Apresentada pela Comissão Europeia em março, a legislação prevê a implementação de medidas e metas para que a UE se torne no primeiro continente a atingir a neutralidade carbónica, até 2050.
Dotada em setembro pela Comissão Europeia de uma nova meta climática - uma redução de pelo menos 55% das emissões de gases com efeito estufa até 2030, relativamente aos níveis de 1990, contra os 40% antecipados até agora -, a lei europeia do Clima tem encontrado resistência por parte daqueles que a consideram ou demasiado ambiciosa para as suas economias ou insuficiente para reverter o aquecimento global.
A sua implementação - identificada pelo trio das presidências alemã, portuguesa e eslovena como necessária para “melhorar a ação climática tanto internamente como através de ações externas” – será assim uma das cinco prioridades estratégicas da presidência portuguesa do Conselho da UE, juntamente com a Europa Resiliente, a Europa Social, a Europa Digital e a Europa Global.
Para tal, será necessário ultrapassar a resistência de certos Estados-membros da Europa do Leste, cujas economias se baseiam maioritariamente em indústrias dependentes de combustíveis fósseis e que têm bloqueado a adoção de metas climáticas mais ambiciosas no Conselho Europeu.
Na última cimeira, a 15 e 16 de outubro, os líderes dos 27 adiaram esta decisão para a reunião de 10 e 11 de dezembro, referindo ser necessário “aumentar as ambições” caso a UE queira “cumprir o objetivo da neutralidade climática em 2050 e os objetivos do acordo de Paris”, mas também ter em consideração “as circunstâncias nacionais [de cada Estado membro] e questões de solidariedade e justiça”.
O Conselho cedeu assim às exigências dos Estados do Leste que, em julho, tinham endereçado uma carta ao vice-presidente da Comissão Europeia com a pasta do Pacto Verde, Frans Timmermans, onde pediam uma “avaliação do impacto” que as novas metas teriam “ao nível da UE, dos Estados-membros, e dos setores desses Estados-membros”.
“Teremos de levar a cabo ações em muitas áreas e temos de saber, para cada uma dessas áreas, onde e qual será o impacto" das novas metas, referia a missiva assinada pelos ministros do Ambiente da Polónia, Hungria, República Checa, Eslováquia, Roménia e Bulgária.
Convidando a Comissão Europeia a “avaliar as situações específicas [de cada país] e fornecer mais informação sobre o impacto que [a nova meta] poderá ter ao nível dos Estados-membros”, os líderes dos 27 aceitaram que as novas ambições fossem atingidas “coletivamente”, permitindo que certos países não atinjam a meta prevista, desde que esta seja compensada por outros Estados-membros, que a ultrapassem.
A nova postura deverá facilitar as negociações no Conselho Europeu e permitir chegar a consensos na cimeira de dezembro, tendo certos países que previamente se opunham a uma maior ambição climática, como a República Checa, começado a ‘quebrar fileiras’ e a aceitar as novas metas.
“Se concordarmos [numa redução das emissões] de 55% em média, a República Checa não levantará problemas. Há certos países que podem atingir mais, mas a República Checa não o conseguirá”, sublinhou o primeiro-ministro checo à entrada para a cimeira de outubro.
Caso as novas metas sejam aprovadas na cimeira de dezembro, Portugal herdará o ‘dossier’ da presidência alemã na fase em que ele entrará para as negociações interinstitucionais, com cada instituição de posições acertadas e à procura de chegar a compromissos.
Nessa altura, encontrará um Parlamento Europeu (PE) que considera as ambições da Comissão insuficientes, tendo optado por desvalorizar as palavras de Frans Timmermans – que qualificou a meta de redução de emissões de 55% até 2030 como “muito difícil” – e aprovado um corte de 60%, justificando-o como sendo a única maneira de “estar em linha com a ciência”.
À meta mais ambiciosa acresce um conjunto de medidas exigidas pela assembleia europeia que poderão fazer vacilar os governos que se mostram reticentes em aprovar novas metas.
Estas incluem, além do estabelecimento de uma meta adicional para 2040 que seja “legalmente vinculativa”, o objetivo de “emissões negativas” após 2050, que implica a extração de CO2 da atmosfera através da fotossíntese.
Para procurar chegar a compromissos nas negociações da lei europeia do Clima poderão ser mobilizados outros mecanismos, abrangidos pelo Pacto Verde Europeu, como o Fundo para uma Transição Justa, cuja “implementação oportuna” é também uma prioridade do programa do trio das presidências.
Criado, segundo a Comissão, para “apoiar a diversificação e a reconversão dos territórios" dependentes de combustíveis fósseis, o Fundo acaba de entrar nas negociações em trílogo, sendo os principais pontos contenciosos entre o Conselho e o PE o montante global do pacote, mas também o tipo de energia que pode ser abrangido.
Após uma proposta inicial da Comissão de 40 mil milhões para o fundo, o Conselho Europeu reduziu o pacote para 17,5 mil milhões, com o PE a reclamar um montante total de 25 mil milhões, soma que poderá estar mais próxima das ambições dos países do Leste, que pedem mais apoio financeiro da Comissão Europeia.
A Polónia, por exemplo, com mais de 75% da sua economia e cerca de 80.000 mineiros dependentes da indústria do carvão, e como único Estado-membro que, em dezembro de 2019, recusou comprometer-se com a neutralidade climática em 2050, referiu que só operará a transição verde quando receber garantias de que tem o dinheiro, e o tempo, necessários.
A estas exigências soma-se também a questão da combinação energética englobada pelo Fundo para uma Transição Justa, tendo certos países apelado à necessidade de se financiarem projetos ligados à energia nuclear e ao gás natural.
Dois ‘dossiers’ delicados que Portugal irá herdar da presidência alemã e que terá de negociar para conseguir introduzir o Pacto Verde Europeu na legislação europeia e dar vida ao que Ursula von der Leyen qualificou de “momento ‘homem na lua’ para a Europa”: tornar a UE no primeiro bloco a atingir a neutralidade climática.
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