A cantora falou recentemente sobre ter síndrome de Tourette numa entrevista com David Letterman para a sua série Netflix, "My Next Guest Needs No Introduction".
Billie Eilish, que foi diagnosticada aos 11 anos com o distúrbio neurológico, admite que as pessoas à sua volta, às vezes, não percebem o que está a acontecer. "Essas são coisas que nunca notarias se estivesses apenas a conversar comigo", disse afirmou. "Mas para mim são muito cansativas", acrescentou.
O distúrbio pode causar vocalizações incontroláveis e indesejadas e/ou movimentos repetitivos. "A maneira mais comum de as pessoas reagirem é rirem porque acham que estou a tentar ser engraçada", disse. "E eu fico sempre incrivelmente ofendida com isso".
A vencedora do Grammy, de 20 anos, disse que outros artistas já partilharam com ela que também têm síndrome de Tourette, mas disse que "não divulgaria os seus nomes porque não querem falar sobre isso".
O que é a Síndrome de Tourette?
Antes de falarmos de Síndrome de Tourette é importante falarmos de tiques. Segundo a médica psiquiatra Berta Pinto Ferreira, tiques são movimentos ou sons involuntários, mas conscientes, breves, recorrentes, intermitentes, repetitivos e incontroláveis.
Alguns exemplos de tiques são:
- piscar repetidamente os olhos,
- fazer caretas,
- mover a cabeça de um lado para o outro,
- tossir, fungar, limpar a garganta, cuspir,
- encolher os ombros, esticar os braços, estalar os dedos, bater palmas ou fazer outros movimentos com os braços e as mãos,
- repetir determinadas palavras, dizer palavrões,
- fazer gestos obscenos e gritar,
- gemer, assobiar, grunhir ou emitir sons, palavras ou frases fora do contexto.
Apesar de involuntários, os tiques podem ser controlados temporariamente pela vontade, mas tendem a agravar em estados de ansiedade e cansaço.
Em 1885, um neurologista francês chamado George Gilles de la Tourette, descreveu uma perturbação neuropsiquiátrica, caracterizada pela presença de tiques crónicos motores e vocais exuberantes, que viria a ser denominada de Síndrome de Tourette.
Em todo o mundo, as perturbações mentais afetam milhões de pessoas. As artes, incluindo o cinema, sempre foram um campo para a representação da doença mental, tornando-se um suporte perfeito para expor as perturbações psiquiátricas que afligem a sociedade.
O cinema usa a narrativa para contextualizar doenças mentais e permite que o tema se torne mais acessível e que o público se relacione com experiências que de outra forma não seria exposto.
Os filmes de comédia abordaram o assunto, mas contêm frequentemente, alguns elementos de drama ou tragédia, promovendo uma maior consciencialização pública da saúde mental, aproximando os espectadores da própria vulnerabilidade.
Manifesta-se antes dos 18 anos
Segundo Berta Pinto Ferreira, Psiquiatra da Infância e Adolescência na Clínica de Santo António, o início dos tiques acontece tipicamente em idades entre os 4 e os 6 anos e são comuns na infância e transitórios na maioria dos casos.
O diagnóstico é clínico e realizado através da correta elaboração de história clinica, avaliação dos sintomas e quadro ao longo do tempo e observação pedopsiquiátrica da criança. A informação que os pais transmitem aos médicos é extremamente importante uma vez que as crianças na presença do médico podem controlar os tiques.
Não são necessários exames de sangue ou outros métodos complementares de diagnóstico, excepto se suspeitas de outra doença.
Os critérios que permitem que a criança seja corretamente diagnosticada são:
- A presença de tiques motores e/ou vocais;
- Início dos tiques antes dos 18 anos de idade;
- Duração dos tiques pelo menos durante um ano;
- Período de agravamento e melhoria dos tiques ao longo do tempo;
- Alteração do tipo de tiques com o tempo (num momento pisca os olhos e no ano seguinte tem movimentos de sacudida de ombros).
A presença dos tiques não pode estar associada a outras doenças ou fármacos.
Causa desconhecida
A causa não está claramente definida, sendo a etiologia actualmente compreendida num modelo no qual prevalecem factores biológicos (por exemplo: susceptibilidade genética, baixo peso à nascença) em interacção com factores ambientais.
As mulheres podem experienciar mais frequentemente sintomas de ansiedade e depressão associadas a esta doença.
Tratamento
Atendendo ao curso habitualmente crónico, ao impacto negativo no funcionamento e à elevada prevalência de co-morbilidades, é fundamental um acompanhamento pedopsiquiátrico continuo e regular, explica a médica.
À semelhança de outras perturbações de saúde mental na infância e adolescência, torna-se imprescindível a participação ativa da família e uma articulação próxima com a escola.
O tratamento farmacológico deve ser reservado aos doentes cuja intensidade dos tiques seja suficientemente grande para causar um impacto negativo nas várias áreas de funcionamento.
O tratamento neurocirúrgico apenas se aplica a casos selecionados de adultos que apresentem tiques graves e incapacitantes resistentes ao tratamento farmacológico. O método mais recomendado consiste na Estimulação Cerebral Profunda, que envolve a colocação de eléctrodos em regiões profundas do cérebro de modo a que a estimulação elétrica possa lá chegar.
A Síndrome de Tourette não tem cura, mas na maioria dos doentes verifica-se uma melhoria da doença a partir da adolescência. Após um pico de gravidade entre os 8 e os 12 anos, os sintomas tendem a diminuir de intensidade até por volta dos 20 anos.
Pode verificar-se desaparecimento dos sintomas em aproximadamente 1/3 dos casos e apenas uma pequena percentagem terá sintomas persistentemente graves na idade adulta.
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