Imaginar um cão deitado num divã a desabafar
com um psiquiatra é, no mínimo, cómico. Mas, se retirarmos o divã e o psiquiatra de cena, podemos facilmente concluir que a depressão, as fobias, a ansiedade e outros distúrbios psicológicos
não são exclusivos do ser humano, embora muita gente ainda se recuse a acreditar
que os animais agem para além do instinto.
A falta de informação e a tendência para desvalorizar
algumas reacções de gatos e de cães têm sido, aliás, um entrave ao seu tratamento. Se o seu animal de estimação manifesta reacções inexplicáveis e não lhe foi diagnosticado qualquer
problema de saúde física, provavelmente, chegou a hora de o levar a um veterinário especialista em terapia comportamental. Ele vai ajudá-lo. E a si também.
A importância da socialização
Afastado da progenitora muito cedo, Tobias, um setter inglês de três anos, desenvolveu uma fobia que o tornou intolerável ao contacto com outros cães. Durante os passeios com o dono sente medo e pede-lhe colo sempre que vê algum
semelhante, seja um grand danois ou um caniche.
Casos como o de Tobias são muito frequentes no consultório de Mónica Roriz, médica especialista em terapia comportamental
e responsável pela Puppy School, no Hospital Veterinário do Porto. A origem do problema pode ser diversa mas a falta de contacto com a mãe e os irmãos nos primeiros tempos de vida tem sido uma das explicações mais comuns para este género de patologia.
«A demasiado frequente prática de separar os cachorros da progenitora antes das oito semanas priva o animal de um período de socialização muito importante para um bom desenvolvimento comportamental», esclarece a médica veterinária.
Tempo para a mascote
Na lista de patologias comportamentais, existem outros distúrbios, além das fobias, que quebram a harmonia entre o animal e o dono, obrigando-o a recorrer à ajuda de um terapeuta. Tanto a hiperactividade, a agressividade e os problemas de hierarquia, em que o cão não reconhece a autoridade
do dono, assim como a falta de asseio, têm dado algumas dores de cabeça a quem deseja
a companhia de um animal.
A falta de atenção e de comunicação gera igualmente consequências
nefastas: «Levam a uma confusão do animal, que não consegue prever a reacção do dono em resposta a uma acção sua. O animal não percebe se está a agir correctamente ou não.»
A confusão pode transformar-se num grave problema de ansiedade e até mesmo levar a uma depressão. Como sublinha a comportamentalista,
«os cães são animais sociais com necessidade
de contactos intra e inter específicos, durante toda a vida. A palavra-chave para se ter um animal é, sem dúvida, tempo.
O tempo que lhe dedicamos, principalmente,
nos cães é fundamental,
muito mais do que grandes espaços».
Ignorar o problema
Muitos donos tendem, contudo,
a desvalorizar o que se passa na cabeça da sua mascote,
o que, na opinião de Mónica Roriz, «prejudica o tratamento».
«Muitas vezes, não existe um verdadeiro incómodo directo no dia-a-dia. Os donos não se apercebem de que algo está errado com o animal. Além disso, a informação
acerca de patologias comportamentais disponibilizada pelos criadores e pelos próprios veterinários é escassa, quando não é mesmo nula», sublinha.
«Acontece até que determinados comportamentos
de hiperactividade sejam atribuídos à idade do animal e não a uma patologia comportamental,
não permitindo ao dono começar precocemente com uma terapia (antes da puberdade),
o que poderá ser altamente prejudicial para o prognóstico», acrescenta ainda.
Veja na página seguinte: O papel do dono
O papel do dono
Geralmente, uma consulta de terapia comportamental
dura pouco mais de uma hora. Tempo
necessário para o veterinário
recolher dados sobre o animal e a sua relação com o dono. Se for diagnosticada alguma patologia a nível psicológico,
o médico discute consigo a terapia a pôr em prática.
Ao contrário das doenças físicas, em que o dono se limita a dar a medicação prescrita,
aqui ele exerce um papel determinante:
«O sucesso da terapia varia não só com as patologias
e a precocidade do diagnóstico, mas também
com a capacidade do dono em levar a cabo as mudanças no seu comportamento em relação ao animal.»
Há situações, como as fobias, a agressividade e a hiperactividade, em que o animal também poderá ser submetido a treino
com um instrutor especializado.
Se sentir dúvidas, não hesite em pedir o aconselhamento
do veterinário.
Nunca se esqueça, conclui Mónica
Roriz, que «conhecer o funcionamento da cabeça de um cão ou gato, saber quais são as necessidades essenciais,
comunicar de uma forma correcta e coerente com eles permite um convívio
harmonioso».
Será depressão?
Esteja atenta aos sinais que o seu cão lhe dá e não adie a ida a um veterinário especializado em terapia comportamental:
as situações que mais
o excitavam, como
ir à rua ou brincar
Texto: Fátima Lopes Cardoso com Mónica Roriz (médica veterinária comportamentalista)
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