Falar de aborto não é uma tarefa fácil. A Interrupção da Gravidez ou aborto é um procedimento tão antigo quanto a nossa existência, estando desde sempre presente na humanidade.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o aborto é definido como sendo a interrupção de uma gravidez antes que o feto seja capaz de usufruir de uma vida extrauterina independente. Segundo os parâmetros médicos, esta situação corresponde às primeiras 28 semanas de gestação, contando a partir da ovulação. O aborto poderá ser definido de duas formas distintas: o Aborto Espontâneo e a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG).
Na primeira situação o aborto não é intencional, enquanto, na segunda, estando ou não dentro da lei, a decisão passa pela mulher grávida. A Interrupção Voluntária da Gravidez é, sem dúvida, a mais prejudicial para a saúde da mulher, tanto física como psicológica e mental.
Seja de uma forma ou de outra, o aborto é um ato extremamente violento, nomeadamente contra a mulher. É vivida como uma situação de perda e de luto.
Consequências na saúde mental
Quando a mulher não se permite vivenciar esta perda, passando pelas fases da negação, da raiva, da culpa, do medo e do ressentimento e perceber que é normal passar por todos estes estados, poderá levar a consequências bastante graves a nível psicológicos que por vezes tornam-se irreversíveis.
As consequências tornam-se ainda mais gravosas quando estamos perante a situação de interrupção voluntária, uma vez que é muitas vezes negada, e todos estes sentimentos serão como que camuflados. E mesmo em algumas situações que as pessoas julgam que superaram a perda, o mais provável é que não tardará ao aparecimento dos traumas e medos que poderão conduzir ao desenvolvimento de quadros de ansiedade e depressões moderadas a graves.
Atualmente é consensual que as consequências psicológicas resultantes das IVG são extremamente mais complexas, especialmente no que respeita a determinados aspetos que lhe estão subjacentes, como são exemplos a fertilidade, a sexualidade, a contraceção, o desenvolvimento da identidade de género, os relacionamentos interpessoais, a moralidade, entre outros. Pelo que verifica-se uma linear e significativa associação entre a IVG e o risco de desenvolvimento de quadros psicopatológicos com intensidades consideráveis (Coleman, 2011), nomeadamente, porque é uma decisão difícil e emocionalmente exigente para as mulheres.
Acompanhamento psicológico
Neste sentido é extremamente importante o acompanhamento psicológico desde o início do processo, de forma a viver a situação da forma mais saudável possível, uma vez que, além dos quadros de depressão e ansiedade, em situações mais alarmantes podem estar presentes o risco do início de consumos de substâncias e/ou comportamentos suicidas e de automutilação.
Infelizmente Portugal ainda se tem debruçado muito pouco nesta área, sendo necessário reforçarmos os nossos esforços, nomeadamente na Saúde Mental. Os apoios e acompanhamentos médicos são totalmente suportados pelo Sistema Nacional de Saúde, contudo, quando falamos de Apoio Psicológico, este é inexistente.
Atendendo à experiência traumática que é passar por um aborto, é fulcral apostar na Saúde Mental, para conseguirmos evitar outros problemas de saúde. Torna-se urgente que mobilizemos as nossas competências para o diagnóstico de situações psicopatológicas e de risco e a implementação atempada de intervenções terapêuticas. Neste sentido, deverá ser uma prioridade a saúde mental após uma situação de aborto.
Um artigo da psicóloga clínica Marisa Marques.
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