
Se não tem nada bom para dizer, então o melhor é ficar em silêncio. Apesar de isto ser um conselho que se aplica à vida pessoal com resultados positivos, no que toca à gestão de equipas pode manifestar-se um desastre. Kim Scott, ex-executiva da Google e da Apple, demonstra isso mesmo no seu livro Sinceridade Radical (edição Presença). Na obra, a autora parte do exemplo de líderes e gestores, exaustos e sem saber o que fazer para tornar as suas equipas eficientes, proporcionando, ao mesmo tempo, um bom ambiente de trabalho. Kim Scott descobriu isso - aliás, passou por isso. Em consequência, criou um método já seguido e testado por milhares de pessoas: chama-lhe, justamente, tal como o livro agora nos escaparates nacionais, de sinceridade radical.
A sinceridade radical assenta num objetivo: atingir o sucesso sem perder o lado humano nas organizações e empresas. Como? Para ser um bom líder, é preciso importar-se individual e pessoalmente com cada uma das pessoas, enquanto as confrontamos diretamente. “Vejamos: se não tivermos real interesse por elas, caímos na agressão gratuita; se nos importarmos, mas não as confrontarmos diretamente, estamos no terreno da empatia prejudicial”, lemos na sinopse à obra.
O livro oferece ao leitor as ferramentas para atingir os três maiores e mais importantes objetivos como líderes e gestores, no que às equipas diz respeito: promover uma cultura de feedback que inclua críticas e elogios; formar equipas unidas; atingir resultados para os quais todos contribuíram e dos quais todos se orgulhem.
Escreve a autora na introdução ao livro: “Para mim, o termo ‘radical’ refere-se a uma filosofia de gestão que é nova e dramaticamente diferente do que havia antes. A ideia de que os chefes devem usar o seu poder para se comportarem como intimidadores é velha e banal, não é nova nem radical. A ideia fundamental por detrás da Sinceridade Radical é que o comando e o controlo podem entravar a inovação e prejudicar a capacidade de uma equipa de melhorar a eficiência do trabalho rotineiro. Os chefes e as empresas obtêm melhores resultados quando cedem voluntariamente o poder unilateral e encorajam as suas equipas e os seus colegas a responsabilizarem-se, quando desistem de tentar controlar os funcionários e, em vez disso, se focam em encorajar a ação”.
Do livro, publicamos o excerto abaixo.
Como saber quando despedir alguém?
Imagine que alguém da sua equipa, a “Peggy”, é terrível na sua função, não melhora ou ainda piora. Será altura de a despedir? Não há uma resposta absoluta para esta pergunta, mas há três questões a considerar: deu-lhe orientação Radicalmente Sincera, compreende a importância do desempenho da Peggy para os colegas e pediu conselhos a outros?
Deu orientação radicalmente sincera? Demonstrou à Peggy que se preocupa pessoalmente com o seu trabalho e a sua vida, e foi totalmente claro quando a desafiou a melhorar? Os seus elogios foram substantivos e específicos sobre o que ela fez bem, e não apenas um bálsamo para o seu ego? Foi humilde e direto nas suas críticas, oferecendo-se para a ajudar a encontrar soluções e não atacando-a pessoalmente?
E fez estas coisas em múltiplas ocasiões ao longo do tempo? Se a resposta for afirmativa e não viu melhorias, ou apenas laivos de melhorias, é altura de despedi-la. Lembre-se: a definição de insanidade é continuar a fazer o mesmo e esperar resultados diferentes.
Como é que o fraco desempenho dessa pessoa afeta resto da equipa? As deficiências da Peggy não são apenas um problema seu. Como gestor, a sua função é certificar-se de que compreende a perspetiva de todos os outros, e como o mau desempenho da Peggy afeta os outros membros da equipa. Geralmente, quando toma consciência do fraco desempenho do seu subordinado, já há muito que isso afeta os seus colegas.
Procurou uma segunda opinião, falou com alguém em quem confia e com quem pode discutir o problema? Por vezes, pode pensar que foi claro quando não o foi. Ter uma perspetiva externa pode ajudá-lo a certificar-se de que está a ser justo. Além disso, se não tiver experiência em despedir pessoas, fale com alguém que tenha essa experiência. No mundo atual, a maioria das empresas tem diretrizes estritas que devem ser seguidas quando alguém é despedido, e há muitos problemas legais que podem consumir bastante tempo se não tiver cuidado.

Mentiras comuns que os gestores dizem a si mesmos para evitar despedir alguém que deve ser despedido
Os gestores esperam quase sempre demasiado tempo para despedir funcionários. Ser demasiado cuidadoso pode ser preferível a ser demasiado apressado, mas eu diria que a maioria dos gestores espera demasiado para o fazer porque se engana a si mesma, acreditando que é desnecessário. Vejamos quatro "mentiras" comuns que os gestores dizem a si mesmos para evitar despedir alguém:
1. Vai melhorar. Mas é claro que não melhorará por si mesmo. Assim, pare e pergunte-se: como é que, exatamente, vai melhorar? O que vai fazer de forma diferente? O que a pessoa em questão irá fazer de forma diferente? Como podem as circunstâncias mudar? Mesmo que as coisas tenham ficado um pouco melhores, melhoraram o suficiente? Se não tem uma resposta exata para estas questões, provavelmente não vai melhorar.
2. Alguém é melhor que ninguém. Outra razão comum por que os chefes têm relutância em despedir um funcionário com fraco desempenho é não quererem um “buraco” na sua equipa. Se despedir o “Jeffrey”, quem fará o trabalho que ele fazia? Quanto tempo precisará para encontrar um substituto? A verdade é que, amiúde, os funcionários com fraco desempenho criam tanto trabalho suplementar para os outros quanto o que eles fazem, porque deixam partes do seu trabalho inacabadas, fazem outras partes de forma descuidada ou comportam-se de modo pouco profissional que os outros tem de compensar. Steve Jobs explicou isto de forma sucinta, ainda que severa, quando disse: “Mais vale ter um buraco do que um idiota”.
3. Uma transferência é a solução. Por ser muito difícil despedir pessoas, costuma ser tentador passá-las para um colega incauto na sua empresa, mesmo que não possuam as aptidões de que o seu colega necessita ou que sejam um pobre acrescento cultural. Parece “mais simpático” do que despedi-las. É claro que isto não é tão simpático para o colega incauto e, normalmente, também é um erro para a pessoa com quem tenta ser “simpático”.
4. É mau para o moral. Também é tentador dizer a si mesmo que não despede um funcionário porque isso iria desencorajar a equipa. No entanto, manter uma pessoa que não é capaz de cumprir as suas funções é muito pior para o moral — para o seu, para o da pessoa que faz um trabalho fraco e para o de todos que fazem um trabalho excelente.
Seja radicalmente sincero com a pessoa que está a despedir
A forma como despede um funcionário é realmente importante, e para fazer bem este trabalho, importa que não se distancie da pessoa que vai despedir. Se tentar evitar sentir a dor inerente à situação, em especial para o funcionário que vai despedir, irá criar confusão. Para se manter no estado de espírito certo, lembre-se do seguinte:
Recorde um trabalho em que foi terrível e pense como está contente por já não estar a fazê-lo. Num verão, quando frequentava a escola secundária, trabalhei como caixa de banco. Não sou boa a fazer contas de cabeça e, com frequência, contava o troco errado. Dado que os clientes se apercebiam normalmente dos erros a favor do banco, mas nem sempre eram honestos quando beneficiavam, perdia muito dinheiro do banco. A minha chefe não me despediu. Em vez disso, disse: “É capaz! Se tentar, se se concentrar, pode fazer bem as contas todos os dias!” Agora, o que era apenas um problema de matemática parecia um defeito de carácter. No entanto, quanto mais me esforçava, pior ficava. Contudo, a minha chefe continuava a encorajar-me. Sentia-me miserável. Devia ter saído e arranjado um emprego a cortar relva. Se a minha chefe me tivesse simplesmente despedido, dizendo “Não está claramente interessada neste trabalho. Porque não arranja um emprego diferente neste verão?”, ter-me-ia feito um grande favor — e poupado muito dinheiro ao banco. Em vez disso, sofri e arrastei-me até ao fim do verão. E se tivesse tido um emprego permanente e tivesse ali ficado indefinidamente?
Quando despede alguém, cria a possibilidade de a pessoa se superar e encontrar, noutro lado, a felicidade de fazer um trabalho com sentido. Parte de arranjar um bom emprego é deixar um mau, ou que é mau para a pessoa. Como me disse certa vez a minha avó, “Nunca falta testo para uma panela”. O facto de uma pessoa não ser boa no seu trabalho, não significa que não haja outro trabalho em que possa ser excelente. Sei que isto pode soar muito otimista, e, assim, antes de me reunir com o funcionário, tento imaginar especificamente qual poderia ser esse trabalho. Também tento reformular o problema, tanto para mim como para a pessoa que vou despedir: não é a pessoa que é má, mas o trabalho —pelo menos para essa pessoa. Que trabalho seria excelente para essa pessoa? Poderei ajudá-la fazendo uma introdução?
Reter as pessoas que fazem um mau trabalho penaliza as que fazem um trabalho excelente. Não lidar com um problema de desempenho é injusto para o resto da equipa. O trabalho não feito acaba geralmente nas mãos dos que têm maior desempenho, sobrecarregando-os. Na prática, o moral melhorou sempre depois de ter demitido um funcionário com fraco desempenho e, por vezes, perdi os funcionários que mais queria conservar, ficando demasiado tempo presa a uma pessoa com fraco desempenho. Reter um mau chefe é especialmente danoso, por- que os maus chefes tem um impacto muito negativo nos seus subordinados. Isto é o contrário da alavancagem da gestão.
Enquanto escrevo estas palavras, um líder que conheço está a adiar despedir um mau chefe que, em vez de conhecer os factos, grita. Um funcionário que trabalha para esse chefe está com urticária; outro não dorme bem há meses. Contudo, o processo arrasta-se. O gestor em questão pensa que é só uma questão de tempo até serem despedidos e, assim, toda a situação parece um estranho jogo do gato e do rato. Nada na situação é “simpático” para todos os envolvidos!
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