, sinais esses que a maior parte das pessoas não sabe reconhecer. Eles avisam, avisam e depois o que é que muitas vezes acontece quando rosnam? Levam. Isto faz com que os cães não queiram rosnar. Extinguem esse sinal e partem logo para a mordida, e isto vê-se muito com crianças.

Acho que as pessoas deviam instruir-se e preocupar-se em saber o que estão a fazer quando vão buscar um cão. Felizmente hoje já não se vê aquilo se via há uns anos: o cão de corrente no fundo do quintal com a ração mais barata que há no supermercado. Cada vez mais as pessoas entendem o animal como um membro da família.

Com a pandemia, que cuidados é que devem ser reforçados nos animais de companhia?

Há muito a tendência de dar festinhas nos cães de toda a gente. Eu costumo dizer que o meu cão não é um bem público, e da mesma maneira que não nos passa pela cabeça em dar festinhas aos filhos dos outros também não deveria haver essa ideia com os animais. A sua higiene deverá ser feita com água e sabão a seguir a cada passeio, mas mais importante que isso é não deixar que desconhecidos façam festas no nosso cão porque depois estamos com ele no sofá ou na brincadeira sem qualquer cuidado. Dessa forma ele poderá ser um portador de coronavírus, uma vez que não contrai e não nos passa a doença. Em relação aos períodos em que começam a ficar mais sozinhos com o fim do teletrabalho é importante fazer um treino de adaptação. Ou seja, começar, enquanto ainda estamos em casa, a habituar o cão a estar sozinho durante alguns períodos. Não estar sempre na mesma divisão que nós, sairmos para dar pequenos passeios e ele ficar sozinho e irmos prolongando este tempo gradualmente e deixar alguma coisa para ele se entreter durante esse período.

Um dos principais problemas é os donos acharem que os cães são todos amigos uns dos outros, amigos das pessoas e que só querem brincar.

Uma coisa que vou reparando é que as pessoas estão cronicamente habituadas a deixar os cães em casa o dia todo e dizem ‘Ah, mas ele está habituado a ficar em casa sem fazer nada’. Mas a verdade é que isso é uma violência. Se nós pudermos enriquecer esses momentos em que os cães estão sozinhos com um brinquedo de estimulação cognitiva, com pequenos jogos ou cansá-lo antes desse período já faz muita diferença. E os dois passeios de 10 minutos diários não é aquilo que um cão precisa.

Atualmente vemos que começam a existir empresas, hotéis e até cafés onde os animais são bem-vindos. Acredita que, a pouco e pouco, Portugal está a tornar-se num país pet-friendly?

Eu acho que se estão a dar os passos pela ordem errada. No meu ponto de vista, a maior parte dos cães não estão preparados para estar numa esplanada, nem os donos para estarem numa esplanada com os cães. A maior parte deles não tem obediência, não sabe estar. Os donos exigem-lhes coisas que eles nem sequer percebem e isso acaba por desenvolver muita frustração nos dois. Por outro lado, há pessoas que deixam os cães ir para todo o lado e não perceberem que o animal pode incomodar. Acho que era importante as pessoas consciencializarem-se dos seus deveres como donos, das necessidades de um cão e haver algum treino antes de se abrirem esplanadas e outro tipo de locais.