Na cozinha da naturopata Sara Oliveira muito pouco se desperdiça e, muito daquilo que consideramos lixo, é visto como um recurso que vai enriquecer a mesa. Porque, na realidade, e socorrendo-nos de um simples exemplo, talos e cascas de vegetais não são lixo. Como também não têm de gerar detritos muitos dos bens que adquirimos habitualmente. Varrer da equação uma parte substancial do desperdício, levou Sara, autora do livro “Saudável e Sem Desperdício”, a adotar regras simples, embora capazes de fazer a diferença.

“Sigo uma alimentação vegetariana, dou preferência a produtos não refinados e não processados. Gosto de comprar produtos locais, portugueses, biológicos e da estação, de preferência sem embalagens e que geram menos impacto ambiental durante a sua produção e transporte”, conta-nos em início de conversa a nossa interlocutora.

Como aproveitar talos e cascas? Cinco exemplos:

Talos de brócolos/couve-flor: usados para fazer salteados, para gratinar no forno ou colocar em sopas.

Cascas das cenouras: depois de muito bem lavadas, são usadas juntamente com outras cascas e talos para fazer caldo de legumes.

Cascas de batatas: depois de muito bem lavadas, são ótimas colocadas no forno e temperadas com sal e ervas aromáticas. São um belo petisco ou alternativa às batatas fritas.

Sementes de abóbora: depois de bem limpas de todos os fios da abóbora, são colocadas no forno com sala e especiarias e comidas como petisco.

Cascas de laranja/limão: ótimas para fazer chás, águas aromatizadas ou para juntar com vinagre e fazer um limpa-superfícies perfumado.

Para Sara, profissional com prática clínica, as compras começam ainda em casa. Como? Na planificação dos bens a adquirir com um objetivo estratégico, o de não desperdiçar.

A este propósito, “comprar alimentos de forma a reduzir o lixo e o desperdício gerados, obriga a uma certa organização anterior. Limito-me a comprar apenas o que preciso e tento sempre arranjar alguma alternativa com o que tenho em casa.  Depois, faço ementas e listas de compras, o que me ajuda bastante e facilita o trabalho na hora de comprar”

Listas de compras que, no caso da responsável pelo blogue “Nem Acredito Que é Saudável” (e de livro de título homónimo), incluem “legumes e fruta, até porque nunca compro em grande quantidade para não deixar estragar.  Cereais, leguminosas e sementes. Nestes casos, à medida que vou gastando o que tenho na despensa, volto a encher nas lojas a granel”.

Sara Oliveira dá grande uso à fruta: “a fruteira tem de estar sempre cheia”.

Ainda sobre o processo de antecipação das compras, o que inclui organizar toda a deslocação ao comércio, sublinha Sara Oliveira: “faço um roteiro mental das lojas e locais onde pretendo ir, o que ajuda muito, pois não se perde tempo desnecessário. Para mais, obtenho tudo o que preciso no mesmo local como, por exemplo, quando vou aos mercados biológicos onde tento adquirir todos os legumes, frutas e até leguminosas. O que me fica a faltar procuro encontrar nas lojas a granel ou em supermercados biológicos”.

Uma deslocação que nunca se faz sem “os sacos de pano, de rede e de papel de vários tamanhos para poder colocar os diferentes produtos”.

Objetivo lixo zero: o desperdício nas nossas cozinhas começa na forma como planeamos as compras
créditos: Blogue "Nem Acredito Que é Saudável"

Sobre se é mais difícil antecipar as compras quando pensamos em todo o desperdício que podemos com elas produzir (como, por exemplo, os cartonados, os plásticos), a naturopata responde-nos afirmativamente e deixa-nos perante a pergunta: “sem dúvida que é mais fácil tirar produtos embalados das prateleiras e colocar no carrinho de compras, mas será assim tão difícil comprar de forma mais sustentável?”.

Sopa de alface
Sopa de alface
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A resposta chega-nos nas palavras de Sara Oliveira: “de forma alguma, é apenas uma questão de hábito. Antes dos supermercados as pessoas faziam compras em mercados, mercearias, lojas a granel, padarias, charcutarias. O número de embalagens que levavam para casa era muito reduzido. Hoje, podemos fazer exatamente o mesmo. Além de reduzirmos o lixo produzido, apoiamos o comércio local, os produtores locais e na grande maioria das vezes ainda consumimos produtos de maior qualidade”.

Ainda de acordo com a nossa interlocutora, “se todos começarmos a adotar esta postura, mais cedo ou mais tarde as grandes superfícies irão ter muito mais opções a granel disponíveis e produtos sem embalagem”.

Impõe-se a pergunta: será que é fácil comprar a granel no nosso país tendo em vista o desperdício zero? Isto, considerando a oferta existente. “Penso que depende da zona onde se vive. Em cidades grandes como Lisboa e Porto há muitas opções, desde mercados de rua, lojas a granel e supermercados biológicos. Há, no entanto, zonas do país onde é bastante mais difícil. Nestes casos, temos de recorrer às mercearias, mercados e lojas de rua, onde eventualmente possamos levar os próprios recipientes e sacos para comprar”.

Por sua vez, se apontarmos à aquisição de marcas e produtos sustentáveis, há uma boa oferta? Responde-nos Sara Oliveira: “Há cada vez mais produtos portugueses de excelente qualidade, artesanais, biológicos e ecológicos. Desde produtores agrícolas como a Quinta do Arneiro, a Biofrade, o Cantinho das Aromáticas, entre muitos outros, a artesãos que fazem produtos de beleza e limpeza fantásticos e ecológicos como a Mind the Trash, Da Minha Casinha, Saponina. Há muito por onde escolher, e sinceramente não sinto qualquer necessidade de comprar marcas estrangeiras”.