A ausência de rituais fúnebres como até então os conhecíamos, o suporte social reduzido e o isolamento propício a emoções negativas (por exemplo, a culpa, raiva, impotência) desafiam diariamente o ser humano num momento de pandemia relacionada com a COVID-19.
Neste sentido, destacam-se algumas indicações, enquanto possíveis facilitadoras, para um processo de luto pleno, tendo em consideração o contexto de sofrimento atual, nomeadamente:
- Não adiar o luto. O regresso às rotinas é importante, mas fazer o luto é a prioridade. Ainda que em casa e no contexto do teletrabalho, é fundamental que os primeiros dias sejam dedicados à perda. Fingir que a perda não aconteceu pode ter repercussões, a longo prazo.
- Estar em contacto com a dor. Dialogar sobre a perda ou chorar é importante, pois permite expressar o sofrimento. Porém, neste processo, devem ser identificadas estratégias de regulação das emoções, como as estratégias de relaxamento (por exemplo, respiração profunda, meditação), os rituais e o autocuidado.
- Os rituais são estratégias que permitem homenagear a pessoa e, simultaneamente, transformar a relação que era anteriormente física numa relação meramente simbólica e emocional. Esta relação permite a sensação de estar emocionalmente próximo da pessoa perdida, sem prejudicar o bem-estar. Inclusivamente, estes podem ser praticados em família, facilitando a ajuda mútua. Tomem-se como exemplos acender uma vela, falar da pessoa perdida, ver fotografias ou vídeos, fazer um “livro de memórias” com os momentos mais significativos ou orar.
- Rotinas de autocuidado. É fundamental recorrer a tarefas que proporcionem bem-estar, como a leitura, ouvir música, ver filmes e séries, ou o exercício físico. Numa situação de luto facilmente pode surgir a auto culpabilização perante a ideia de encontrar algum bem-estar, o que é normal neste processo. Daí ser desejável procurar minimizar o sentimento de culpa, dada a importância em recuperar a estabilidade e disponibilidade emocional para processar a perda.
- Respeitar o luto e as necessidades do outro. Enquanto que para uns pode ser importante dialogar sobre a pessoa perdida, outros valorizam o estar em silêncio, em confronto com os próprios pensamentos. É importante compreender que o desejo de dialogar sobre a pessoa perdida não representa uma negação da perda, assim como estar em silêncio não significa que a pessoa desvalorize a perda. Todos apresentamos formas diferentes de gerir a dor. No entanto, é importante encontrar um equilíbrio, para que as necessidades de todos os membros da família sejam satisfeitas. Por exemplo, podem existir momentos de partilha da dor, com recurso aos rituais e outros momentos de reflexão individual, para que cada um tenha o seu espaço pessoal, mas exista a sensação de que, enquanto família, estão a gerir a perda. Sentir que o outro está disponível para nos escutar é fundamental, assim como sentir que somos respeitados.
- Procurar o apoio do outro. Nem todas as pessoas que o podem ajudar estão na sua casa. Contacte-as e avalie a disponibilidade para ser ouvido. Dialogar sobre a perda permite explorar a dor, integrar a experiência na narrativa de vida e dar-lhe um significado.
O recurso a ajuda especializada no luto é particularmente importante, quando as saudades e a tristeza impedem o funcionamento diário, como cumprir com as tarefas domésticas ou concentrar numa determinada tarefa. Para além do risco de luto complicado, a vivência de uma perda traumática pode potenciar o desenvolvimento de sintomatologia depressiva ou stress pós-traumático. Recorra a ajuda profissional, não está sozinho. Mesmo nesta fase, não tem que adiar a procura. São várias as entidades que disponibilizam consultas online, como a MIND – Psicologia Clínica e Forense.
As explicações são de Mauro Paulino e Sofia Gabriel, da MIND – Psicologia Clínica e Forense
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